terça-feira, 30 de agosto de 2016

Corte europeia julga se Europa deve aceitar regras de prisão perpétua nos EUA

Os juízes europeus vão dizer se as regras da prisão perpétua nos Estados Unidos estão de acordo com a Convenção Europeia de Direitos Humanos. Jurisprudência da Corte Europeia de Direitos Humanos estabelece que a prisão perpétua não pode tirar do condenado a perspectiva de um dia ser solto. A sua permanência atrás das grades precisa ser revista de tempos em tempos.
A corte agora vai julgar a reclamação de um acusado de assassinato nos Estados Unidos. Ele está preso no Reino Unido e luta para não ser extraditado. O acusado alega que, se for mandado para o país americano, será condenado à prisão perpétua sem nenhuma chance de ser solto. Se os argumentos dele forem aceitos pelos juízes europeus, a extradição deverá ser barrada para preservar os direitos do acusado. O caso deve começar a ser julgado só em janeiro de 2017.
Revista Consultor Jurídico, 29 de agosto de 2016.

Juiz deve recalcular pena que considerava tráfico privilegiado como crime hediondo

Como o Supremo Tribunal Federal já reconheceu que tráfico privilegiado não é crime hediondo, consiste em constrangimento ilegal ato de juiz que adota tese contrária. Assim entendeu o ministro Dias Toffoli ao determinar que a Justiça de São Paulo recalcule a pena de dois réus, em pedidos de Habeas Corpus apresentados pela Defensoria Pública.
Em ambos os casos, o juízo da execução havia rejeitado os pedidos, sob a justificativa de que continuava a entender o tráfico privilegiado como crime hediondo e que a decisão do STF não tem efeito vinculante (ou seja, juízes não são obrigados a respeitá-la). O Tribunal de Justiça de São Paulo e o Superior Tribunal de Justiça rejeitaram derrubar a decisão, pois não viram flagrante ilegalidade que justificaria a liminar.
Toffoli, porém, considerou que já ficou caracterizado constrangimento ilegal o ato do juiz que afastou entendimento da corte. O Plenário do STF concluiu, em junho, que o tráfico privilegiado não constitui crime hediondo, com base em um caso levado pela Defensoria Pública da União. Isso significa que pessoas condenadas pelo delito devem cumprir prazos para progressão de regime prisional e para livramento condicional mais curtos que os previstos na Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/90) e na Lei de Drogas.
Segundo o artigo 33, parágrafo 4º, da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), é possível a redução da pena de um sexto a dois terços no caso de tráfico privilegiado — quando o réu é primário, de bons antecedentes e não dedicado a atividade ou organização criminosa.
As decisões de Toffoli foram proferidas em dois pedidos de HC impetrados pelo defensor público Alexandre Orsi Netto, que atua em Sorocaba. Os números dos processos não foram divulgados. Com informações da Assessoria de Imprensa da Defensoria Pública.
Revista Consultor Jurídico, 29 de agosto de 2016.

Bullying: causa, consequência e possíveis soluções

E uma única semana, estudantes do Paraná confessaram que assassinaram um colega de classe por terem sofrido bullying e um adolescente russo, de 17 anos morreu dentro de uma sala de aula, na frente dos colegas, durante uma sessão de bullying homofóbico. Essas notícias dão uma dimensão da gravidade do assunto no mundo todo e de como é importante entender e combater essa prática. A agressividade contra o que é considerado diferente e a intolerância latente vêm transformando crianças e adolescentes e alvos e vítimas em potencial.
Foto: DINO
Estamos falando de tortura física e psicológica, de pessoas que são xingadas e apanham sem entender o motivo, enquanto outros acham graça da situação. Em muitos casos, professores e funcionários das escolas não sabem como agir e assistem a tudo isso passivamente. O bullying mostra toda a brutalidade que pode ser cometida em uma fase em que as pessoas ainda estão formando sua personalidade e seu caráter.
E não é porque determinado caso não termina em violência física ou em mortes trágicas como os mencionados acima, que ele deixa de ser grave. Veja, por exemplo, a história do garoto de 4 anos que cortou os cabelos porque não queria mais ser chamado de menina pelos colegas da escola.  Os aspectos físicos como a altura, o peso, a cor da pele ou o tipo de cabelo viram armas psicológicas para quem usa o bullying para atormentar a vida dos colegas.
Como reconhecer quando a criança está sofrendo bullying?
Lidar com críticas constantes ao seu corpo ou as suas atitudes, principalmente em uma fase cheia de inseguranças, não é fácil. Ataques preconceituosos transformam crianças alegres em seres tímidos e isolados. Muitas vezes os pais não percebem o problema logo de cara ou não identificam a causa.
A falta de diálogo sobre o tema prejudica ainda mais a questão. Para combater os efeitos da violência psicológica intencional, é preciso falar sobre ela e ver seus sinais. O bullying é doloroso e cruel e nem sempre é fácil compartilhar o problema.
Para identificar e combater casos de bullying primeiro é preciso não enxergar as perseguições como brincadeira e saber que as consequências podem ser sérias. As vítimas podem desenvolver sérios problemas de autoestima e grandes dificuldades para confiar nas pessoas e se relacionar. Diminuir a incidência desse tipo de comportamento envolve ações conjuntas e mudanças de postura por parte da escola, família e até das autoridades policiais, em alguns casos.
Identificando a vítima e os agressores
Os agressores costumam ser populares na escola e ter uma postura agressiva para com os professores, os colegas e a família. Já as vítimas costumam se isolar e ter poucos amigos. Elas podem ter sinais de depressão e baixo rendimento escolar.
Sofrer agressões físicas, ser excluído de algum grupo, ser alvo de fofocas ou se submeter a algum tipo de dominação. Passar por esses ataques deixa estragos visíveis, que podem ser facilmente percebidos na vida pessoal e escolar. Além de causar baixa autoestima e dificuldade de relacionamento, o bullying afeta a saúde e leva ao desenvolvimento de doenças como a bulimia e a anorexia, além de ser um fator muitas vezes determinante na decisão de cometer suicídio.
Conversar e saber o que está acontecendo no dia a dia, o que os colegas dizem, identificar mudanças de comportamento, tudo isso é essencial. Caso contrário, a descoberta pode se dar tarde demais. As marcas podem ficar para sempre.
Como superar?
Crianças muito infantilizadas ou protegidas, que ouvem com frequência frases desestimulantes da família do tipo "você só me traz problemas" e que não conseguem se impor ou serem ouvidas em um grupo podem ser vítimas em potencial. Já os agressores têm dificuldade em ouvir "não". Os dois, tanto vítima quanto agressor, precisam de ajuda psicológica.
Superar o bullying tem a ver com perceber que os valores pesam mais do que qualquer diferença. A partir do momento em que a pessoa percebe que merece respeito e que deve tratar o outro como quer ser tratado, o problema deixa de existir. E para isso, as crianças e adolescente precisam de ajuda e apoio.
O único jeito de passar por cima das perseguições é aprender a fazer das acusações de "baixinho", "gordinho", "sardento", e por aí vai, armas de aceitação para fortalecer ainda mais sua personalidade. Quando se percebe que o que o outro acha não determina quem você é ou qual será seu futuro é que a gente se torna protagonista da própria vida.
Tratando a consequência e coibindo a causa
Fazer terapia pode ajudar a melhorar a autoestima da vítima e ensiná-la a lidar melhor com suas emoções, mas em alguns casos, pode ser recomendada até mesmo a mudança de escola para que a criança não adquira uma aversão ao ambiente escolar. Já quem pratica bullying pode ter um transtorno de conduta que impede a terapia individual de ter resultados tão bons, por isso pode ser necessário que toda a família se submeta ao processo. É importante saber até onde vai o bullying que a criança pratica para poder identificar esses possíveis transtornos.
A principal maneira de combater e prevenir o bullying é debatendo o assunto. Filmes educativos, palestras que mostrem as consequências negativas dessa prática, tudo isso ajuda. Além, é claro, de incentivarmos e apoiarmos que as vítimas denunciem seus agressores e que quem comete esse tipo de violência seja punido.
É importante reforçar sempre que a vítima não deve se envergonhar ou se calar. Incentivar a busca por apoio na escola e com a família é essencial e, até mesmo, levar o caso à polícia quando for o caso. Só com essa postura podemos prevenir que mais jovens percam a vida ou continuem sofrendo por causa desse tipo de violência.
Você conhece algum projeto interessante de combate ao bullying ou tem alguma sugestão sobre como trabalhar essa questão? Conte pra gente nos comentários!
Terra. 29/08/2016.

