quarta-feira, 9 de abril de 2008

Ricos reclamam mais da violência do que os pobres

Para pesquisador, pessoas com maior renda e escolaridade têm nível de exigência maior

Percepção de morador não reflete necessariamente as reais condições de moradia do bairro em que vive, de acordo com pesquisa

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

O bairro da Lagoa, na zona sul do Rio, é um dos mais nobres da cidade. É também um dos mais seguros e policiados, com estatísticas de criminalidade bastante inferiores à média no Rio. No entanto, foi exatamente lá que nasceu, em 2004, o movimento Basta!, iniciado pela psicanalista Beatriz Kuhn depois que ouviu, de sua cobertura, som de tiros na favela da Rocinha.
Beatriz e seus vizinhos, como demonstram as estatísticas da Secretaria de Segurança Pública, estão mais seguros em seu bairro do que um morador da Rocinha, mas a percepção que cada morador tem da violência não necessariamente reflete o grau real de perigo ao qual cada um está exposto.
Uma comprovação disso pode ser feita a partir de uma tabulação da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) do IBGE feita pela Folha. Ela mostra que, em famílias com nível de gasto maior, foi também maior o percentual de pessoas que reclamaram de problemas de violência ou vandalismo em sua área de residência.
Em famílias cujos gastos mensais não ultrapassam os R$ 400, o percentual dos que fizeram essa queixa foi de 20%. Essa proporção aumenta a cada faixa de gasto e, nas famílias com despesas superiores a R$ 4.000, chega a 32%.
Para Edilson Nascimento da Silva, gerente da POF, um primeiro dado a levar em conta nessa análise é que o que está se medindo nesse indicador é a percepção das condições de vida de cada morador, ou seja, isso não necessariamente reflete as reais condições de moradia em seu bairro.
"Um morador mais pobre e que mora num bairro mais violento ou barulhento pode se sentir menos incomodado. Em geral, o que percebemos na pesquisa é que as pessoas de maior renda e escolaridade, por terem mais conhecimento ou pagarem mais impostos, têm nível de exigência maior."
Fernando Blumenschein, coordenador de Projetos da FGV e autor de um estudo sobre as condições de vida a partir da POF, acrescenta nessa análise o fato de a população mais rica se sentir mais alvo em potencial da violência por possuírem mais ativos.
Beatriz Kuhn, fundadora do Basta!, diz que um dos fatores que podem explicar o fato de a população de maior renda se mostrar mais incomodada com a violência é justamente o fato de estar mais distante das áreas mais problemáticas.
Ela conta que recebeu muitas críticas por estar se mobilizando contra a violência e fazer parte da elite. "Da mesma maneira como fizeram com o [apresentador] Luciano Huck [que escreveu um artigo indignado na Folha após ter sido assaltado em São Paulo], me diziam que, por ser da elite, eu deveria calar a boca. É como se dissessem que a culpa pela violência é minha e que, por isso, eu deveria ficar engessada. Isso não faz sentido."

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