Uma olhadela na Constituição de praticamente todos os países do mundo mostra que impedir os presos — condenados — de votar não é exclusividade dos brasileiros. Em pelo menos 34 nações, o direito ao voto é retirado pela própria carta constitucional enquanto durar o encarceramento. Na maioria dos países, a Constituição delega à legislação ordinária a competência para decidir se os presos podem votar.
Dos países que tratam da proibição no texto constitucional, 18 só permitem banir das urnas uma pessoa que foi condenada e está cumprindo a pena atrás das grades. É o caso da Noruega, Luxemburgo, Rússia e Uruguai. O Brasil não entra nessa contagem porque, em vez de proibir um condenado de votar, a Constituição Federal prefere garantir o direito do preso provisório de comparecer às urnas.
Em outros 12 países, a Constituição estabelece que o condenado só perderá o direito ao voto se estiver recebido uma pena mínima, que pode variar de seis meses a um ano. A Holanda, por exemplo, só bane alguém das urnas se a pena for maior do que um ano de cadeia. Em apenas quatro Estados, o preso provisório, sem qualquer condenação, fica impedido de votar. São eles: Suriname, os africanos Botsuana e Zâmbia, e Uzbequistão, na Ásia Central.
Já sobre a obrigatoriedade do voto, o assunto é tratado na Constituição de apenas 14 países: Argentina, Bélgica, Bolívia, Brasil, Costa Rica, Equador, Grécia, Guiné, Honduras, Paraguai, Peru, Tailândia, Uganda e Uruguai. Nos outros, ou o voto não é obrigatório ou a carta constitucional deixa o assunto para ser tratado por lei ordinária.
Todos esses dados foram obtidos a partir de uma consulta no site Constitute Project, lançado no meio do ano por um grupo de acadêmicos dos Estados Unidos chamado Comparative Constitutions Project e patrocinado pela Google. O projeto, como o nome indica, permite a comparação entre todas as Constituições existentes no mundo. As quase 200 cartas constitucionais foram todas traduzidas para o inglês e agrupadas no site do projeto.
A regra do voto
O fato de a Constituição não proibir preso de votar não significa que, no país, o direito é garantido a todos aqueles atrás das grades. Praticamente todas as constituições especificam que, para votar, a pessoa tem estar no gozo pleno de seus direitos e deveres cívicos. Quando alguém é preso, pelo menos um desses direitos — a liberdade — é temporariamente suspenso. É bem provável que, nesses casos, o direito ao voto também seja suspenso. Em outros casos, a Constituição delega à Justiça a função de decidir se banir da urna é parte da pena. É o caso de Cuba.
Uma boa parte dos Estados é ainda mais severa quando se trata de direito de voto. A Grécia e a Itália, por exemplo, proíbem qualquer pessoa condenada por algum crime de votar, esteja ela atrás das grades ou não.
Ainda há aqueles países que não tratam do assunto na Constituição, mas sim em legislação ordinária. É o que faz o Reino Unido, onde sequer existe uma Constituição. Os britânicos proíbem quem está cumprindo pena na cadeia de votar. De acordo com dados da Corte Europeia de Direitos Humanos, em 2005, mais 12 países europeus impediam todo preso condenado de ir às urnas e outros 13 impunham a restrição de acordo com o crime cometido e a punição recebida.
A corte europeia já decidiu, em mais de uma ocasião, que impedir todo preso de votar viola o direito da população de ter eleições livres. Pela jurisprudência do tribunal, suspender temporariamente o direito ao voto de quem está preso não agride nenhum direito humano, mas essa suspensão não pode atingir irrestritamente todo preso. Precisa ser definida por lei e aplicada caso a caso pela Justiça.
Aline Pinheiro é correspondente da revista Consultor Jurídico na Europa.
Revista Consultor Jurídico, 8 de janeiro de 2014
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