Cabe ao Executivo dar a última palavra em casos de extradição. Por cinco votos a quatro, este foi o entendimento da maioria dos ministros. Pela primeira vez, o Supremo discutiu a competência do presidente da República frente a uma decisão do STF. No julgamento que decidiu pela extradição do italiano Cesare Battisti, nesta quarta-feira (18/11), a decisão final ficou nas mãos do presidente Lula.
A discussão sobre quem bate o martelo em casos de extradição começou depois de os ministros, por cinco votos a quatro, já terem autorizado a entrega de Battisti para o governo da Itália. Marco Aurélio e Joaquim Barbosa já haviam adiantado voto a favor de que a decisão final seja do Executivo e foram acompanhados por Eros Grau, Carlos Britto e Cármen Lúcia. O relator, Cezar Peluso, o presidente da corte, Gilmar Mendes, Ellen Gracie e Ricardo Lewandowski votaram para que o presidente da República seja obrigado a extraditar, ou seja, para eles, a decisão do STF em casos de extradição não é apenas uma autorização, mas uma determinação.
Para Gilmar Mendes, há uma inconsistência jurídica no fato de Battisti ser preso preventivamente até o julgamento da extradição e depois se dizer que o presidente está livre para decidir ou não e que o governo pode desrespeitar um tratado entre repúblicas. “O Supremo se ocupa com um tema como esse e depois surge uma decisão: não, nós estávamos brincando”, disse Gilmar.
Cezar Peluzo disse que não há nenhuma regra jurídica que dá poder discricionário ao presidente para que ele possa deixar de efetivar a extradição. “Essa obrigação já foi cumprida antes, ao Brasil fechar um tratado. É vontade da República do Brasil de fazer cumprir o tratado. Quem revogará a prisão do extraditando se ela é uma consequência do processo? Se o presidente tem esse poder, esse pedido nem deveria ter chegado ao Supremo Tribunal Federal”, afirmou.
Para Eros Grau, essa limitação dada ao presidente só existe no direito convencional. Segundo ele, tanto o tratado como a Constituição preveem que quem defere a extradição é o presidente da República, a quem cabe decidir nos termos do tratado internacional. “Diz o tratado que o presidente está ou não está obrigado a atender à decisão do Supremo, sem que isso esteja a desafiar a decisão do tribunal.”
A ministra Carmen Lucia seguiu o entendimento de Eros Grau. Carlos Britto também, argumentando que o Poder Judiciário é apenas um rito de passagem necessário. “Se não há julgamento de mérito, como obrigar o presidente da República a extraditar?”, questionou. Para ele, o Supremo Federal deve apenas garantir os mínimos direitos humanos e dignidade do extraditando. “Essa decisão deve limitar qual o campo de atuação do Supremo e do tribunal em casos de extradição. O Supremo aqui é um estranho no ninho. É o chefe de Estado quem vai concretizar a decisão.”
Já o ministro Ricardo Lewandowski discordou. “Os tratados uma vez internacionalizados têm no mínimo status de lei ordinária”, afirmou. Ellen Gracie seguiu o entendimento, votando pela última palavra do Supremo. Para ela, a única explicação para a polêmica criada neste caso é a vontade de constranger o presidente da República. “Nunca houve qualquer hipótese de desatenção do presidente da República frente a uma decisão deste tribunal nos seus 200 anos de história. Por que ela surge com tanto interesse nesse caso concreto?”, questionou. “Não há necessidade de criar polêmica onde ela não há. Não temos tempo para dar tantos votos extensos e ilustrados para não terem legitimidade.”
Em meio a discussões, Lewandowski questionou o voto de Eros Grau, que tentou por diversas vezes, explicar sua decisão. Desistiu. “Eu explicaria minhas razões, mas não há condições. Com isso, digo claramente que faço a maioria seguindo o voto de Carmen, Britto, Joaquim e Marco Aurélio.” Britto, então, reforçou que não cabe o Supremo policiar os atos do presidente. Marco Aurélio argumentou que o presidente não precisa de aconselhamento. “O presidente é pupilo do Supremo?”, questionou.
Revista Consultor Jurídico, 18 de novembro de 2009
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