sábado, 31 de outubro de 2015

Primeira Audiência de Custódia da Justiça Federal será em Foz do Iguaçu

A apresentação de toda pessoa presa em flagrante a um juiz, em até 24 horas após a detenção, passará a ser rotina na Justiça Federal em Foz Iguaçu/PR, a partir desta sexta-feira (30/10). A Subseção Judiciária do município da Tríplice Fronteira será a primeira da Justiça Federal a adotar o Projeto do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Audiência de Custódia, que prevê novos procedimentos para o tratamento de pessoas presas no Brasil. O presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, ministro Ricardo Lewandowski, participará da instalação do projeto do CNJ no Fórum Criminal de Foz de Iguaçu e acompanhará a primeira audiência de custódia realizada pela Justiça Federal, na tarde de sexta.
Todo preso em flagrante por crimes federais no município de Foz do Iguaçu será apresentado em até 24 horas da sua prisão a um magistrado, que será responsável por avaliar a necessidade e a legalidade de manter a pessoa em uma unidade prisional. De acordo com as circunstâncias da prisão, as pessoas poderão ser mantidas presas ou receber o direito de aguardar o julgamento em liberdade. Os magistrados podem determinar se os presos deverão cumprir ou não alguma medida cautelar, como usar tornozeleira eletrônica até a data do julgamento.

O projeto já funciona nos 27 tribunais estaduais de Justiça. A Justiça Federal aderiu à iniciativa em 23 de setembro. Foz do Iguaçu será a primeira experiência de julgar prisões de pessoas que cometeram crimes federais,  contra bens, serviços e interesses da União. É processado por juízes federais quem cometeu algum crime que envolva violação grave dos direitos humanos ou aquele cometido contra a organização do trabalho ou contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira. Em Foz do Iguaçu, os crimes cometidos mais frequentemente são aqueles relacionados a moeda falsa (circulação, fabricação, emissão, entre outros), além do contrabando, tráfico internacional de armas e drogas.
Serviço:
Lançamento do Projeto Audiência de Custódia na Justiça Federal de Foz do Iguaçu 
Data: sexta-feira (30/10/2015)
Local: Rua Edmundo de Barros, 1989, Jardim Naipi. Foz do Iguaçu/PR.
Agência CNJ de Notícias
Manuel Carlos Montenegro
(61) 9151-0741

Os 10 Habeas Corpus mais inusitados do Brasil

ma das curiosidades mais interessantes do mundo jurídico é o uso de habeas corpus no mínimo inusitados.
Confira agora com o JurisOffice os 10 habeas corpus mais inusitados do Brasil:

1. Habeas corpus do “arranhão ilícito”

(TJ/RS, 4ª Câmara Criminal, HC 0149754-26.2011.8.21.7000, rel. Des. Marcelo Bandeira Pereira, j. Em 05/05/2011)
Uma advogada do Rio Grande do Sul achou que seria uma ótima ideia arranhar o rosto de seu cliente (foragido do sistema prisional gaúcho) nas dependências da Polícia para atribuir a agressão aos policiais. No habeas corpus, a defensora alegou que não deveria responder por calúnia em virtude da imunidade penal do advogado.

2. Habeas corpus dos loucos

(STJ, 1ª Turma, HC 170366/PE, rel. Teori Albino Zavascki, decisão monocrática, d. 08/08/2011)
Dizem que tem louco para tudo nesse mundo e tem habeas corpus para loucos também. Um servidor público de Pernambuco se recusou a realizar o exame psiquiátrico em procedimento administrativo disciplinar e entrou com um habeas corpus para impedir o exame de sanidade mental. O pedido foi negado pelo relator.

3. Habeas corpus analógico

(STJ, 5ª Turma, AgRg no HC 215.050/AC, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 6/9/2011)
Este é o habeas corpus daqueles que costumam dizer ʺno meu tempo não havia internetʺ. Quando o Tribunal de Justiça do Acre substituiu o peticionamento tradicional, em papel, pelo peticionamento eletrônico teve gente que não ficou nada satisfeita e por isso entrou com um habeas corpus para se impetrar contra o processo digital. O pedido foi negado e a internet já está tomando conta das insituições jurídicas.