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Audiências de custódia completam um ano no Ceará com 6,5 mil decisões

Vara de Custódia de Fortaleza realiza 669 audiências em mutirãoDivulgação/TJCE
O projeto Audiência de Custódia, lançado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), completou um ano de funcionamento no Ceará no domingo (21/8). A competência de realização da audiência é da Vara Única de Audiência de Custódia do Fórum Clóvis Beviláqua. Foram proferidas 6.518 decisões no período, segundo a titular da unidade, juíza Marlúcia Bezerra. Dos réus analisados, 3.706 tiveram a prisão decretada e 2.812 receberam liberdade. Desses, 2.442 por meio de medidas cautelares, 353 por alvarás de soltura e 17 por relaxamento de prisão.
O trabalho realizado em parceria com o Ministério da Justiça e consiste na garantia da rápida apresentação do preso a um juiz nos casos de prisões em flagrante. A ideia do projeto é que o acusado seja apresentado e interrogado por juiz, em audiência, onde conta também com as manifestações de representantes do Ministério Público, da Defensoria Pública ou do advogado do preso.
“O objetivo central da implantação das audiências de custódia, que julgamos ter alcançado, é a apresentação do preso em flagrante sem a demora da presença da autoridade judiciária que decide sobre sua prisão, ou seja, sobre a regularidade do auto, a conversão da prisão em flagrante em preventiva ou a concessão da liberdade provisória com ou sem medidas cautelares”, destacou a magistrada.
A unidade conta com a atuação de quatro juízes, nove servidores, seis estagiários, todos do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), além de equipe com seis policiais militares e dois servidores da Secretaria de Justiça, possibilitando, assim, cerca de 40 audiências por dia.
Fonte: TJCE. 26/08/2016.

Estudantes dizem mais praticar do que sofrer bullying, mostra pesquisa do IBGE

Assim como na pesquisa de 2012 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais entrevistados relataram em 2015 terem praticado do que sofrido bullying, não apenas na escola, mas em qualquer ambiente que frequentam. Meninas são menos provocadoras do que meninos: 15,6% das alunas disseram já ter praticado bullying, enquanto entre os alunos a proporção sobe para 24,2%. A prática é um pouco mais frequente nas escolas privadas (21,2% dos entrevistados disseram fazer bullying) do que na rede pública (19,5%).
Sofreram bullying com frequência 7,4% (194,6 mil) dos alunos do 9º ano, principalmente por causa da aparência do corpo ou do rosto. A incidência das provocações é um pouco maior nas escolas públicas (7,6%) que nas particulares (6,5%).
Quase um quarto dos jovens (23,4%) disse ter se envolvido em briga ou luta física nos 30 dias anteriores à pesquisa. Entre os meninos, chegou a 30,3% os que se envolveram em brigas e, entre as meninas, 16,8%.
A proporção é semelhante nas escolas públicas e particulares. Embora em proporções menores, porém mais perigosas, as brigas com armas de fogo envolveram 5,7% dos jovens, ou 150 mil alunos. Neste caso, há grande diferença entre as escolas, com incidência na rede pública quase duas vezes maior que na rede privada (6,1% e 3,4% respectivamente).
Trabalho
Entre os alunos do 9º ano, 13,4% (352,4 mil) disseram ter algum tipo de trabalho, em 2015. O porcentual se manteve em relação à pesquisa de 2012. Trabalham em troca de dinheiro 12,2% dos entrevistados e 1,2% disse não receber pelo trabalho.
A maior incidência de jovens do último ano do fundamental que acumulam estudo e trabalho foi registrada em Goiás, com 22%, seguida de Mato Grosso do Sul (20,9%) e Santa Catarina (20,2%). Os menores índices estão no Rio Grande do Norte (7,1%), Piauí (7,8%) e Acre (8,1%).
Veja o vídeo - https://globoplay.globo.com/v/5263004/

