Renan Ferreira, 18 anos, dá um piscadela para Simone Souza, 19. Sentados frente a frente, eles trocam um carinho furtivo com as pernas, sob o mesão do refeitório. Os dois são noivos. Mas estão impedidos de se beijar, andar de mãos dadas ou sequer se tocar, sob pena de perder pontos no Conceito de Disciplina do Colégio Adventista de Petrópolis, um parque arborizado na Rodovia BR-040 que, de fora, remete a uma colônia de férias, mas que por dentro expõe nuances complexas, como mostra matéria publicada nesta terça-feira no Megazine.
Não há guardas carrancudos nos 400 mil metros quadrados. São alunos os monitores da ordem. Como os ajudantes da cozinha e demais instalações, eles têm desconto na mensalidade, cujo valor é de, em média, R$ 1 mil. No pátio, vigiam o recreio; nos dormitórios dos 300 internos, atendem às ligações. Pelo alto-falante, anunciam a presença de alguém do sexo oposto no prédio (os dormitórios de meninos e meninas ficam em construções diferentes). Nada escapa ao olhar onipresente.
- Eu me sinto em Alcatraz - Renan faz careta, aludindo à extinta prisão de segurança máxima da Califórnia (EUA), celebrizada em filmes americanos.
Às vezes a tensão é tanta que alguns não seguram a onda. No início do ano, numa discussão com um colega, Renan, o noivo de Simone, partiu para a agressão. O chute lhe custou metade dos pontos do Conceito de Disciplina. Violência no Adventista é punida com rigor. Se os dez pontos forem perdidos, a expulsão é certa.
- Apesar das regras, é difícil ter disciplina com adolescentes. A parte espiritual é que mantém a unidade - prega o pastor Edino Will, diretor do colégio e ex-aluno - Ao selecionar um aluno, entrevistamos os pais. Se dizem que os filhos dão problema, não aceitamos. Só pegamos os bons. Não estamos preparados para lidar com alunos com problemas de drogas ou mau comportamento.
A idéia não poderia ser mais distante do discurso de Lincoln da Silva Costa, fundador e diretor do Instituto São Pedro de Alcântara (Ispa), que mantém 70 internos no Quitandinha e cobra também, em média, R$ 1 mil de mensalidade. Para ele, "a família só procura o internato quando tem problema". Mau comportamento, ali, é quase sempre o início, não o fim.
- Procuramos recuperar quem se desvia. Não há regras por escrito, mas tudo é debatido. A liberdade é tanta que não há portões. Ninguém sai. Muitos, quando chegam, estão revoltados com os pais e canalizam a raiva para o colégio. Alguns ligam para casa, fazem chantagem emocional e são retirados. Mas a maioria fica e gosta - diz.
O Globo Online, 29/04/2008.
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