terça-feira, 24 de novembro de 2009

Direitos humanos: ressocialização de presos e combate à reincidência




Existem hoje no Brasil cerca de 446 mil presos, segundo dados apurados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Uma relação de 229 detentos para cada grupo de mil habitantes, quase o dobro do registrado na Argentina e mais que o triplo da taxa existente na Dinamarca. Do total de presidiários brasileiros, 57% já foram condenados, enquanto outros 43% ainda são provisórios e aguardam julgamento.
O Brasil é signatário de tratados que versam sobre direitos humanos como o Pacto de San José, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e a Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Todos eles proíbem o tratamento degradante do preso. Inclusive o Supremo Tribunal Federal está representado na ONU na busca de soluções para a população carcerária. O vice-presidente do STF, ministro Cezar Peluso foi eleito presidente e relator de uma comissão das Nações Unidas criada para estudar mudanças nas regras sobre tratamento de presos.
Mas como conviver com a superlotação, a falta de estrutura carcerária e de perspectiva de vida dentro e fora das celas? Iniciativas estão sendo tomadas no sentido de buscar melhores condições de vida para os detentos e os egressos o sistema prisional. Exemplos disso são os programas “Começar de Novo” e o “Mutirão Carcerário”, desenvolvidos pelo CNJ, atualmente sob a presidência do ministro Gilmar Mendes.
Mutirões carcerários
O déficit carcerário é de 156 mil vagas no Brasil. Se fosse retirado das celas todo o excesso de presidiários, daria para encher quase dois estádios do Maracanã. Desde setembro do ano passado, o CNJ tem realizado mutirões carcerários para identificar pessoas que já cumpriram pena ou que tenham direito à progressão de regime prisional e ainda continuam encarceradas. “As penitenciárias não podem ser depósitos de pessoas indesejáveis, mas um mecanismo de ressocialização”, defendeu o ministro Gilmar Mendes ao visitar o Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus (AM).
Além do Amazonas, foram realizados mutirões no Rio de Janeiro, Maranhão, Piauí e Pará. Esse trabalho já resultou na liberdade de mais de 2.200 presos que puderam exercer o direito à progressão prisional ou já tinham cumprido pena e ainda continuavam presos. Para o presidente do Supremo e do CNJ, não basta somente libertar as pessoas que estavam presas irregularmente. Esse trabalho, para ele, precisa ser acompanhado de “uma séria política de reintegração social”, para evitar a reincidência.
Essa questão é uma grande preocupação para o ministro Gilmar Mendes. De acordo com ele, “nenhum país logrou reduzir o índice de criminalidade e, portanto, melhorar os índices de segurança, sem atacar o problema sério da reincidência”. E os números fundamentam essa preocupação. Segundo dados obtidos a partir dos mutirões, os índices de reincidência variam entre 60% e 70%. Ou seja, sem perspectiva, o preso volta a praticar crimes quando retorna ao convívio social.
Começar de Novo
O projeto “Começar de Novo” busca sensibilizar entidades públicas e privadas para promover a ressocialização dos presos, por meio de propostas de trabalho e de cursos de capacitação profissional para presos e egressos do sistema carcerário, de modo a concretizar ações de cidadania e promover redução da reincidência.
Segundo dispõe o artigo 1º da Lei nº 7.210/84, a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.
Dessa forma, para que este dispositivo tenha eficácia, é preciso repensar a execução penal e o papel do Poder Judiciário como órgão responsável pelo cumprimento da lei, com medidas de reinserção social. A proposta do “Começar de Novo” é reduzir a taxa de reincidência para 20% a partir dos cursos profissionalizantes e oportunidades de trabalho.
Conforme prevê a Constituição de 1988, o Pacto de San José da Costa Rica e a Lei de Execução Penal, é preciso dar condições dignas ao preso. “Muito mais do que o valor pecuniário do salário, avulta nessa jornada a importância de resgatar-se inteiramente a dignidade do ser humano que mesmo havendo ultrapassado os limites da lei, em momento algum deixou de ser cidadão plenamente e respeitado por todos”, defende o presidente do STF e CNJ, ministro Gilmar Mendes.
No Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus, por exemplo, os presidiários do regime fechado trabalham em atividades de pedreiro, mecânico, panificação, manutenção de ar condicionado, mecânica de motos, marcenaria, pequenos objetos de madeira, cartonagem, oficinas de artesanato, oficinas de biojóias, eletricista e atendimento de primeiros socorros.
Parcerias
No Rio de Janeiro, o ministro Gilmar Mendes esteve no Complexo Penitenciário de Bangu e lá firmou convênios para a criação de oportunidades de trabalho para as pessoas egressas do sistema prisional. Também foram firmadas parcerias com entidades como Fifa, Fiesp, CBF e CNBB. Recentemente, o “Começar de Novo” recebeu mais um aval da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que renovou o convênio com o CNJ para dar formação profissional e emprego a centenas de ex-presidiários.
Para o presidente do STF e do CNJ, o programa “não é apenas humanístico, mas um programa de segurança pública”. Ao assinar a renovação do convênio, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, disse que o foco da parceria é a formação de profissionais preparados para trabalhar na construção civil.
Já a parceria com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) envolve a troca de experiências na área de ressocialização dos presos e egressos do sistema carcerário. “É uma parceria importante, pois a CNBB já tem um trabalho de longa data no sistema carcerário. Será um aprendizado e uma grande colaboração”, disse o ministro Gilmar Mendes, ao assinar o termo de cooperação junto com o secretário-geral da CNBB, Dom Dimas Lara Barbosa. Para D. Dimas, “o Começar de Novo tem a vantagem de envolver empresários e o gestor público para que eles possam acreditar na ressocialização dos apenados”.
Parceria semelhante foi firmada com entidades desportivas. O presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e do Comitê Organizador da Copa do Mundo de 2014, Ricardo Teixeira, vai recomendar às empresas que participarão das obras da Copa que contratem egressos do sistema carcerário. Para ele, "o futebol que é a porta de entrada para muitos brasileiros, passará a ser a porta de saída para aqueles que se perderam no meio do caminho". No próprio STF, há vagas para 40 detentos em processo de progressão de regime. “Há, por exemplo, um no gabinete da Presidência. Esse é um sinal para que o Brasil se engaje”, defende o presidente do STF, Gilmar Mendes.
Outros tribunais também estão encampando o projeto. Duzentos detentos devem trabalhar no Tribunal Superior do Trabalho (TST), outros 60 devem ir para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), e o Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) se prepara para aderir ao programa.

STF. Segunda-feira, 23 de Novembro de 2009.

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