Em 2015, Justiça recebeu 10% mais ações sobre agressão contra mulher

Em 2015, a Justiça brasileira recebeu 10% mais processos sobre agressões contra mulheres, em comparação a 2014. Foram mais de 263 mil novas ações, enquanto que no ano anterior foram 239.930 novos casos nos tribunais estaduais. No período, o número de medidas protetivas aplicadas pelo Judiciário teve igual aumento, quando mais de 328 mil decisões nesse sentido foram concedidas. Em 2014, foram mais de 298 mil medidas protetivas.
Dados mostram que concessão de medidas protetivas acompanhou o aumento de ações por violência doméstica entre 2014 e 2015.
Reprodução
Os dados são de uma pesquisa, ainda incompleta, com ações criminais relacionadas à Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) e foram divulgados pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça.
Para a presidente do Fórum Nacional de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Fonavid), juíza Madgéli Frantz Machado, os dados expressam uma mudança de comportamento na sociedade ao lidar com essa questão. “Acredito que esses casos já vinham acontecendo [...] As mulheres tomaram coragem de fazer essas denúncias e, hoje, um número muito maior delas busca o Judiciário quando se vê em situação de violência doméstica.”
Estrutura de atendimento
Segundo o Mapa da Violência do Brasil 2015, o Brasil está na quinta colocação em casos de assassinatos de mulheres. E, apesar da violência contra a mulher não ser algo recente, o Estado brasileiro estabeleceu parâmetros para lidar com a questão somente nos últimos anos.

Ao todo, o Brasil tem 106 varas especializadas em violência doméstica para cuidar de aproximadamente 430 mil processos. Há cerca de mil profissionais atuando nessas serventias judiciais exclusivas. Desse total, 100 foram criadas nos últimos dez anos. A criação de juizados exclusivos, formado por equipes multidisciplinares, foi uma recomendação do CNJ aos tribunais, seis meses depois que a Lei Maria da Penha foi aprovada. Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ.
Revista Consultor Jurídico, 28 de agosto de 2016.

Provável Suprema Corte liberal pressupõe grandes mudanças nos EUA

Há quase 50 anos, o Partido Republicano “tomou o poder” na Suprema Corte dos EUA e não saiu mais. Isto é, a maioria dos ministros sempre foi conservadora durante esse período, porque mais ministros foram indicados por presidentes republicanos do que por democratas. E a maioria conservadora configurou espectro jurídico do país, do jeito que ele é hoje.
Se o que indicam as pesquisas eleitorais no momento se preservar até as eleições presidenciais de novembro, a candidata democrata Hillary Clinton deverá ser eleita presidente e, durante seu mandato, deverá nomear pelo menos três ministros liberais para a Suprema Corte. A primeira nomeação será a do substituto de Antonin Scalia, que morreu em fevereiro — e era conservador.
Assim, se efetivamente vencer as eleições, o Partido Democrata vai “assumir o poder” na Suprema Corte dos EUA logo no início de 2017. Por isso, a configuração da Suprema Corte, que pode continuar conservadora ou se tornar liberal, tornou-se um dos principais temas do debate eleitoral deste ano. Uma transição de “poder” implica grandes transformações no país.
Diversas mudanças deverão ser promovidas no espectro jurídico do país logo no primeiro mandato de Hillary Clinton, se ela efetivamente chegar à Casa Branca. Uma corte liberal fará o possível para liberar o país de algumas de suas cargas pesadas, como a pena de morte, o confinamento de presos em solitárias e prisões em massas. Irá corrigir manobras legislativas para manipular eleições e, entre outras coisas, poderá criar o direito a um advogado para réus pobres em ações civis.
A publicação Vox apresentou, em um artigo assinado por Dylan Matthews, faz uma previsão das mudanças mais significativas que uma corte liberal irá processar no país, a partir do ano que vem — caso os democratas vençam as eleições:
Pena de morte
Para a pena de morte ser extinta nos EUA, basta que a Suprema Corte decida que esse tipo de punição é “cruel”. A Oitava Emenda da Constituição do país proíbe a imposição de pena cruel e incomum. Se a pena de morte é uma punição incomum é discutível: 30 dos 50 estados ainda a adotam, 20 estados a aboliram e em quatro estados os governadores a colocaram em moratória.

Alguns estados, entre os que ainda mantêm a pena de morte, continuam aplicando a sentença, mas nunca a executam. Deixam o condenado no corredor da morte até que a morte natural o leve. Os atuais ministros liberais da corte tendem a abolir a pena de morte, mas são minoria. Em um caso julgado em 2015, o ministro Stephen Breyer declarou, em um voto, que a pena de morte é uma punição cruel e incomum, com base em quatro premissas:
1) a corte já decidiu que sentenças de pena de morte só devem ser aplicadas em casos apropriados para ser constitucional e a frequência de execuções em casos de condenações erradas mostra que essa sentença não é confiável;
2) a punição é aplicada arbitrariamente, com alguns dos “piores dos piores” escapando dela, enquanto alguns criminosos de menor envergadura são executados;
3) o tempo de espera entre a condenação e a execução é cruelmente longo;
4) o declínio do uso da pena de morte no país tornou essa punição “inconstitucionalmente incomum”.
Assim, mais do que simplesmente propor a extinção da pena de morte, Breyer apresentou um discurso para desestimular sua aplicação. Seria infrutífero propor a extinção da pena de morte a uma corte com maioria conservadora.
Um argumento que move o ministro conservador Anthony Kennedy que, vez ou outra, vota com os liberais, é o de que “a pena de morte não é compatível com a dignidade humana”. Outro é o de que a pena de morte é discriminatória, porque é aplicada de uma forma altamente desproporcional a réus negros.
A eliminação da pena de morte poderia se dar por iniciativa do Congresso dos EUA, mas isso não vai acontecer. A base eleitoral conservadora do Partido Republicano é a favor da pena de morte ou, senão, da prisão perpétua e de penas longas para criminosos em geral. Uma pequena parte da base eleitoral do Partido Democrata também. Os políticos sustentados por essas bases sabem que não serão reeleitos se contrariarem a vontade de seus eleitores.
Confinamento em solitária
O fim do confinamento em solitária, se não total, mas pelo menos por prazos maiores do que o estritamente necessário, é a medida mais provável que uma corte sob o domínio liberal irá tomar. O ministro Kennedy já demonstrou sua aversão ao confinamento em solitária, em um voto em que mencionou o caso de um preso que já estava há mais de 25 anos nessa situação.