4. Habeas corpus do raio-X

(STJ, HC 149.146/SP, rel. Og Fernandes, j. Em 5/04/2011)
ʺEngoli cápsulas de cocaína e fui preso, o que fazer?ʺ Fácil, entrar com um habeas corpus para impedir o exame de raio-X que logicamente iria comprovar a materialidade do delito!
Foi o que aconteceu quando quatro angolanos foram presos por narcotráfico internacional em São Paulo. O habeas corpus alegava que poderia impedir o exame de raio-x pois ninguém pode ser compelido a produzir prova contra si (nemo tenetur se detegere).
A Turma denegou o pedido e os quatro angolanos foram presos.

5. Habeas corpus prolixo

(STJ, 6ª Turma, HC 224.685/RS, Rel. Maria Thereza de Assis Moura, j. Em 20/03/2012)
Muita gente reclama que o Facebook está ficando chato devido aos textos enormes que alguns usuários escrevem e parece que tem mais gente contra o excesso de linguagem.
Segundo a relatora do habeas corpus no STJ/RS: Ao que me é dado perceber, o aresto guerreado transcreve extenso trecho das razões recursais do Ministério Público. Tendo em vista toda averveprópria de uma petição elaborada pelo autor da ação penal, é evidente a presença de eflúvios acusatórios que, creio, deveriam ter sido filtrados pela Corte localuma vez reconhecida a incompatibilidade da sentença com a prova carreada aos autos”.
O paciente queria a nulidade do acórdão e sua “refeitura mediante aplicação de linguagem comedida, sóbria”.
O STJ mandou excluir a decisão do TJ/RS dos autos e colocá-la em envelope lacrado. A decisão ainda foi proibida de ser utilizada no julgamento.

6. Habeas corpus do happy hour

(STJ, 5ª Turma, HC 140.861/SP, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. Em 13/04/2010)
Todo mundo sabe que não se deve dirigir após a ingestão de bebidas alcoólicas. Mas se um dia eu for pego conduzindo meu veículo sob efeito de álcool, não gostaria de passar pelo etilômetro. Foi o que pensou o elaborador de um habeas corpuspreventivo para impedir a submissão do motorista à realização de bafômetro. Quase uma licença para dirigir embriagado!
O pedido foi obviamente rejeitado.

7. Habeas corpus: decoração interior

(TJ/MA, 2ª Câmara Criminal, HC 0018232-61.2010.8.10.0000, rel. Des. Maria dos Remédios Buna Costa Magalhães, j. Em 27/01/2011)
O habeas corpus: decoração interior discute a organização do lugar onde o promotor e os advogados devem sentar-se no salão do júri, pois segundo a relatora seus clientes teriam sofrido coação ilegal em virtude do arranjo do ambiente judiciário.
O habeas corpus não foi conhecido pelo TJ –MA.

8. Habeas corpus futebolístico

(TST, HC 3981-95.2012.5.00.0000, rel. Caputo Bastos, d. Em 26/04/2012)
O ministro Caputo Bastos concedeu liminar em habeas corpus impetrado em favor do jogador de futebol Oscar contra decisão da 16ª Turma do TRT da 2ª Região, com sede em São Paulo.
Oscar queria deixar o São Paulo para defender o Internacional de Porto Alegre e para driblar a CLT e obter a rescisão indireta do contrato de trabalho entrou com umhabeas corpus por “trabalho escravo”. Parece que o time do São Paulo não estava numa boa fase!
Depois que concedeu a liminar o ministro voltou atrás e extinguiu o habeas corpusquando as partes fizeram a rescisão consensual.

9. Habeas corpus animal (literalmente)

(TJ/RJ, 2ª Câmara Criminal, HC 2637-70.2010.8.19.0000, rel. José Muiños Piñeiro Filho, j. Em 05/11/2010)
“Jimmy” um chimpanzé enjaulado no zoológico de Niterói não aguentava mais viver em cativeiro, mas seu pedido de habeas corpus não foi reconhecido, apesar disso ohabeas corpus animal suscita importantes reflexões no campo do Direito Animal.

