Um novo estudo da Universidade de Indiana (EUA) descobriu que o bullying ou agressão social é muito presente em programas voltados para crianças, ou bastante assistidos por crianças.
Nicole Martins, principal pesquisadora do estudo, em parceria com a professora de comunicação da Universidade de Illinois (EUA) Barbara Wilson, conduziu uma análise de conteúdo dos 50 programas mais populares entre as crianças de dezembro de 2006 a março de 2007 nos EUA, de acordo com o ranking da Nielsen Media Research. Ao todo, 150 programas de televisão foram vistos e analisados.
Elas descobriram que 92% dos programas voltados ou assistidos por crianças entre as idades de 2 e 11 anos apresentaram personagens envolvidos com agressão social. Em média, houve 14 casos diferentes de agressão social por hora, ou uma vez a cada quatro minutos.
A grande maioria dos incidentes socialmente agressivos (78%) foi verbal: palavras para machucar a autoestima ou status social de outro personagem no programa. Os tipos mais comuns de agressão social foram insultos (52%) e xingamentos (25%).
Outros tipos comuns de comportamento negativo apresentados foram provocação (10%) e sarcasmo (9%).
Apenas cerca de 20% de todos os incidentes socialmente agressivos foram não verbais em sua natureza e, normalmente, empregavam “cara de mau” (36%) ou riso irônico para diminuir a autoestima de outro personagem (31%). Rolar os olhos, apontar o dedo e simplesmente ignorar a outra pessoa também eram comportamentos comuns.
A maioria dos incidentes socialmente agressivos (86%) foram feitos na frente do alvo (como insultá-lo em sua cara), e raramente foram perpetrados pelas costas do alvo (como fofoca).
Agressão moral x física
As pesquisadoras analisaram uma variedade de programas realmente infantis, como “Hannah Montana” e “Bob Esponja”, e alguns voltados a um público mais velho, mas bastante assistidos por crianças, como “American Idol”.
Elas descobriram que as agressões sociais são mais propensas a serem promulgadas por um autor atraente (geralmente mulher), que normalmente não é recompensado nem punido por seu comportamento. As agressões também são geralmente apresentadas em um contexto humorístico.
As cientistas consideraram agressões sociais, por exemplo, as “guerras” de insultos entre os juízes de “American Idol” e uma cena de “Os Simpsons” em que o Sr. Burns diz a Homer Simpson que ele é um “desperdício de pele e gordura”.
Mesmo desenhos criados para crianças muito jovens, como o desenho Os Anjinhos, muitas vezes têm personagens como a Angélica, que existem apenas para atormentar os outros personagens.
Enquanto agressão física em programas de televisão para crianças tem sido amplamente documentada, este é um dos primeiros estudos a analisar a exposição das crianças a comportamentos ruins como fofocas, crueldade e manipulação de amizade.
Os resultados sugerem que as maneiras em que a agressão social é contextualizada fazem com que essas representações sejam particularmente problemáticas para os espectadores mais jovens.
Por exemplo, um enredo típico de programas como Hannah Montana, da Disney, envolve comportamento rude, sarcástico, ou mal educado, muitas vezes exibido pelo “melhor amigo”. Ao final do show, os que foram “malvados” geralmente obtêm sua punição, mas as crianças mais jovens podem não associá-la com as ações anteriores do personagem que foi cruel.
“Estes resultados devem ajudar os pais e educadores a reconhecerem que há comportamentos socialmente agressivos em programas para crianças”, disse Martins. “Os pais não devem assumir que seu filho pode ver um programa simplesmente porque ele não contém violência física”, explica.
Porque é prejudicial e o que fazer?
Segundo Martins, a agressão social ocorrer majoritariamente em comédias apresenta um desafio especial. “Quando você apresenta a agressão como forma de humor, aumenta as chances de imitação, porque as crianças são menos propensas a reconhecer que o que está sendo dito é prejudicial”, afirma.
Martins reconhece que os programas de TV não seriam muito interessantes se todo mundo se comportasse corretamente e tratasse um ao outro com respeito.
“Eu não estou dizendo que devemos nos livrar do conflito, ou mesmo que as crianças não deveriam assistir programas”, disse. “Eu desafio as pessoas dessa indústria a pensarem sobre como elas devem retratar estes comportamentos agressivos e, pelo menos, a mostrarem que a vítima fica magoada pelos comentários”.
Segundo ela, isso pode reduzir o risco das crianças imitarem o que veem na TV e realmente magoarem alguém. A pesquisa, no entanto, não prova que o comportamento das crianças é influenciado pela forma como as pessoas e personagens agem nos programas de TV.
Robert Faris, professor da Universidade da Califórnia em Davis (EUA) que estuda o bullying, elogiou o estudo, mas disse que é improvável que ele tenha alguma influência em mudar a programação da TV infantil.
Porém, ele acredita que se os telespectadores pudessem ver a maldade subjacente de algumas formas de humor, talvez não as achariam tão engraçadas. “Certamente é possível ser hilariante sem ser cruel. Eu até acho que o público está começando a se cansar de insultos e sarcasmo”, opina.
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