Kennedy deixou a entender em seu voto a esperança de que advogados solicitassem à Suprema Corte o julgamento da constitucionalidade do confinamento em solitária por longo prazo, com base no argumento de que tal punição é “cruel e incomum” e, portanto, proibida pela Oitava Emenda. De acordo com o artigo da Vox, ele praticamente desafiou os advogados a fazer isso e sugeriu que, se um caso chegasse à corte, ele estaria inclinado a limitar sua prática.
A professora de Direito da Universidade da Califórnia Sharon Dolovich, diretora do Programa Lei e Política Prisional, disse à publicação que o confinamento em solitária é “um dos grandes problemas não resolvidos na Justiça Criminal do país, mas que, definitivamente, será solucionado em breve”.
Segundo a diretora, de 80 mil a 100 mil presos estão confinados em solitária, a qualquer momento, nos EUA. Em muitos estados, a permanência de presos em solitárias dura vários anos. Tem sido assim desde a década de 80, sem qualquer interferência de tribunais federais para impedir essa prática.
Um relatório especial das Nações Unidas sobre tortura pediu o banimento total de confinamentos em solitária que durem mais de 15 dias. Nos EUA, “especialistas médicos” já opinaram que “o confinamento em solitária constitui uma forma de tortura”.
Encarceramento em massa
Algumas estatísticas indicam que os Estados Unidos têm 2,3 milhões de prisioneiros, outras, 2,6 milhões. De qualquer forma, é a maior população carcerária do mundo, o que implica superlotação nos presídios e cadeias por todo o país.

Isso é uma consequência do que a comunidade jurídica dos EUA já definiu como “encarceramento em massa”, um fenômeno que decorre de diretrizes de sentenças draconianas, definidas em lei. E especialmente de leis que estabeleceram penas mínimas, de longa duração, para vários tipos de crime, tanto em nível federal quanto em estadual.
A capacidade dos tribunais de reverter essas leis é fraca, em comparação com o que os legislativos federal e estaduais poderiam fazer. Mas os políticos não querem tomar nenhuma medida legislativa que permita o retorno de condenados às ruas em curto ou médio prazo.
A medida mais provável que os tribunais, apoiados pela Suprema Corte, podem tomar é forçar os políticos, incluindo os governadores, a reduzir a população carcerária por aumentar os custos do encarceramento. Uma maneira de fazer isso é obrigar os administradores das prisões a cumprir as exigências de manter condições carcerárias legalmente aceitáveis para os presos. O aumento de custos é um fator que convence os políticos.
Foi com base nessa justificativa que um tribunal da Califórnia ordenou em 2011 — e a Suprema Corte dos EUA sustentou — a redução da população carcerária do estado em dezenas de milhares de prisioneiros, para minimizar o problema de superlotação. A medida realmente resultou no fim da superlotação dos presídios, mas isso se tornou apenas uma história da Califórnia. Os demais estados não lhe deram importância, até agora, porque não foram obrigados a fazer a mesma coisa.
Outra coisa que a Suprema Corte poderá fazer é derrubar a Lei da Reforma de Contenciosos Prisionais de 1996. Essa lei limitou grandemente a possibilidade de prisioneiros reclamarem na Justiça das más condições de encarceramento, que incluem riscos à saúde dos prisioneiros. Isso poderá acontecer se os ministros liberais controlarem a corte.
Doações a campanhas eleitorais
Nenhuma decisão da Suprema Corte conservadora provocou mais protestos e furor nos últimos anos do que a que determinou que corporações são “pessoas” e, portanto, podem fazer doações a campanhas eleitorais no valor que quiserem — um caso que ficou conhecido como "Citizens United".

A decisão beneficia não apenas os relacionamentos de corporações com candidatos a cargos executivos e legislativos, como com candidatos a cargos de juízes. Nos estados, juízes são eleitos para cargos em tribunais de primeiro grau, tribunais de recurso e tribunais superiores (em alguns estados chamados de Suprema Corte do estado).
Isso permite, por exemplo, que corporações estabeleçam como jurisdição, para qualquer disputa judicial, aquela em que ajudou juízes a se elegerem. No Congresso, a maioria dos parlamentares fica “devendo o favor” a determinadas corporações. Nos executivos, principalmente os estaduais, ocorre a mesma coisa.
Reverter o “Citizens United” é uma tarefa complexa. Mas a Suprema Corte poderá, pelo menos, limitar seus efeitos. A campanha de Hillary Clinton anuncia, com frequência, que irá nomear ministros para a Suprema Corte comprometidos com o objetivo de reverter o Citizens United, para que as grandes corporações e bilionários parem de comprar eleições.
Porém, a simples extinção do Citizens United é improvável, porque a Suprema Corte dificilmente reverte suas próprias decisões de uma forma explícita, especialmente quando são recentes. Mas a corte poderá minar seus efeitos, sustentando regulamentações que limitam a capacidade de grandes corporações e bilionários financiarem eleições. A esperança é minguar o Citizens United progressivamente, até que morra por inanição.
Direito ao voto
Em 2013, a Suprema Corte eliminou um artigo da Lei dos Direitos ao Voto, que obrigava os estados e condados a submeter quaisquer mudanças na legislação eleitoral à pré-aprovação do Departamento de Justiça, que iria se certificar de que tais mudanças não iriam violar os direitos de voto das minorias.