10. Habeas corpus para os que não gostam de estudar

(STF, 2ª Turma, HC 109.327/RJ, rel. Celso de Mello, d. Em 04/08/2011)
O Exame da OAB é motivo de desespero para muitos estudantes de Direito. Então por que não um habeas corpus para obter sua carteira da OAB sem fazer o Exame de Ordem? O min. Celso de Mello, pediu para o rapaz estudar mais.
Criatividade é o que não falta nos brasileiros!

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Newsletter IDDD | Audiências de Custódia são debatidas na Comissão Interamericana de Direitos Humanos


IDDD
out
29
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INTERNACIONAL 
Audiências de Custódia são debatidas na Comissão Interamericana de Direitos Humanos
IDDD e outras organizações da sociedade civil participaram de audiência temática realizada em Washington DC, EUA, na sede da OEA, para discutir a implementação do projeto no Brasil
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LIVRO 
Lançamento "A Efetividade do Direito de Defesa na América Latina"

Livro sobre a efetividade da defesa criminal em seis países da América Latina foi lançado no último dia 20, em Washington DC, EUA. Coautores do livro, o IDDD e a Conectas Direitos Humanos investigaram a situação do direito de defesa no Brasil
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INSTITUCIONAL 
9º Jantar Anual de Confraternização do IDDD acontece dia 8/12. Participe!

Evento realizado no Lions Nightclub será marcado pela comemoração dos 15 anos do Instituto e contará com leilão silencioso de joias e obras de arte. No jantar, o IDDD ainda buscará um patrono para o projeto “Educação para Cidadania no Cárcere”
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Senado aprova tipificação do crime de terrorismo com pena de até 30 anos

O Plenário aprovou, nesta quarta-feira (28), com 38 votos favoráveis e 18 contrários, substitutivo do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) ao Projeto de Lei da Câmara (PLC)101/2015, que tipifica o crime de terrorismo. A proposta prevê pena de reclusão de 16 a 24 anos em regime fechado para quem praticar o ato. Mas se o crime resultar em morte, a reclusão será de 24 a 30 anos. O texto voltará a ser analisada pelos deputados por ter sido alterada no Senado.
O substitutivo aprovado tipifica o crime de terrorismo como aquele que atenta contra pessoa, “mediante violência ou grave ameaça, motivado por extremismo político, intolerância religiosa ou preconceito racial, étnico, de gênero ou xenófobo, com objetivo de provocar pânico generalizado”. De acordo com o texto, é considerado terrorismo político o ato que atentar gravemente contra a estabilidade do Estado democrático, com o fim de subverter o funcionamento das instituições.
A alteração defendida por Aloysio Nunes especificava o terrorismo político o ato que atentar gravemente contra as instituições democráticas. O senador Valadares explicou que a mudança define melhor esse tipo de crime, sem abrir brechas para outras interpretações.
O substitutivo equipara a ato terrorista causar explosão, incêndio, inundação, desabamento, ou usar gás tóxico, veneno, agente químico, biológico, radiológico ou nuclear em prédio ou local de aglomeração ou circulação de pessoas.
Também cometem ato terrorista aqueles que destruírem ou apoderarem-se de aeronave, embarcação ou trem de transporte de passageiros ou de carga, instalação de sistema de telecomunicações, de geração ou de distribuição de energia elétrica, porto, aeroporto, ferrovia, rodovia, estação ferroviária, metroviária ou rodoviária, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações militares ou edifício público ou privado.
O projeto ainda classifica como terrorismo o ato de interromper ou embaraçar o funcionamento de serviço telegráfico, telefônico, informático, telemático ou de informação de utilidade pública.
Aloysio Nunes  ressaltou a importância do PLC 101/2015. Ele afirmou que, no Brasil, houve uma abundante produção legislativa sobre terrorismo, mas nunca uma preocupação de definir o que seja terrorismo.
Para ele, o crime peca contra a humanidade, mais do que contra os indivíduos que possam vir a ser vítimas de atos terroristas, “porque o ato terrorista é uma negação da individualidade, é uma negação do ser humano, naquilo que ele tem de único, em nome de uma causa geral”.

