quinta-feira, 10 de abril de 2008

Matando as vacas para acabar com os carrapatos - Uma reflexão sobre a redução da maioridade penal

Artigo enviado pelo amigo Gerciel Gerson de Lima.


Toda vez que um crime bárbaro como o que recentemente vitimou o garoto João Hélio no Rio de Janeiro acontece, aparecem os “salvadores da pátria” com propostas de medidas eficazes e, soluções fáceis para por fim à violência, como se a resposta existisse sempre ao alcance da sociedade e, esta não atentou para tal.

Em assuntos que envolvem violência, embalados pela versão utópica, explorados pela imprensa através de programas sensacionalistas, com o único objetivo de pontuar bem nos índices de audiências ou, vender jornais, os apresentadores apresentam soluções para tudo, ficamos a imaginar, pelo “profundo conhecimento” que demonstram sobre a questão da violência e assuntos outros, que se fossem presidentes da República por uma semana, não teríamos mais nenhum tipo de problema.

Até mesmo um representante do Ministério Público Paulista, Fernando Capez, com presença constante na mídia e tido como “autoridade” no assunto violência, ao comentar recente onda de violência nos estádios de futebol, apresentou uma solução curiosa, em entrevista à Rede Record, segundo ele, para acabar com a violência nos estádios, os grandes clássicos do futebol paulista, deveriam acontecer apenas com uma das torcidas presente, por exemplo, num clássico entre Corinthians e Palmeiras, teríamos a presença só da torcida de um dos times e, se não resolvesse, os grandes jogos deveriam acontecer com estádios vazios.

A sociedade deve estar atenta a este tipo de “solução”, ora, se não há público, não há conflito, em resposta à sugestão acima, ouvido um torcedor, este como leigo fez uma colocação, no mínimo merecedora de nossa citação, “até em festa de aniversário, onde se reúne número pequeno de pessoas, algumas vezes ocorrem desentendimentos”.

Isto tudo leitor, nos leva a uma reflexão sobre a tão decantada diminuição da maioridade penal como solução para baixar os índices de criminalidade, colocada como está pelos meios de comunicação, seria a solução para todos os males? Se positivo, como uma medida tão simples esteve tanto tempo ao nosso alcance e não percebemos?

Recente pesquisa da revista Carta Capital, edição n.º 444 de 16 de maio de 2007, apontam os seguintes dados: 83% da população brasileira aprova a diminuição da maioridade penal para 16 anos, acreditando ser esta uma das soluções para diminuir os índices de violência.

Segundo pesquisa da Secretaria da Segurança Pública do estado de São Paulo, o número de homicídios praticados por menores no estado, é inferior a 1% e, apenas 4% do total de crimes, tem como autores menores de 18 anos, a nível nacional, o total dos crimes praticados por menores, segundo pesquisas recentes, é de aproximadamente 2%.

Medidas simplórias, sem questionamento de serem ou não viáveis, são oferecidas às dezenas pelos meios de comunicação ou como acima citados “especialistas”, desacompanhadas por dados de como na prática funcionam em outros países, podem resolver todos os nossos problemas de violência? Ou devemos cobrar de nossas autoridades mais seriedade em providências que envolvam o assunto?

Na hipótese de aprovação da diminuição da maioridade penal para 16 anos, um dia após a entrada em vigor da alteração, se um menor com 15 anos, 11 meses e 29 dias, comete outro crime bárbaro como o do garoto João Hélio, não se deflagraria novamente outro movimento para nova diminuição e assim sucessivamente?

Pesquisa da ONU, realizada a cada quatro anos Crime Trends (Tendências do Crime), revela que apenas a minoria dos paises define como adulto o menor de 18 anos, sendo que estes paises, não garantem os direitos básicos da cidadania a sua juventude, ou seja, não são bons exemplos a serem seguidos e, responsabilização penal deste menores não ajudaram no combate a violência.

O ECA (Estatuto da Criança e Adolescente), é muito parecido com nossa constituição, na teoria uma das mais avançadas do mundo, na prática todos sabemos da carência de mudanças destes diplomas legais .

Soluções para diminuir a violência existem, mas nenhuma tão simples como as que estão sendo colocada, na linha de raciocínio dos “especialistas” de plantão, em resumo, estaríamos adotando a solução simples de “matar a vaca para acabar com os carrapatos”.

Gerciel Gerson de Lima é advogado e mestrando em Direito Penal pela Universidade Metodista de Piracicaba/SP.


Publicado originalmente no Jornal o Estado do Paraná, Caderno Direito e Justiça, em 28 de outubro de 2007.

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