A consequência foi que qualquer violação aos direitos ao voto deveria ser contestada na Justiça pelos próprios eleitores prejudicados, depois que uma nova lei fosse aprovada. Os tais eleitores prejudicados são, normalmente, cidadãos pobres, integrantes de minorias, sem recursos e conhecimentos para mover tais ações. E, quando o fizeram, o processo na Justiça é lento e, portanto, ineficaz.
Tais legislações colocam restrições ao direito ao voto. Uma delas, por exemplo, é que o eleitor tem de apresentar, antes de votar, sua carteira de identidade — geralmente, a carteira de motorista. Mas, eleitores pobres não têm carros ou não têm dinheiro para pagar as taxas e, portanto, não tiram carteira de motorista. Assim, são excluídos do processo eleitoral.
Os eleitores pobres tendem a votar no partido que oferece (ou poderá oferecer) mais programas sociais. E isso, nos EUA, fica a cargo do Partido Democrata. Os republicanos, de uma maneira geral, entendem que programas sociais só servem para desestimular os cidadãos a não estudar e a não trabalhar arduamente porque o governo irá cuidar deles.
Assim, as restrições ao direito ao voto são vistas, de uma maneira geral, como uma manobra dos republicanos conservadores para eliminar votos desfavoráveis.
Combate ao “gerrymandering”
O “gerrymandering” é uma manobra eleitoreira possibilitada pelo sistema de voto distrital. A manobra é feita na elaboração do mapa eleitoral que reparte uma determinada região em distritos. A intenção é favorecer o voto da população branca, da qual faz parte a maioria dos eleitores republicanos (embora também haja democratas), em detrimento da população negra, latina ou pobre de uma maneira geral, que tende em votar em candidatos democratas que defendem benefícios sociais.

Há dois tipos de manobra. Um consiste em aglomerar toda uma população negra (latina ou pobre) em um grande distrito, que é cercado, por exemplo, por três distritos “brancos” menores. Assim, como o voto é distrital, os distritos “brancos” elegerão três parlamentares e o distrito “negro” apenas um.
O outro é um pouco mais cruel. Na elaboração do mapa distrital, reparte-se uma grande área de população negra em três ou quatro áreas pequenas, juntando a cada uma delas uma área de população branca com um número maior de eleitores. Assim, no final das contas, as quatro áreas terão maioria de voto “branco”.
Esse é um problema típico dos estados do sul dos Estados Unidos, onde há uma grande população negra e latina e a população branca tende a ser conservadora e eleitora, portanto, de candidatos republicanos. Nos estados do Norte, mesmo a população branca tende a ser mais liberal e votar em candidatos democratas.
Mas o “gerrymuandering” pode acontecer em outras regiões do país, onde o partido no poder se encarrega de fazer a manobra. “O resultado é que a oposição recebe uma proporção das cadeiras parlamentares inferior à percentagem da população que efetivamente votou em seu candidato”, explica a Wikipédia.
Existem propostas para acabar com o “gerrymandering” — em vez de acabar com o voto distrital — e um pedido foi feito nesse sentido à Suprema Corte recentemente. Mas a corte, de maioria conservadora, lavou as mãos com o argumento de que não havia padrões firmes para criar distritos eleitorais. As previsões são de que uma corte de maioria liberal irá conseguir definir padrões para uma divisão equitativa do voto distrital no futuro.
Direito ao aborto
Embora o direito ao aborto seja garantido nos EUA, há restrições que os liberais gostariam de eliminar. E também há um propósito de tornar o aborto um procedimento médico coberto pelo Medicaid, o seguro-saúde para os pobres do país. Os liberais defendem o argumento que a ministra da Suprema Corte Ruth Ginsburg vem apresentando há tempos, de que o direito ao aborto não é apenas uma questão de liberdade individual, mas uma questão de igualdade de gêneros. As restrições ao aborto oprimem as mulheres, sem afetar os homens, o que seria inconstitucional.

Direito a advogado em ações civis
Há algum tempo, parte da comunidade jurídica vem sonhando com a possibilidade de o país criar um “Gideon civil” — uma referência à jurisprudência criada no julgamento do processo Gideon versus Wainwright, em que o direito do réu a um advogado em processos criminais foi sacramentado.

A proposta sugere que demandantes pobres que queiram, por exemplo, processar o locador ou o empregador, tenham direito a um advogado. Os liberais do país simpatizam com essa proposta, mas ela é um tanto utópica. O direito mais desrespeitado no país é provavelmente o do réu a um advogado em processos criminais. Uma grande quantidade de réus faz a autodefesa (chamada representação per se), porque a Defensoria Pública não consegue atender a demanda.
Direito à educação
Uma decisão da Suprema Corte de 1973, por 5 votos conservadores contra 4 liberais, estabeleceu que “não existe direito federal à educação”. De lá para cá, o sistema educacional nos EUA, principalmente o do ensino fundamental e do ensino médio, vem se degradando ano a ano. As universidades estão cada vez mais caras. E um estudante pode ter uma dívida de US$ 50 mil a US$ 150 mil no dia da formatura.

Os liberais esperam que, um dia, a Suprema Corte reverta essa decisão. Argumentam que a educação, pelo menos uma educação mínima, é um pré-requisito necessário para habilitar o acesso do cidadão a outros direitos.
 é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 28 de agosto de 2016.

