domingo, 25 de julho de 2010

Escalada da violência exige agilidade da Justiça

Casos em que a punição real é muito mais branda que a sentença proferida pela Justiça, como o de Míriam Brandão e do bebê da Lagoa da Pampulha, reforçam uma sensação de impunidade na qual, segundo especialistas, o Brasil está mergulhado. Um sentimento que provoca medo no cidadão comum e, ao mesmo tempo, é combustível para que muitos criminosos apostem que estão acima da lei. O debate sobre a situação traz como pano de fundo a reforma do Código de Processo Penal brasileiro, documento que regula a aplicação das leis penais. Em discussão no Senado Federal, o texto já foi aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e deve ser votado no próximo mês. As mudanças eliminam parte da burocracia na tramitação de processos penais, contribuindo para acelerar os julgamentos. Recursos como os chamados embargos de declaração e outros usados para protelar a sentença foram cortados do esboço do novo código. Pela proposta, o inquérito da Polícia Civil poderá ir direto para o Ministério Público, sem a intermediação do juiz. Apesar das iniciativas que podem acelerar os julgamentos, quando o assunto é impunidade, os questionamentos ultrapassam o campo da aplicação da legislação e chegam às próprias leis penais.


Para o sociólogo Luís Flávio Sapori, no Brasil, onde 45 mil pessoas são assassinadas ao ano, pune-se pouco e mal. De acordo com o Código Penal Brasileiro, ao homicídio simples é aplicada a pena de seis a 20 anos de reclusão. Com agravantes, a condenação pode aumentar para até 30 anos. Mas benefícios de progressão tornam possível reduzir a prisão em regime fechado em um terço. “Trinta anos com progressões não é um tempo adequado. Se queremos fazer da vida o valor máximo para a sociedade brasileira, temos que dizer que tirar a vida de alguém vai ter um alto custo, e não 8 ou 10 anos, como tem acontecido. Não é pena de morte nem prisão perpétua, mas é preciso construir um meio-termo”, defende.

Ele pondera ainda que a pena máxima de três décadas foi pensada nos anos 1940, quando a expectativa de vida da população era bem menor. Como agravante para essa sensação de que os crimes ficam impunes, estão sentenças de 100, 200 anos de prisão, quando o tempo máximo de detenção permitido por lei é de 30 anos. Para Sapori, essa discrepância dá contornos de uma condenação de fachada. “Essas condenações não trazem uma percepção boa para a sociedade. Seria menos hipócrita dizer 30 anos.”

Inquérito problemático 

Descrente de que a mudança na lei penal faça com que a criminalidade diminua, Délio Gandra destaca que o problema começa muito antes, no calor do crime, na hora de elaborar o inquérito policial. Segundo ele, a falta de preparo das equipes policiais leva para as mãos do Ministério Público provas fracas e cheias de brechas, facilitando a absolvição de culpados. “Em alguns lugares, não há máquina para fotografar o cadáver”, critica. Ele acrescenta que a grande quantidade de recursos que os advogados podem usar para retardar a sentença final é mais um motivo para que os criminosos permaneçam impunes. Várias dessas manobras devem ir por água abaixo se aprovado o novo Código de Processo Penal. “Há uma enormidade de recursos que nós, advogados, podemos usar. Além disso, a carência de juízes e promotores é outro dado fundamental”, afirma.

O cenário de impunidade é reforçado por estatísticas alarmantes. Segundo Sapori, uma pesquisa que teve como alvo casos de homicídios no Rio de Janeiro, São Paulo e Minas mostrou que o tempo médio entre o início do processo e a sentença é de cinco anos. “A cada 100 homicídios, apenas um é sentenciado. Esse é um lapso absurdo, relacionado à inoperância da polícia e da Justiça”, critica. O conselheiro da OAB Márcio Santiago alerta para a lentidão das investigações policiais. “Quando 30 mil inquéritos precisam ser apurados, a polícia só está focando em um”, afirma, em referência ao recente desaparecimento de Eliza Samudio, que vem mobilizando a maior parte das atenções e recursos do Departamento de Investigações da Polícia Civil.





UAI Minas. Flávia Ayer - Estado de Minas
Publicação: 25/07/2010 08:25

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