Aumento de penas

Se o agente praticar o crime com auxílio, de qualquer espécie, de governo estrangeiro ou organização criminosa internacional a pena aumenta um terço. Se o crime for praticado contra presidente da República, vice-presidente da República, presidente da Câmara dos Deputados, presidente do Senado Federal, presidente do Supremo Tribunal Federal, chefe de Estado ou de governo estrangeiro, chefe de missão diplomática ou consular ou de organização intergovernamental, a pena aumenta de um terço à metade.
Cumprimento da pena
O condenado pelo crime de terrorismo iniciará o cumprimento da pena em regime fechado, em estabelecimento penal de segurança máxima. O crime será inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.
O texto do substitutivo ressalta que todos os crimes previstos no projeto são praticados contra o interesse da União, cabendo à Justiça Federal o seu processamento e julgamento.

Financiamento, apologia e recrutamento

Em relação ao crime de financiamento do terrorismo, a pena de reclusão proposta é de 12 a 20 anos e multa. Quem fizer, publicamente, apologia de ato de terrorismo ou de autor de ato terrorista cumprirá pena de reclusão de 3 a 8 anos. Já a pena de reclusão para aqueles que recrutarem indivíduos para praticar o ato será de dez a 16 anos.

Manifestações sociais

A maior polêmica sobre a proposta foi em relação ao parágrafo que exclui da aplicação da lei manifestações políticas e movimentos sociais ou reivindicatórios. Nos termos do proposto inicialmente no PLC 101/2015, estariam excluídas do tipo penal do terrorismo as “pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais”.
Aloysio Nunes Ferreira retirou esse parágrafo e destacou que, “em um Estado democrático de direito, as manifestações e reivindicações sociais, sejam elas coletivas ou individuais, não têm outra forma de serem realizadas senão de maneira pacífica e civilizada”.
Para diversos senadores, a retirada do parágrafo poderia atacar os movimentos sociais e a liberdade de expressão. O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) chegou a afirmar que a proposta aprovada é muito ampla e ambígua e poderá ser usada, “para criminalizar movimentos sociais e vozes dissidentes”.
Os senadores Antonio Carlos Valadares (PSB-PE), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Lídice da Mata (PSB-BA), Humberto Costa (PT-PE) e Telmário Mota (PDT-RR) foram à tribuna para defender a volta do parágrafo como forma de proteção dos movimentos sociais.
- Por estar convencida que o projeto pode trazer mais problemas do que soluções é que acho que deveríamos maturar o debate – disse Grazziotin.
A polêmica sobre o tema foi tanta que os petistas votaram contra a orientação do líder do governo, Delcídio do Amaral (PT-MS).

Equilíbrio

Aloysio Nunes ressaltou que buscou compatibilizar a necessidade de reprimir o crime de terrorismo e a necessidade de preservação dos espaços de atuação democrática dos cidadãos, de manifestações pacíficas “ou mesmo de manifestações que venham a descambar para a violência, mas que não são promovidas com o objetivo de destruir o Estado de direito”.
- A minha preocupação foi exatamente não abrir brecha para que direitos e garantias que são assegurados pela Constituição fossem vulnerados por uma lei ordinária – disse.
O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) ressaltou que o projeto de Aloysio Nunes soube muito bem dividir o que é uma manifestação pública ordeira e do Estado democrático de direito e o que é uma manifestação da baderna, do movimento de destruir imóveis públicos e do poder praticar um “terrorismo bolivariano no país”.
- Com esse equilíbrio, ele redigiu um texto que é exatamente aquilo que a sociedade brasileira espera do Senado Federal – disse.
O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) explicou que votar a favor da proposta não significa ser contra os movimentos sociais. O senador disse que os movimentos sociais já estão protegidos pela Constituição, que garante a livre manifestação desses grupos, e ressaltou que o texto aprovado não é de Aloysio, mas sim um trabalho coletivo.