Macarrão instantâneo virou a moeda de troca mais valiosa em prisões dos EUA

O macarrão instantâneo do tipo lámen (mais conhecido no Brasil pela marca miojo) se tornou a moeda de troca mais valiosa nas prisões dos Estados Unidos. Superou o cigarro, que sempre foi a moeda de troca tradicional no mercado negro das prisões. O fenômeno foi descrito em um estudo da Associação Americana de Sociologia (ASA – American Sociological Association), conduzido por Michael Gibson-Light, da Escola de Sociologia da Universidade do Arizona.
A explicação para a mudança tem origem nos sucessivos cortes de verbas para manutenção das prisões estaduais. As autoridades carcerárias decidiram que a alimentação dos presos deveria ser reduzida à frugalidade. O resultado real foi o de que as refeições se tornaram intragáveis e insuficientes para alimentar uma pessoa. O estudo diz quem não tem o macarrão instantâneo para preparar na cela, passa fome.
O sucesso do ramen (como é conhecido nos EUA) deriva do fato de ser um alimento barato, acima de tudo, saboroso, nutritivo por ser rico em calorias e não perecível – isto é durável – diz a teoria carcerária. Na prática, é a única alimentação considerada “decente”, disponível aos presos. Por ser barato, é fornecido pelos parentes ou outros grupos de apoio dos prisioneiros.
Para o estudo, isso configura uma “frugalidade punitiva”. De uma maneira indecorosa, o estado transferiu a responsabilidade de alimentar os presos — ou parte do ônus e dos custos de manutenção da prisão — para suas famílias e amigos.
Assim, quem tem um estoque de lámen na prisão tem um cofre recheado de moedas de troca. Com o macarrão instantâneo, é possível adquirir roupas, produtos de higiene, envelopes, selos e até mesmo cigarros. Ainda se pode pagar por serviços, como de limpeza de cela e de lavanderia, a presos sem o suprimento.
Há um uso menos nobre para essa nova moeda de troca, no entanto. Em jogos de apostas, especialmente de baralho, os presos estão usando seus estoques de macarrão instantâneo como cacife, diz o estudo.
A ascensão do lámen é considerada um “fenômeno”, porque a forma de dinheiro não é algo que muda frequentemente, mesmo na economia informal das prisões, diz o estudo. Os cigarros eram usados como principal moeda de troca nas prisões desde a Guerra Civil, nos presídios militares. Por isso, há indicações de que há sérias implicações por trás desse fenômeno, afirma o estudo.
“Lámen na prisão é ouro. Por lámen, pode-se matar”, disse ao The Washington Post Gustavo “Goose” Alvare, coautor do livro “Prison Ramen: Recipes and Stories from Behind Bars" (Lámen na prisão: receitas e histórias de por trás das grades).
Ele, que passou alguns anos por trás das grades, por duas vezes, e hoje vive no México, disse que não criou aversão à iguaria. Ao contrário, desenvolveu diversas “receitas inovadoras” para o macarrão instantâneo. Uma delas: lámen com ostras defumadas, cebola picadinha, coentro, pequena quantidade de maionese e molho apimentado.
Revista Consultor Jurídico, 27 de agosto de 2016.

Dez anos do fracasso da lei de drogas no Brasil

* Por César Muñoz Acebes
Nesta mesma semana, dez anos atrás, o Brasil aprovava uma lei destinada a distinguir perigosos traficantes de drogas dos simples usuários. Ao substituir penas de prisão por serviços comunitários, entre outras medidas, para usuários de drogas ilícitas e aumentar as penas para o tráfico, a nova lei buscava reduzir o número de pessoas presas por posse de drogas e enfraquecer as organizações criminosas.
Nada disso aconteceu.
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Em 2005, 9% das pessoas presas respondiam por crimes relacionados a drogas - essa taxa agora é de 28%, e entre mulheres, 64%.
A Lei 11.344 de 2006 tem contribuído para o aumento explosivo da população carcerária do Brasil na última década. Mais de 620.000 presos se amontoam em estabelecimentos construídos para uma capacidade total de cerca de 370.000 pessoas.
Vejamos o caso de "Roberto" (assim chamado para respeitar sua identidade).
Roberto é um jovem preso no complexo prisional do Curado, em Recife, que conheci quando ali estive no ano passado.
A polícia o prendeu em junho de 2013 por tráfico de drogas após encontrar 15 gramas de maconha, no valor de 50 reais, em um matagal ao lado de um campo de futebol onde Roberto estava jogando com os amigos.
No julgamento, um policial disse que as drogas estavam a 2 ou 3 metros de Roberto, mas um outro policial disse que elas estavam entre 15 e 20 metros de distância.
A única prova contra ele era o testemunho da outra pessoa acusada de tráfico de drogas no caso: uma criança que disse que Roberto era o dono da droga.
A mãe de Roberto me disse que ele a ajudava em uma loja de sapatos onde ela trabalhava e usava parte do dinheiro que recebia para comprar maconha para fumar, mas que ele não era traficante.
Apesar das frágeis evidências contra ele e a pequena quantidade de drogas envolvida, o juiz condenou Roberto a quatro anos e dois meses de prisão por tráfico de drogas.
Após a lei de 2006, muitos usuários foram simplesmente processados criminalmente como traficantes, já que a lei não fixa uma quantidade mínima de drogas para diferenciar usuários de traficantes.
A lei não serviu para enfraquecer as organizações criminosas e, na última década, o Brasil experimentou um aumento dos crimes violentos.
Estudos feitos por Luciana Boiteux, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Maria Gorete Marques de Jesus e Marcelo da Silveira Campos, ambos da Universidade de São Paulo, constataram que a lei é principalmente usada para punir pessoas como Roberto pela posse de pequenas quantidades de drogas, que são ou usuários ou pequenos traficantes, que as organizações criminosas podem substituir facilmente.
Na prisão, eles podem ser recrutados pelas próprias organizações criminosas que a lei se propunha a combater. A mãe de Roberto me disse que outros presos o pressionavam para se juntar a uma facção.
Conceitualmente, a lei de 2006 foi um avanço ao estabelecer que as pessoas não devem ser presas por uso de drogas. Mas ela teve consequências muito prejudiciais que não haviam sido antecipadas.
E ela não foi longe o suficiente porque ainda considerou o uso de drogas um delito.
A criminalização do uso, produção e distribuição de drogas alimenta o crescimento de organizações criminosas e enche as prisões de pessoas que não deveriam estar lá.
O Brasil deve descriminalizar a posse de drogas para uso pessoal e olhar para outras maneiras, além da criminalização, de regular de forma eficaz a distribuição de drogas.
* Cesar Muñoz Acebes é pesquisador da Human Rights Watch no Brasil.


