sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Variações sobre o aborto


Como a gravidez tem crescido a passos largos, é bem provável que os abortos estejam andando em ritmo parecido. Na legislação atual, o aborto é crime, somente sendo admitido em dois casos. O primeiro, quando não há outro meio de salvar a vida da gestante; o segundo, quando a gravidez é resultado de estupro ou atentado violento ao pudor (sob consentimento da gestante ou, sendo incapaz, de seu representante legal). No primeiro caso, o aborto é chamado de necessário; no segundo, sentimental. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 30% das gestações no país terminam em aborto. Nota-se que, com isso, que a proibição legal não aliviou a morbidade das estatísticas, ou seja, o aborto é crime, mas continua a ser praticado em números alarmantes. Como a proibição não resolve, o que se busca é a descriminalização do ato.

O direito ao aborto é o direito à liberdade e à privacidade, previstos no artigo 5.º da Constituição Federal, pois é uma situação que ocorre na vida íntima da mulher. O artigo afirma que é direito dela decidir sobre algo que só acontece no seu corpo como, no caso, o de ter filhos ou não. Manter a gestação resulta, em muitos casos, apenas em impor danos à integridade moral e psicológica dela e da família. Questão importante é que o feto, sendo portador de direitos, não tem ainda vida civil. A mulher, sim. Nesse conflito, o direito dela é maior que o do feto, que possui uma expectativa, e não o fato.

Nessa linha feminista, que entende o aborto como um direito, veio a lume um projeto de lei que propõe a descriminalização do ato, se realizado até a 12ª semana de gestação. Nos casos em que a gravidez é fruto de violência sexual, o prazo é de 20 semanas. E, para as mulheres cuja gravidez represente risco de morte, o prazo é determinado pelo médico.

Sob o prisma religioso, o "peso das igrejas", os católicos se posicionam contra o aborto e a todo e qualquer método contraceptivo não-natural, em face dos evangélicos, que se manifestam a favor do planejamento familiar. Com isso, os católicos são os que mais praticam aborto. De acordo com uma pesquisa realizada pela USP, 74% dos casais que procuram interromper a gravidez, nos casos de fetos com anencefalia, são dessa religião. Mas o estado brasileiro não pode ser conduzido por valores religiosos, e sim por parâmetros de cidadania.

Uma importante opção, que poderia impedir a prática do aborto, é o investimento na educação sexual e no acesso aos contraceptivos seguros e a contraceptivos de emergência. Mas, no estágio atual que estamos, isso praticamente não existe. Por derradeiro, a escolha da gestação deve ficar ao alvedrio da mulher, e só a ela compete decidir acerca da gestação. É o que busca o projeto de lei acima referido.


Fonte: PRUDENTE, Neemias Moretti. Variações sobre o aborto. Jornal O Diário do Norte do Paraná, Maringá, 04 ago. 2006. 1.º Caderno, p. 02, opinião.

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