Detentos não trocam a cadeia superlotada e suja pelo moderno CDP porque têm regalias; nas celas impera uma espécie de ‘código de honra’, com severas punições entre os presos.
A superlotação na Cadeia de Sarandi, na Região Metropolitana de Maringá, é sem dúvida um dos mais graves problemas envolvendo o sistema penal do Paraná, na atualidade. Na semana passada, 154 detentos estavam espremidos em celas totalmente insalubres - projetadas para abrigar 45 pessoas - e sem direito, sequer, a banho de sol.
Sem espaço suficiente, muitos dormiam no chão ou sentados no banheiro, ao lado dos esgotos fétidos tomados por baratas, fezes, urina e restos de alimentos. Nas celas mais lotadas, onde não existe nem lugar no chão, os menos “afortunados” passam dias e noites pendurados em redes ou cobertores amarrados às grades das celas.
Código
Abandonados à própria sorte, os presos de Sarandi se viram obrigados a criar regras e um sistema judiciário paralelo para tentar sobreviver no que eles denominam de inferno.
Entre as regras, elaboradas por uma comissão de detentos, consta que o preso que não receber visita ou não tiver dinheiro para comprar mantimentos deve, obrigatoriamente, trabalhar como faxineiro dentro do presídio. “É uma forma dele retribuir a comida e tudo o que recebe dos colegas”, explica um dos detentos, ressaltando que “o bicho pega” se alguém tentar descumprir as regras.
Alcagüetes (informantes da polícia) e estupradores são proscritos do convívio comum e devem ser trancafiados em cela separada e isolada, denominada de “seguro”.
O “proscrito” que ousar entrar no “quadrante” (espaço destinado a ladrões e assaltantes) certamente será atacado e morto sem dó, nem piedade. “Aqui dentro, quem faz a lei é a gente. Aqui, julgamos e aplicamos a sentença imediatamente. Para nós, estuprador e “cagueta” são lixo e devem ser tratados como tal”, alertam os detentos.
Em dia de visita, é proibido fitar ou conversar com mãe, irmã, esposa ou filha de outro preso. Ao cruzar com uma delas, o detento deve manter a cabeça abaixada. “Melhor manter a cabeça abaixada do que ter ela arrancada”, explica um preso, ressaltando que a família é sagrada e, portanto, intocável até mesmo aos olhos alheios.
Expelir gases fora do sanitário é punível com surra. O castigo pode ser maior caso o desrespeito ocorra na hora do almoço ou jantar. Desavenças de rua devem ser tratadas do lado de fora. No entanto, dependendo da gravidade do problema, uma comissão de presos pode abrir uma exceção para que o ofendido possa se vingar.
Curiosamente, é proibido mexer ou furtar objetos de um colega. Para quem ousar tocar em algo que não lhe pertence, a punição é imediata, podendo resultar até mesmo em morte.
Dependendo da situação, presos novatos ou com dívidas pendentes dentro da cadeia são obrigados a assumir a culpa por alguma morte ocorrida dentro do presídio. “Temos de criar regras para conviver neste inferno. Aqui todo mundo é “mano” (irmão) e a nossa justiça é muito mais eficiente e rápida”, explica um dos detentos.
Caso
Segundo os presos, os problemas poderiam ser solucionados caso o Poder Judiciário fosse mais ágil na condução dos processos. “Aqui tem gente que está há mais de dois anos aguardando para ser levado a júri popular”, diz um preso, citando o caso do pedreiro Nilton dos Santos, na cadeia desde 2006 por suspeita de homicídio.
O criminalista Aristóteles Rondon Pereira, de Sarandi, confirma que o julgamento foi adiado cinco vezes e faz questão de frisar que seu cliente é inocente. Segundo o advogado, os adiamentos teriam sido determinados pelo Poder Judiciário, que exige o interrogatório do principal suspeito do crime, que está desaparecido. “Já requeri a liberdade do meu cliente por excesso de prazo, mas a Justiça nega atender o pedido até que o outro suspeito seja preso”, lamenta Pereira.
O Diário do Norte do Paraná.Cidades | Sistema Carcerário | Atualizado Sábado, 17/01/2009.
Nenhum comentário:
Postar um comentário