quinta-feira, 3 de abril de 2008

Laudo indica que matador de 16 anos não é serial killer nem psicopata




O adolescente que confessou o assassinato de 12 pessoas no Vale do Sinos não é um serial killer, nem um psicopata.

Ele apresenta transtorno de conduta, um tipo de perfil definido popularmente como comportamento inadequado, causado por educação indevida e carência de limites.

Entre as características que costumam se enquadrar nesse modelo estão a irresponsabilidade e a ausência de remorso com relação a alguns crimes praticados. O perfil do garoto foi definido na avaliação feita por uma junta de especialistas da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase). Zero Hora teve acesso ao conteúdo do laudo por intermédio de um especialista em adolescentes.

A avaliação foi elaborada a partir de entrevistas feitas por especialistas de cinco áreas: medicina clínica, psiquiatria, neurologia, psicologia e educação. Foram ouvidas também pessoas que tiveram contato com o garoto desde sua infância, como parentes e educadores.

O diagnóstico é preliminar e terá de ser confirmado por exames mais acurados. Mas os analistas consideram o matador recuperável.

— Ele tem consciência dos crimes que cometeu e não os fez por prazer. Ele apenas não tem noção correta sobre as conseqüências dos homicídios que diz ter praticado — diz o expert que analisou o laudo.

Entre as conseqüências que o adolescente não teria medido estão a reação dos parentes das vítimas e a noção de irreversibilidade do dano que causou.

O comportamento do adolescente, desde que está recolhido na unidade da Fase em Novo Hamburgo, também é indicador de que não se trata de um doente mental nem apresenta sofrimento psíquico, característica de sério distúrbio de personalidade. Ele não desafiou os examinadores — postura comum entre serial killers — e se manteve tranqüilo nas respostas. O garoto tampouco apresentou síndrome de abstinência com relação a drogas nem surtou.

Falta de limites e péssimos
exemplos ajudaram no perfil

Uma das razões para a calma do rapaz é que, possivelmente, não tenha cometido tantos assassinatos quanto alega. Entre os examinadores cresce a desconfiança de que parte dos homicídios confessados tenha sido cometida por adultos ligados à sua quadrilha, os quais ele deseja livrar da condenação.

Chamou a atenção dos especialistas o histórico familiar e escolar do rapaz. No caso da família, teria sofrido seguidas agressões por parentes. No ambiente colegial, teria sido agredido por colegas. Tudo isso teria contribuído para o perfil violento, numa trajetória coerente com o ambiente em que cresceu.

— Ele não teve exemplos adequados e não conheceu limites, o que ajuda a compreender os crimes que praticou ou diz ter praticado — resume o especialista que teve acesso ao exame.

Zero Hora informou o presidente da Fase, Irany Bernardes de Souza, do conteúdo do laudo. Apesar de preferir não comentar o assunto, ele diz que o transtorno de conduta é semelhante "ao que 90% dos internos apresentam". Como a personalidade deles não está formada, entram em cena especialistas para tentar moldá-los no caminho do bem.

— É por isso que acreditamos plenamente na possibilidade de recuperação desse rapaz, como acontece com outros.

Comportamentos que levam ao crime
Com base em exames, especialistas definem o perfil de criminosos:

TRANSTORNO DE CONDUTA

Características
> Quando adulto, é chamado anti-social. Mostra baixa sensibilidade com relação aos sentimentos alheios
> Desenvolve desrespeito por normas, regras e obrigações sociais
> Estabelece relacionamentos com facilidade, mas tem dificuldade em mantê-los
> Tem baixa tolerância à frustração e reações agressivas ou violentas
> Tendência a culpar os outros ou defender-se com raciocínios lógicos, porém improváveis
> Com tratamento adequado, é capaz de assimilar comportamentos sociais e ter noção dos erros cometidos
> Exemplos: o adolescente que assumiu 12 mortes em Novo Hamburgo e a maioria dos homicidas abrigados nas unidades da Fase

PSICOPATA

Características
> É o anti-social perverso. Entende as proibições legais, mas não compreende o significado afetivo e emocional das transgressões que comete. Muitas vezes nasce com predisposição genética a esse comportamento, ao contrário de outros anti-sociais, que são influenciados por agressões sofridas no meio em que vivem
> Não apresenta sinais de anormalidade mental (alucinações e delírios, por exemplo), o que torna o reconhecimento da doença muito difícil
> No plano intelectual, entende a diferença entre o certo e o errado, mas não desenvolve emoções morais. Não tem arrependimento, culpa, piedade nem vergonha
> É um predador que usa charme, manipulação, intimidação e violência. Ganha a confiança de colegas ou parentes para pedir favores. Se a pessoa oferece obstáculos, é capaz de atos cruéis
> Muitas vezes caça emoções, porque alguns apresentam um sistema nervoso relativamente insensível a baixos níveis de estimulação
> É de dificílima recuperação
> Exemplos: os assassinos de Liana Friedenbach, garota de 16 anos morta com o namorado após sessões de tortura patrocinadas por adolescentes num sítio em São Paulo. Ela foi escolhida como vítima de forma aleatória

SERIAL KILLER

Características
> Geralmente é um psicopata ou, em raros casos, outro tipo de doente (como um esquizofrênico paranóico e que ouve vozes) que possui uma característica peculiar: comete séries de homicídios, com intervalo de tempo entre eles. As vítimas são escolhidas ao acaso, mas obedecem a um padrão. O assassino elege um tipo de pessoa como alvo: mulheres, homossexuais, minorias raciais, crianças e outros tipos nos quais nota uma característica da qual não gosta. As vítimas têm, geralmente, mesma faixa etária e mesmo sexo
> Mata por algum tipo de prazer ou compulsão
> É obsessivo
> Muitas vezes ele deixa sua marca pessoal nas vítimas, até para ganhar a notoriedade desejada. Alguns recortam a pele dos corpos, outros fazem desenhos ou mutilações
> Na maioria das vezes, é considerado irrecuperável
> Exemplos: Adriano da Silva, que afirmou ter abusado sexualmente e matado 12 meninos no norte do Estado, e Paulo Sérgio Guimarães da Silva, o Titica, que atacava casais na beira-mar na praia do Cassino, tendo matado sete pessoas entre 1998 e 1999


Fonte: Zero Hora, 03/04/2008

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