Na discussão sobre o recebimento da denúncia, o empate deve favorecer o réu. Foi o que definiu, nesta terça-feira (23/9), a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, ao trancar parte de inquérito aberto para investigar o deputado federal Paulo Cesar Quartiero (DEM-RR). É a primeira vez que o STF se depara com a questão, e o entendimento favorável ao réu deve orientar agora as demais discussões na corte.
Quartiero era investigado em dois inquéritos. Um (3.202) sob a acusação de destruir e deteriorar patrimônio da União durante a desocupação de duas fazendas que ficam na área onde hoje está a reserva indígena Raposa Serra do Sol. O outro (3.670) sob a acusação de danificação de área de preservação permanente. O deputado é defendido no Supremo pelo advogado Ticiano Figueiredo.
Dos dois inquéritos, o primeiro foi julgado improcedente por inépcia da acusação. O segundo foi rejeitado parcialmente, e foi nesse caso que o Supremo definiu sua interpretação sobre empate em relação ao recebimento da denúncia.
O relator do caso na 2ª Turma, ministro Gilmar Mendes (foto), votou pelo não recebimento da denúncia em nenhum dos aspectos. Entendeu que a denúncia foi inepta por não mostrar o objeto material do crime, “a coisa destruída, inutilizada ou danificada”. Gilmar também apontou que o deputado pretendeu evitar que terceiros tomassem posse do que era seu, conforme ficou registrado em depoimento. Ficou vencido.
O cerne da nova jurisprudência está no voto do ministro Teori Zavascki, que acompanhou Gilmar Mendes, exceto quanto à destruição de uma das fazendas. Os ministros Celso de Mello e Cármen Lúcia entenderam que a denúncia deveria ser totalmente recebida, e o inquérito continuaria tramitando integralmente.
Os ministros, então, tiveram que debater o que deveria acontecer no caso de empate na discussão a respeito do recebimento da denúncia. A ministra Cármen Lúcia entendeu que, se dois ministros entendem pelo recebimento parcial da denúncia e dois pelo recebimento integral, deve ser aplicado o princípio in dubio pro societat. Em português, na dúvida a respeito do que fazer, o réu deve ser investigado, em benefício da sociedade. Ficou vencida.
Já os ministros Celso de Mello (foto), Gilmar Mendes e Teori Zavascki votaram para que seja aplicado o mesmo princípio das discussões de mérito em matéria penal: se há dúvida, deve prevalecer o entendimento que favorece o réu.
O Supremo nunca havia se deparado com a questão, e, portanto, não há definição do Plenário a respeito. Na 1ª Turma, os ministros discutem se recebem ou não o inquérito resultante da chamada operação ararat, conduzida pela Receita Federal, pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal. Há embargos em que há empate de entendimentos. O ministro Dias Toffoli, relator, cogita convocar o decano, ministro Celso de Mello, como manda o Regimento Interno, para dirimir a questão. E o ministro Celso acaba de votar no sentido de que a dúvida deve favorecer o réu.
Inquérito 3.202 e Inquérito 3.670.
Revista Consultor Jurídico, 24 de setembro de 2014.
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