VOCÊ É NORMAL?

Você lembra quem você era antes do mundo te dizer como você deveria ser?

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Você mudou? É hoje a mesma pessoa de uma década atrás? Evoluiu ou regrediu? Saberia dizer? Você é normal? Tornou-se diferente? Se sim, o que o fez mudar? A vida, os acontecimentos, os relacionamentos, você mesmo ou os dedos das pessoas apontados para você? As pessoas precisam, deliberadamente, criar sociedades, padrões, rotular todos e cobrar de quem pensa fora da caixa, é assim que se domina, e pode ser bem cruel com quem não está preparado. Você está?
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Há os mais variados tipos de sociedades ao redor do mundo, a maioria são comunidades civilizadas, politizadas, religiosas/espiritualizadas ou não. Desde sempre, o mundo é protagonizado por rituais e práticas sistêmicas que fazem com que seus membros desejem se sentir incluídos, com direito a todos os ritos de passagem e modelos familiares/religiosos/sociais adotados. Todas as sociedades possuem costumes, convenções, leis a serem seguidas, cultura própria, religião predominante e política. Até aí, tudo bem.
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As primeiras sociedades que se tem registro, surgiram no período Paleolítico, a 2,5 milhões de anos a.C. Funcionavam como pequenos agrupamentos de humanos que caçavam e colhiam o que fosse possível e levavam uma vida nômade. Já nessa época, havia regras simples como divisão entre caçadores, homens que caçavam animais, e coletores, mulheres e crianças que coletavam grãos, plantas, frutas e o que encontrassem. Eles precisavam sobreviver e, por isso, rateavam tudo que conseguiam e seguiam as regras.
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O tempo foi passando, o homem começou a construir novas ferramentas, descobriu agricultura, a pecuária e houve a necessidade de morada fixa. Ainda viviam em pequenos agrupamentos, seguiam novas regras, formavam aldeias e construíam cabanas para fixar residência, família e começavam a eleger líderes para organizá-los. Se apegaram a divindades para explicar morte e forças da natureza que não compreendiam e, finalmente, a chegada da escrita tornou-os uma sociedade civilizada. Hoje somos um povo civilizado, em sua maioria, e entendo que precisemos de ferramentas que nos mantenham como tais.
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Não questiono aqui a existência de paradigmas, mas o dilema começa quando essas convenções instituídas, dogmas arraigados, padrões estabelecidos por um pequeno quórum e senso comum precisem se seguidos por todos piamente, sem questionar, sem interferir, sem entender. Padrões preconceituosos, retrógrados, conservadores, geralmente pautados por quem domina ou pela religião vigente. Crenças passadas através de gerações, práticas pré-concebidas e muitas vezes seguidas por pura obrigação moral, social ou imposta pela própria família. Algumas totalmente violentas e abusivas, porém, tidas como sagradas pela cultura que as abraça. 127e5aa576e529b1f59e979d0b67646f.jpg A mutilação de genitália praticada em alguns lugares da África, por exemplo, não é apenas dolorida para quem a sofre, como também deixa sequelas para o resto da vida. São cortados os pequenos e grandes lábios e o clitóris com facas, muitas vezes, enferrujadas e sem esterilização e essas meninas nem sempre têm escolha. Algumas nunca mais sentirão prazer sexual ou terão filhos. É somente um exemplo que, para mim, brasileira, parece uma prática absurda, no entanto seus praticantes a consideram normal.
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A psicologia fala sobre normose, que seria uma doença de ser normal. Significaria seguir regras, normas ou convenções instituídas por uma sociedade mesmo que se sinta mal, podendo ocasionar consequências nocivas, outras doenças ou até a morte. Quantas situações poderíamos classificar como normóticas hoje em dia? O que acontece na nossa sociedade atual que julgamos normal, entretanto pode ser nocivo? O que é normal? Tudo que entendemos como certo e que vemos todos repetirem? Tudo que vemos na TV? O que aprendemos na escola? O que não é normal?
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Guerras travadas por diferenças ideológicas/religiosas, homossexuais espancados à luz do dia, negros e índios perseguidos e discriminados, estupros, terrorismo, extremismo religioso, raças inteiras de animais extintos pela caça esportiva, violência doméstica, tudo isso é normal? Em algum momento da história, algumas dessas práticas já foram.
Suicídio de pessoas que não conseguiram se encaixar na sociedade em que vivem, que foram tão brutal e silenciosamente enxovalhadas pela família normal, os amigos normais, a sociedade normal, que não resistiram. Homens e mulheres que enlouqueceram pelo mesmo motivo, outros que se adaptaram à força e tiveram uma vida inteira infeliz. Vivemos em um mundo onde todos querem ser iguais a algum modelo, pois se não o forem, serão julgados.
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É normal? Quantas convenções você já seguiu por ser convenção? O que você já se sentiu obrigado a ser por conta de uma norma social? Quantos amigos infelizes você tem sem nenhum motivo aparente? Você já foi questionado por ser ou estar diferente dos demais em algum aspecto, por mais ínfimo que lhe pareça? Quem você já teve que se tornar para não se sentir excluído? O que é ser normal? Você é normal?