Gafi

O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) destacou que o argumento utilizado de que o projeto foi elaborado por exigência do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi) é falso. Segundo ele, o que o Gafi pediu foi uma legislação sobre o financiamento do terrorismo e o Brasil já tem três leis que tratam do tema.  O senador lembrou ainda que somente cinco países que fazem parte do organismo internacional tipificaram o terrorismo.
Lindbergh ressaltou que nem mesmo a ONU conseguiu tipificar o terrorismo, tamanha a complexidade do tema, e defendeu a rejeição da proposta para que o assunto possa ser discutido com mais calma.
A senadora Fátima Bezerra (PT-RN) associou-se a Lindbergh e posicionou-se favorável a um debate mais aprofundado do projeto.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado). Soraya Mendanha | 28/10/2015.

Inamovibilidade é prerrogativa do delegado e garantia do cidadão

A motivação, que não se confunde com o motivo, é a explanação deste. Todo ato administrativo deve ter seus motivos devidamente tornados públicos, com a indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, de forma explícita, clara e congruente. Não apenas por decorrência dos postulados da cidadania e do acesso à Justiça (artigo 1º, II e artigo 5º, XXXV da Lei Fundamental)[1], mas como exigência do artigo 50 da Lei 9.784/99.
Esse princípio exige do administrador os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, seja o ato administrativo vinculado ou discricionário, sendo aplicado como regra, salvo quando dispensado pela lei ou incompatível com a natureza do ato[2]. A formalidade, ao permitir o controle de legalidade da deliberação, representa uma gigantesca garantia para a fiscalização da escolha da administração pública[3]. Senão vejamos:
“A motivação tem o papel de demonstrar que a interpretação se deu segundo a lógica do razoável, que os fatos pressupostos do ato existem e são aptos a deflagrar determinados efeitos determinados, que o agente tinha competência para atuar e que há coerência entre o motivo e o conteúdo, em vista da finalidade legal (...) Com ela, e demais subsídios, o controlador do ato terá meios para verificar a sua razoabilidade, ou seja, sua validade perante a ordem jurídica[4]”.
Cumpre sublinhar que, assim como nas fundamentações judiciais, não há mais lugar para motivações administrativas que se limitem à mera cópia de dispositivos legais ou utilização de termos genéricos que sirvam a qualquer hipótese. Exige-se que a deliberação esteja lastreada em elementos concretos. Meras ilações ou conjecturas desprovidas de base empírica não autorizam que a administração pública afete a esfera de direitos do servidor público.
Mencione-se também que não se admite o indevido reforço de fundamentação. É dizer inviável que o administrador tente posteriormente suprir a ausência ou deficiência da motivação. O ato administrativo é nuloab initio, e nenhuma manobra ulterior da administração pública poderá mudar esse fato.
Grife-se ainda que, se os motivos invocados como fundamento forem inexistentes ou falsos, impõe-se a nulidade do ato, que resta invalidado em razão da teoria dos motivos determinantes[5].
Pois bem. Dentre os diversos atos administrativos, destaca-se a remoção, que traduz o deslocamento do servidor para outra lotação, a pedido ou de ofício pela administração pública[6]. A decisão do administrador em remover algum servidor público deve ser tomada cum grano salis, por afetar não só a vida profissional do agente, mas principalmente sua esfera particular, não se olvidando que a família, base da sociedade, deve contar com especial proteção do Estado (artigo 226 da Constituição Federal).
Por isso mesmo o ordenamento jurídico tratou de conferir a alguns agentes públicos uma proteção adicional contra remoções arbitrárias. Cuida-se da inamovibilidade, que pode se encontrar na Lei Fundamental, como ocorre com a magistratura, ou na legislação ordinária, como é o caso daquela que ampara o delegado de polícia.
Além do mais, a investigação criminal consubstancia-se em atividade essencial de Estado, que deve ser levada a efeito sem discriminações benéficas ou detrimentosas. Favoritismos ou perseguições são intoleráveis no âmbito da atividade de persecução penal, que deve se lastrear apenas no ordenamento jurídico, sem qualquer motivação pessoal.
