sábado, 19 de abril de 2008

Judiciário é defasado em direitos humanos, diz Paulo Vannuchi

O ministro da Secretaria dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, classificou de gravíssima a decisão do Supremo Tribunal Federal, que suspendeu a retirada de não-índios da Raposa Serra do Sol, em Roraima. Para Vannuchi, a homologação da área de 1,7 milhão de hectares cumpriu os requisitos legais. “O Judiciário é a instituição mais defasada no que diz respeito aos direitos humanos”, avalia Vannuchi.

No dia 10 de abril, o STF manteve decisão liminar que suspendeu a Operação Upatakon 3. A decisão valerá até o julgamento de mérito de uma das ações propostas pelo governo de Roraima com objetivo de evitar a desocupação. Diante da ameaça de conflito social na região, o ministro Carlos Britto (relator) estipulou prazo de 60 dias para levar o assunto ao Plenário.

Segundo Vannuchi, “a intervenção interrompe um processo de mais de três anos, com todas as fases de convencimento postergadas, e que é um ato jurídico perfeito”. A afirmação foi feita no seminário O Caso Guarani Kaiowá: uma História de Violação dos Direitos Humanos, que aconteceu na Faculdade de Direito da USP nesta sexta-feira (18/4). A informação é da Agência Brasil.

O ministro, que também reconheceu falhas do Executivo, afirma que a decisão do STF é surpreendente, pois acredita que a ocupação da reserva por agricultores seja inconstitucional. Ele lembrou que o Supremo é justamente o tribunal encarregado de zelar pela Constituição.

Vannuchi disse, no entanto, que não é a primeira vez que o STF toma uma decisão contrária aos direitos dos índios. Em dezembro de 2005, o tribunal suspendeu a desocupação de reserva em Mato Grosso. Segundo o ministro, a medida acarretou conflitos entre índios e agricultores. Um líder indígena chegou a morrer por causa da decisão, afirma Vannuchi.

O professor Dalmo de Abreu Dallari, da USP, também criticou a decisão do Supremo. Segundo ele, a resolução dos conflitos em Roraima é simples: basta que a Constituição seja cumprida.

Para Dallari, tanto o Judiciário como o Ministério Público, que não denuncia os agricultores por manterem uma quadrilha na reserva, falham no trabalho de garantir os direitos indígenas. O professor destacou ainda que omissões do governo também colaboram para os conflitos. “A Constituição diz que o governo é responsável pela demarcação das áreas indígenas. Ele é deficiente no cumprimento desse dever constitucional.”

Crítica do exército

O general Augusto Heleno Ribeiro Pereira criticou a política indígena do governo, na quarta-feira (16/4), no seminário Brasil, Ameaças à sua Soberania, no Clube Militar. Ele definiu a política como "caótica" e "lamentável" e criticou a demarcação em área contínua da Raposa Serra do Sol. Ele vai para Brasília nesta sexta para se explicar frente ao comandante do Exército, Enzo Peri. A convocação do general foi definida na quinta-feira (17/4), depois do encontro do presidente Lula com o ministro da Defesa, Nelson Jobim e Peri.

Durante o seminário, Pereira considerou uma ameaça à soberania nacional a reserva contínua na região de fronteira. "Não sou da esquerda escocesa, que, atrás de um copo de uísque 12 anos, sentada na avenida Atlântica, resolve os problemas do Brasil inteiro. Já visitei mais de 15 comunidades indígenas, estou vendo o problema do índio."

Em nota, o Clube Militar disse que o general em nenhum momento feriu a disciplina e a hierarquia. “O que vimos foi a palavra de um chefe militar sobre assunto de sua inteira competência e responsabilidade. Sua afirmação de que o Exército não serve a governos e sim ao Estado está respaldada no que prevê o artigo142 da Constituição Federal ao definir as Forças Armadas como instituições nacionais permanentes”, diz a nota.

“É estranho o presidente da República pedir explicações sobre o caso. Não me consta que tenha adotado o mesmo procedimento quando ministros do seu partido contestam publicamente a política econômica do governo”, finalizou o Clube Militar.

Representantes de 40 etnias e associações indígenas brasileiras disseram nesta sexta ao presidente Lula que a presença de índios em regiões de fronteira não representa ameaça à segurança do país.

O presidente da Funai, Márcio Meira, também rebateu as declarações do general Heleno. “Os povos indígenas sempre estiveram nas fronteiras brasileiras defendendo o Brasil. Não há nenhum risco à soberania brasileira o fato de nós termos terras indígenas demarcadas em qualquer lugar, seja em faixa de fronteira seja fora de faixa de fronteira”, afirmou.

Revista Consultor Jurídico, 18 de abril de 2008

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