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Saúde mental: desinstitucionalização de pacientes psiquiátricos é tema de documentário

Iniciativa retrata a experiência da desinstitucionalização na região de Sorocaba (SP), maior polo manicomial do País. Em 2012, o MPF firmou TAC para solucionar o problema
Saúde mental: desinstitucionalização de pacientes psiquiátricos é tema de documentário
Está disponível no site da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) a íntegra do documentário “A Chave da Nossa Casa”, produzido pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, no âmbito do Censo Psicossocial 2014.
 O material aborda a política pública de desinstitucionalização dos pacientes psiquiátricos, por meio da substituição da internação em hospitais por iniciativas de reinclusão e reintegração social.
 A iniciativa retrata a experiência da desinstitucionalização de hospitais psiquiátricos na região de Sorocaba (SP), considerada o maior polo manicomial do País. Em 2012, o Ministério Público Federal firmou Termo de Ajustamento de Conduta com a União, estado de São Paulo e municípios de Sorocaba, Piedade e Salto de Pirapora com vistas a solucionar as graves violações de direitos que ocorriam em unidades da região, incluindo maus-tratos e tortura a pacientes. Realizado em conjunto com o Ministério Público estadual, o TAC cria condições para a desinstitucionalização dos internos, incluindo a criação de residências terapêuticas e a concessão de benefício assistencial pelo INSS e pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Acesse aqui a íntegra do vídeo.
Saiba mais – A desinstitucionalização está nas diretrizes traçadas pela Lei Nº 10.216/01, que institui a Reforma Psiquiátrica. A proposta é atuar fomentando a rede de atenção em saúde mental a partir de políticas públicas para garantir a essas pessoas a reintegração pela inserção na família, no trabalho e na sociedade, conforme determina a legislação.
Fonte: PFDC

Debatedores divergem se audiência de custódia pode antecipar mérito

Quando participa de audiências de custódia representando presos em flagrante na Justiça Federal em Guarulhos (SP), o defensor público da UniãoCaio Paiva geralmente é interrompido ao comentar, por exemplo, que determinada pessoa deve ficar solta porque portava drogas para consumo próprio. Os juízes afirmam que essa questão só pode ser levantada no exame do mérito.
Isso acontece porque, ao definir que presos em flagrante têm o direito de ser ouvidos por um juiz em 24 horas, o Conselho Nacional de Justiça determinou que seja analisado apenas se os suspeitos precisam mesmo ficar atrás das grades ou se podem responder em liberdade.
Paiva avalia que não faz sentido impedir sempre outros tipos de perguntas. “A proibição da atividade probatória tem sido apresentada como benefício à pessoa presa, no sentido de poupá-la de um interrogatório antecipado. É uma espécie de paternalismo processual, uma tentativa de proteger pessoa presa dela mesma, como se sempre fosse confessar”, afirma o defensor e colunista da revista Consultor Jurídico. “No processo penal, é difícil separar mérito de cautelar.”
Meta das audiências é permitir contato entre preso e juiz, e não soltar mais suspeitos, afirma juiz Luís Lanfredi.
Já o juiz Luís Geraldo Lanfredi, que coordena o departamento do CNJ responsável por fiscalizar o sistema carcerário, entende que a análise probatória deve ficar para outro momento.
Segundo ele, o preso em flagrante geralmente está mais exposto a pressões e precisa de tempo para formalizar a defesa. Nas audiências, portanto, o mérito deve aparecer apenas de forma superficial, de acordo com Lanfredi.
Ambos debateram o tema, nesta terça-feira (23/8), no primeiro dia do 22º Seminário Internacional de Ciências Criminais, em São Paulo, promovido pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim).
Para defensor Caio Paiva, proibir questões de mérito é “paternalismo processual”.
Reprodução
Eles concordaram que a audiência de custódia humanizou o Judiciário, pois até a implantação da iniciativa prisões em flagrante eram convertidas em preventivas sem que o juiz olhasse para o suspeito. Por isso, entendem que o principal objetivo da medida não é soltar mais, e sim permitir esse contato direto.
O modelo já existe nas capitais de todo o país, começou a expandir pelo interior e chegou recentemente à Justiça Federal. Lanfredi apontou que foram registradas 124,2 mil audiências até o dia 15 de agosto deste ano — 66 mil pessoas (53%) continuaram presas e 58,2 mil (47%) foram liberadas.
É obrigatória a presença de um promotor de Justiça e de um advogado ou defensor público. Para o juiz, o Ministério Público e a Defensoria podem atender toda a demanda nacional se conseguirem se organizar. Ele entende que é possível até a participação por videoconferência, embora seja vetado o mesmo mecanismo para o próprio preso.
Raízes
Lanfredi, auxiliar no CNJ desde quando as audiências eram só um projeto, disse que a ideia surgiu a partir dos mutirões carcerários promovidos pelo conselho. O órgão avaliou que não era preciso mudança legislativa, pois o Brasil já havia assumido em 1992 o compromisso de ouvir presos sem demora, com o Pacto de San José da Costa Rica.

A capital paulista foi a primeira cidade a passar pela experiência, em fevereiro de 2015. “Entendemos que, se desse certo em São Paulo, nenhum outro município ou estado poderia dizer que a iniciativa daria errado.” Antes do lançamento oficial, foram cinco meses de negociação entre o conselho e o Tribunal de Justiça de São Paulo. “A ideia em si não é nova, mas a maneira de implementar as audiências, sim”, declarou Lanfredi.
Ele disse ainda que a iniciativa venceu resistência de membros do Ministério Público, da polícia e até do próprio Judiciário. Segundo o juiz auxiliar do CNJ, juízes que atuam nas audiências já se “converteram”.
Paiva apontou ainda que autoridades com foro por prerrogativa de função também têm direito de ser ouvidos em 24 horas. Nesse caso, o tribunal competente poderia até delegar a audiência a um juiz de primeiro grau, mas ficaria responsável por proferir a decisão pela soltura ou pela prisão preventiva.
Em julho, o Senado aprovou proposta que regulamenta as audiências de custódia. Como houve mudanças no texto original, o PLS 554/2011 ainda precisará ser apreciado em turno suplementar.
 é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 24 de agosto de 2016.

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