890 mil brasileiros são apontados como usuários de cocaína; falta de acesso a tratamento motiva críticas.
O Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crime (Unodc) divulgou ontem o Relatório Mundial sobre Drogas 2009, celebrando os 100 anos do combate internacional às drogas, em tom de comemoração, ressaltando que "o mercado global de cocaína, de US$ 50 bilhões, sofreu abalos sísmicos, graças à cooperação internacional". A produção caiu 15% (a maior queda em cinco anos), o consumo caiu na maior parte dos países ou ficou estagnado. No Brasil, porém, o consumo da cocaína quase dobrou em três anos. Em números absolutos, 890 mil brasileiros são usuários, o que representava 0,7% da população entre 12 e 65 anos em 2007. Seis anos antes, esse índice era de 0,4%.
Há ainda a questão do aumento no consumo do crack, derivado mais barato da cocaína. Em um ano, o relatório mostra que triplicaram apreensões - de 145 mil para 578 mil quilos. "O crack vicia muito, agravando rapidamente o problema da dependência química", afirma Bo Mathiasen, representante da Unodc no Brasil.
As explicações para o descompasso entre queda de produção mundial e aumento de consumo de cocaína no Brasil são duas, segundo a Unodc. Uma é a melhora da situação econômica. Há mais pessoas inseridas na chamada classe média (hoje são 51%, conforme a Fundação Getúlio Vargas) e um dos reflexos do maior poder de compra é destinar mais dinheiro para entorpecentes (mais caros ou mais baratos). A outra razão é que o uso das substâncias ilícitas é mensurado por apreensões feitas pela polícia e pelos atendimentos dos serviços de saúde. Mais estruturados, os dois setores no País implicam mais estatísticas sobre o assunto. A Polícia Federal também atribui os números a uma maior repressão.
"No que diz respeito à produção, o Brasil não incomoda o mundo. O País não produz para exportação. Incomodamos por ser um país de trânsito excelente para o tráfico (que vem de Colômbia, Peru e Bolívia e segue para África e Europa), já que temos fronteiras com os maiores produtores de cocaína do mundo. São 9 mil km que temos de cuidar", analisou o secretário nacional de Políticas Antidrogas, general Paulo Uchoa. O relatório aponta que a América do Sul foi responsável, em 2007, por 45% do total mundial de apreensões de cocaína. O Brasil foi o 10º em apreensões.
A queda na produção mundial, de acordo com a ONU, seria um reflexo não apenas das ações de repressão, mas também do início da queda no consumo nos maiores mercadores consumidores - EUA e Europa, que estão em crise. Outra preocupação revelada no relatório é que essa queda na procura esteja por trás do crescimento da violência em países como o México, com cartéis da droga disputando palmo a palmo o mercado que resta. "Os índices de pureza e o número de apreensões estão diminuindo; os preços, aumentando; e os padrões de consumo, em evolução."
REPERCUSSÃO
Para a presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (Abead), Analice Gigliotti, o aumento do consumo de cocaína no Brasil "é uma tendência já há alguns anos e se deve à falta de oferta de tratamento aos usuários". Para ela, a solução seria que o País se mobilizasse no combate às drogas como o faz com relação ao fumo. "A política contra o tabaco tem de ser um pilar a ser seguido. É bem feita, abrangente e eficaz. Mas, por enquanto, o que vemos com relação à política antidrogas é um investimento muito pequeno."
A ONU considera, no relatório apresentado ontem, que a venda de drogas se mostra mais forte em regiões sem presença do Estado ou nas quais a ordem pública é frágil. E alerta que o futuro das chamadas megalópoles está ameaçado. "Só moradia, emprego, educação, acesso aos serviços públicos e ao lazer podem fazer as comunidades ficarem menos vulneráveis", disse o diretor do Undoc, Antonio Maria Costa.
Para o psiquiatra Ronaldo Laranjeiras, professor titular da Universidade Federal Paulista (Unifesp) e coordenador do Instituto Nacional de Políticas de Álcool e Drogas, os números apresentados pelo relatório confirmam que "o governo não tem feito a parte dele". "Qualquer país onde os números de consumo continuem aumentando tem de, no mínimo, rever políticas de combate às drogas e mandar embora quem fez as que não deram resultados", afirma. O País não tem, por exemplo, uma política específica para lidar com o crack.
O Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crime (Unodc) divulgou ontem o Relatório Mundial sobre Drogas 2009, celebrando os 100 anos do combate internacional às drogas, em tom de comemoração, ressaltando que "o mercado global de cocaína, de US$ 50 bilhões, sofreu abalos sísmicos, graças à cooperação internacional". A produção caiu 15% (a maior queda em cinco anos), o consumo caiu na maior parte dos países ou ficou estagnado. No Brasil, porém, o consumo da cocaína quase dobrou em três anos. Em números absolutos, 890 mil brasileiros são usuários, o que representava 0,7% da população entre 12 e 65 anos em 2007. Seis anos antes, esse índice era de 0,4%.
Há ainda a questão do aumento no consumo do crack, derivado mais barato da cocaína. Em um ano, o relatório mostra que triplicaram apreensões - de 145 mil para 578 mil quilos. "O crack vicia muito, agravando rapidamente o problema da dependência química", afirma Bo Mathiasen, representante da Unodc no Brasil.
As explicações para o descompasso entre queda de produção mundial e aumento de consumo de cocaína no Brasil são duas, segundo a Unodc. Uma é a melhora da situação econômica. Há mais pessoas inseridas na chamada classe média (hoje são 51%, conforme a Fundação Getúlio Vargas) e um dos reflexos do maior poder de compra é destinar mais dinheiro para entorpecentes (mais caros ou mais baratos). A outra razão é que o uso das substâncias ilícitas é mensurado por apreensões feitas pela polícia e pelos atendimentos dos serviços de saúde. Mais estruturados, os dois setores no País implicam mais estatísticas sobre o assunto. A Polícia Federal também atribui os números a uma maior repressão.
"No que diz respeito à produção, o Brasil não incomoda o mundo. O País não produz para exportação. Incomodamos por ser um país de trânsito excelente para o tráfico (que vem de Colômbia, Peru e Bolívia e segue para África e Europa), já que temos fronteiras com os maiores produtores de cocaína do mundo. São 9 mil km que temos de cuidar", analisou o secretário nacional de Políticas Antidrogas, general Paulo Uchoa. O relatório aponta que a América do Sul foi responsável, em 2007, por 45% do total mundial de apreensões de cocaína. O Brasil foi o 10º em apreensões.
A queda na produção mundial, de acordo com a ONU, seria um reflexo não apenas das ações de repressão, mas também do início da queda no consumo nos maiores mercadores consumidores - EUA e Europa, que estão em crise. Outra preocupação revelada no relatório é que essa queda na procura esteja por trás do crescimento da violência em países como o México, com cartéis da droga disputando palmo a palmo o mercado que resta. "Os índices de pureza e o número de apreensões estão diminuindo; os preços, aumentando; e os padrões de consumo, em evolução."
REPERCUSSÃO
Para a presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (Abead), Analice Gigliotti, o aumento do consumo de cocaína no Brasil "é uma tendência já há alguns anos e se deve à falta de oferta de tratamento aos usuários". Para ela, a solução seria que o País se mobilizasse no combate às drogas como o faz com relação ao fumo. "A política contra o tabaco tem de ser um pilar a ser seguido. É bem feita, abrangente e eficaz. Mas, por enquanto, o que vemos com relação à política antidrogas é um investimento muito pequeno."
A ONU considera, no relatório apresentado ontem, que a venda de drogas se mostra mais forte em regiões sem presença do Estado ou nas quais a ordem pública é frágil. E alerta que o futuro das chamadas megalópoles está ameaçado. "Só moradia, emprego, educação, acesso aos serviços públicos e ao lazer podem fazer as comunidades ficarem menos vulneráveis", disse o diretor do Undoc, Antonio Maria Costa.
Para o psiquiatra Ronaldo Laranjeiras, professor titular da Universidade Federal Paulista (Unifesp) e coordenador do Instituto Nacional de Políticas de Álcool e Drogas, os números apresentados pelo relatório confirmam que "o governo não tem feito a parte dele". "Qualquer país onde os números de consumo continuem aumentando tem de, no mínimo, rever políticas de combate às drogas e mandar embora quem fez as que não deram resultados", afirma. O País não tem, por exemplo, uma política específica para lidar com o crack.
Estadão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário