sexta-feira, 26 de junho de 2009

Aborto eugênico em pauta

A interrupção da gravidez, com mais de seis meses de gestação, de gêmeos xipófagos, unidos pela bacia e pelo abdômen, foi autorizada pela 3.ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, por maioria de votos.

A perícia médica realizada constatou que os fetos apresentam anomalias graves e que não há chances de sobrevida para eles após o nascimento.

Em defesa, os advogados da gestante sustentaram que a interrupção da gravidez é medida de urgência uma vez que a continuidade da gestação coloca em risco a vida da gestante, além de ser inviável a sobrevida dos fetos, já que ambos dividem o mesmo fígado e um deles não possui a formação dos membros inferiores.

O relator, Desembargador Luiz Pantaleão, votou contra a concessão de alvará para o aborto. Em seu entendimento, o Judiciário não deve contrariar a garantia constitucional do direito à vida, autorizando o aborto e a conseqüente morte dos gêmeos.

O caso envolve o já conhecido, pela doutrina e pela jurisprudência, “aborto eugênico” – quando o feto é portador de anomalia grave e sem cura –, figura que ainda não apresenta proteção legal.

Atualmente, o Código Penal permite o aborto apenas em duas situações: quando a gravidez é resultante de estupro e/ou quando não há outro meio para salvar a vida da gestante.

O desembargador Amado de Faria abriu divergência. Para ele, diante da gravidade na deformidade dos fetos, e com o potencial perigo que corre a gestante, outra conduta não poderia existir que não fosse a interrupção da gravidez, pondo fim ao sofrimento da gestante. O entendimento foi seguido pelo desembargador Geraldo Wohlers.

No Tribunal de Justiça de São Paulo já havia precedentes de concessões de interrupções das gestações de fetos com má formação ou com a Síndrome de Edwards.

As decisões sempre foram fundamentadas na impossibilidade de sobrevida do feto e no risco à vida da gestante, apesar de encontrar alguma resistência de alguns desembargadores.

No caso em tela, a maioria da turma julgadora entende que não cabe ao juiz ficar preso à letra da lei; que não serão os apegos a formalidades que resolverão os sofrimentos e angústias dos envolvidos no caso concreto.

Vale lembrar, ainda, que a Constituição Federal assegura à criança e ao adolescente,[1] o direito à vida, à saúde, a convivência familiar e comunitária, colocando-os a salvo de toda forma de negligência, discriminação e crueldade.

Apesar de o aborto eugênico não encontrar amparo legal, acertadamente decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo, que pode evitar maiores sofrimentos à mãe e aos demais familiares, mostrando a importância da aplicação dos princípios gerais do Direito em compromisso com os Direitos Humanos.

Agora, resta-nos aguardar o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, a respeito da permissão do aborto de fetos anencefálicos.

Vanessa Faullame Andrade

[1] Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão". (grifo nosso)

IBCCRIM.

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