sexta-feira, 11 de abril de 2008

Mulher agredida busca direitos

Sob a vigência da Lei Maria da Penha, número de ligações cresceu 306% no ano passado, em relação a 2006.

A orientação sobre pormenores da Lei Maria da Penha, que busca coibir a violência doméstica contra a mulher, aumentou em 306% as chamadas ao telefone 180 (Central de Atendimento à Mulher) de 2006 para 2007. O salto foi de 50.444 para 204.978 atendimentos (veja quadro ao lado). Isto ocorreu após a vigência da lei, que responde pela maioria das informações solicitadas pela usuárias do 180.

Em números absolutos, o Paraná ocupa a sétima posição em ligações para o serviço, com 3,88%, enquanto o líder é o estado de São Paulo, com 39,14%. Já na taxa de chamadas por 50 mil mulheres, o Paraná cai para a 15ª posição entre as unidades da federação, com 17,8 ligações por 50 mil mulheres, sendo o líder o Distrito Federal, com 47,3 chamadas por 50 mil mulheres.

“A Lei Maria da Penha é o carro-chefe das ligações, que devem manter a tendência de alta neste ano”, informa Pedro Ferreira, coordenador-técnico e responsável pela central do 180, em Brasília (DF).

O objetivo do serviço é encaminhar mulheres em situação de violência para os serviços da Rede de Atendimento à Mulher, como delegacias especializadas, centros de referência à mulher e à defensoria pública. O 180 também recebe denúncias, embora o seu foco principal seja orientar e oferecer ajuda às mulheres nessa situação.

Segundo estatísticas da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, as ligações duram em média 13 minutos, ou seja, cinco vezes mais que as de outras centrais. A maioria das mulheres que pede ajuda (61%) relata agressões diárias do próprio companheiro. Elas têm idade entre 20 e 40 anos (67,8%), são casadas (40,6%), negras (54,6%) e cursaram somente o ensino fundamental (47,7%). A maioria dos agressores (57%) usa álcool ou outras drogas.

Apesar de todos esses números, especialistas dizem que as denúncias são mínimas, diante do universo desse tipo de violência. Para a juíza Luciane Bortoleto, do Juizado Especial da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, ainda falta coragem para as mulheres. “A dependência emocional, financeira e o vínculo afetivo ainda são entraves para elas”, avalia. “É preciso mais campanhas, esclarecer mais as mulheres, e principalmente apresentar o resultado das denúncias.”

A psicóloga Paula Gomide, professora da Faculdade Evangélica do Paraná, explica que a mulher fragilizada vive sob o efeito de abuso físico e psicológico, e o agressor a mantém sob pressão, como se ele fosse a vítima. “O primeiro dilema delas é reconhecer o abuso na fase do tratamento, mesmo as bem formadas, como médicas, engenheiras”, analisa. “Elas não conseguem reconhecer que são capazes, nem avaliar que o algoz é quem maltrata.”

Para a psicóloga, o apoio às mulheres nessa situação pode aumentar ainda mais o número de denúncias contra os agressores, pois, às vezes, a mulher se separa de um homem violento e acaba caindo na mão de outro agressor. “Muitas mulheres são mortas pelos abusadores, pois é essa fragilidade que os torna fortes”, denuncia.

Impunidade

Mas nem sempre a mulher que procura ajuda consegue garantir a sua integridade física. Um trágico exemplo é a morte de Andréa Silveira Pires, de 37 anos. Ela registrou um boletim de ocorrência na Delegacia da Mulher no mês passado, denunciando que sofria maus-tratos do ex-companheiro. No entanto, foi morta a facadas no domingo de Páscoa. O crime foi cometido uma semana após a polícia pedir proteção ao Juizado Especial. Segundo a Delegacia de Homicídios, o ex-companheiro não está preso.

O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu no fim do ano passado uma ação de declaração de constitucionalidade, proposta pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para confirmar a validade da Lei Maria da Penha, que teve sua constitucionalidade questionada, sob o argumento de que a mulher estaria sendo privilegiada, enquanto a Constituição garante a igualdade dos sexos. Mas as estatísticas policiais demonstram que ela continua em desvantagem diante do seu potencial agressor: o homem.


“A dependência emocional, financeira e o vínculo afetivo ainda são entraves para elas.” Luciane Bortoleto, juíza, ao explicar porque falta coragem às mulheres agredidas".


Juizado registra mais de 4 mil procedimentos em 13 meses

Em Curitiba, o Juizado Especial da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher registrou 4.652 procedimentos em pouco mais de um ano, de 23 de janeiro de 2007, quando foi criado, até 29 de fevereiro deste ano. Estão na conta ações penais, inquéritos policiais já enviados ao juizado e pedidos de medidas de proteção à mulher.

Embora novo, o juizado já está com sobrecarga de trabalho. Ele recebeu 599 inquéritos policiais somente em janeiro.

Interior

No interior do estado, o tratamento às vitimas deve ser priorizado pelos juízes das varas criminais. “A credibilidade e confiabilidade na punição exemplar será sem dúvida o passo mais importante para que possamos erradicar esse tipo tão ardil de violência, que afeta os lares e a família”, afirma a desembargadora Rosana Fachin, do Tribunal de Justiça do Paraná. (JNB)

* * * * *

Serviço

O telefone 180 oferece orientações e encaminha mulheres vítimas de violência física, psicológica e sexual a delegacias especializadas e espaços de acolhimento psicológico, social e jurídico.



Gazeta do Povo, 11/04/2008.

Nenhum comentário:

Pesquisar este blog