Para que o Estado-investigação promova apurações isentas e imparciais, é preciso que a autoridade de polícia judiciária não decida sob o temor de injustas represálias, não devendo se sujeitar a vicissitudes sociais, econômicas e políticas. E uma das formas mais comuns de retaliação é justamente por meio da remoção.
Nesse panorama, surgiu a Lei 12.830/13. Dispõe a Lei de Investigação Criminal:
“Artigo 2º (...) Parágrafo 5º. A remoção do delegado de polícia dar-se-á somente por ato fundamentado”.
Como se vê, só há que se falar em remoção do delegado de polícia de uma delegacia a outra se restar inequivocamente demonstrado, mediante detalhada fundamentação, o interesse público da medida. Não se trata de favor pessoal, senão de instrumento de preservação da liberdade e independência da autoridade policial no exercício da função, que gera reflexos em um dos bens jurídicos mais caros ao cidadão, qual seja, a liberdade.
A doutrina explica:
“O ato de remoção a ser fundamentado estará adstrito aos balizamentos legais, impedindo seu uso como forma de perseguição política ou na satisfação de interesses escusos[7].
Importante alteração trazida pela Lei 12.830/13 diz respeito à impossibilidade de remoção arbitrária do delegado de polícia, o que confere maior transparência e segurança à atividade de investigação. Assim, somente por ato fundamentado e por necessidade de serviço, observadas as regras da impessoalidade, é que se poderá alterar o exercício das funções do delegado de polícia. De igual modo, exigir-se-á também fundamentação específica para a avocação de investigação pelos órgãos superiores da instituição, tudo conforme o disposto no artigo 2º, parágrafo 4, Lei 12.830/13[8]”.
Essa inamovibilidade não significa a absoluta impossibilidade de movimentação da autoridade de polícia judiciária, mas a colocação de rígidos limites à sua remoção, sendo a baliza fundada no interesse público. Aliás, não há inamovibilidade absoluta nem mesmo para o magistrado ou membro do Ministério Público. O fato é que a remoção não pode se dar com fundamentos fraudados ou genéricos.
Não se nega, quando o assunto é remoção, que a lei confere um espaço de discricionariedade ao administrador, ao empregar conceitos de valor como o de interesse público. No entanto, é bom grifar o alerta feito pela doutrina:
“A discricionariedade pode existir, embora não signifique liberdade total, isenta de qualquer limite. (...) A remoção ex officiodo funcionário só pode dar-se para atender à conveniência do serviço, de modo que, se for feita para punir, será ilegal[9]”.
Como mencionado, é indispensável que o administrador aponte, de maneira efetiva, as circunstâncias fáticas que justifiquem a medida, sob pena de manifesta ilegalidade. Não satisfazem parâmetros unicamente subjetivos. Há que se perquirir a presença de indicadores palpáveis da exigibilidade da medida restritiva, a não ser que se queira substituir a discricionariedade pela arbitrariedade. Ensina o Tribunal da Cidadania que:
“O interesse do serviço que autoriza a excepcional remoção ex officio é o interesse concreto, demonstrado, comprovado, fundado em motivos reais e palpáveis. Admitir que as remoções possam ser operadas com base em justificações abstratas de interesse público — que já constitui em si um conceito jurídico indeterminado por excelência — equivaleria a admitir a prática de ato administrativo à total revelia de justificação legítima, o que conduziria à impossibilidade de sindicar a sua juridicidade[10]”.
De mais a mais, remover arbitrariamente um delegado de polícia ofende não apenas a prerrogativa de inamovibilidade, mas atinge por via reflexa outras garantias. Se uma autoridade de polícia judiciária é retirada de sua delegacia, está sendo destituída da presidência de suas investigações, o que fere de morte o princípio do delegado natural. Confira-se a lição do Judiciário:
“Para fins, pois, de garantia do interesse público nas investigações criminais, subtraindo os delegados das pressões internas e externas, é possível dizer que hoje já exista o princípio do delegado natural. Isso lhes assegura uma independência tal, que poderão investigar, com tranquilidade, não apenas aquela parcela majoritária da população que é desprovida de recursos materiais e poder político, mas todo e qualquer cidadão que infrinja a lei penal, a casta intocável dos poderosos. Não poderão ser destacados do inquérito policial a que presidem, nem ser desrespeitosamente designados para outra delegacia de polícia, quando atuam nos lindes do interesse público (...) Passa a constituir direito fundamental da sociedade e das pessoas investigadas não só o acesso ao princípio do juiz natural e do promotor natural, mas também do delegado natural, com a correlata e importante garantia da inamovibilidade. A investigação criminal, etapa fundamental da persecução penal, cerca os agentes políticos por ela responsáveis das garantias de independência necessárias ao fomento da cidadania e dos princípios republicanos[11]”.
O legislador comunga dessa posição, o que se pode extrair da Justificativa ao Projeto de Lei 132/12 (que após aprovação foi convertido na Lei 12.830/13) e das próprias discussões para aprovação do referido projeto Legislativo:
“Para que a condução dos trabalhos de investigação possa ser realizada com a eficiência que a sociedade clama, faz-se necessária a garantia de autonomia na investigação criminal (...) Com tais medidas, a investigação ganhará em agilidade, qualidade e imparcialidade, pois o delegado de polícia não sofrerá interferências escusas na condução do inquérito policial ou do termo circunstanciado (...) Impede o afastamento do delegado de uma investigação em particular, sem motivo justo ou legal, o que é uma prática nefasta, (...) prejudicando sobremaneira a eficiência da persecução criminal[12]”.
Ademais, é dever da administração pública, mesmo nos atos discricionários, pautar suas condutas com vistas a garantir respeito ao contemporâneo direito fundamental à boa administração pública, o qual se manifesta não apenas em relação aos administrados, mas também aos seus próprios agentes. Assim ensina a doutrina:
“É que o estado da discricionariedade legítima, na perspectiva adotada, consagra e concretiza o direito fundamental à boa administração pública, que pode ser assim compreendido: trata-se do direito fundamental à administração pública eficiente e eficaz, proporcional cumpridora de seus deveres, com transparência, motivação, imparcialidade e respeito à moralidade, à participação social e à plena responsabilidade por suas condutas omissivas e comissivas; a tal direito corresponde o dever de a administração pública observar, nas relações administrativas, a cogência da totalidade dos princípios constitucionais que a regem[13]”.
O desrespeito a essa prerrogativa, estampado em ato administrativo ilícito de remoção arbitrária, possibilita a correção pelo Poder Judiciário, conforme ensinamento doutrinário:
“Não se confundem discricionariedade e arbitrariedade. Ao agir arbitrariamente o agente estará agredindo a ordem jurídica, pois terá se comportado fora do que lhe permite a lei. Seu ato, em consequência, é ilícito e por isso mesmo corrigível judicialmente[14]”.
“A rigor, pode-se dizer que, com relação ao ato discricionário, o Judiciário pode apreciar os aspectos da legalidade e verificar se a Administração não ultrapassou os limites da discricionariedade; neste caso, pode o Judiciário invalidar o ato, porque a autoridade ultrapassou o espaço livre deixado pela lei e invadiu o campo da legalidade[15]”.
Levando em conta todas essas considerações, torna-se fácil entender o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“A fundamentação apresentada nas informações evidencia desvio de finalidade pela incongruência entre o motivo e o objetivo do ato de remoção, cuja justificativa está marcada por generalismos e subjetivismos que identificam a presença de interesse público a partir de ilações sobre prejuízos que futuramente poderiam advir do serviço policial (...) Não havendo demonstração concreta sobre a forma como os desentendimentos entre o impetrante e seu coordenador afetam o serviço, e inexistindo instauração de processo disciplinar, a remoção se mostra ilegal[16]”.
Na linha do que sustentamos anteriormente, a garantia de ser investigado apenas pelo delegado natural revela-se verdadeiro direito fundamental, razão pela qual a inamovibilidade do delegado de polícia, mais do que uma prerrogativa do cargo, traduz uma garantia do cidadão.

[1] MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 112/113.
[2] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1999, p.143
[3] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2014, p. 82-83.
[4] ARAÚJO, Florivaldo Dutra de. Motivação e Controle do Ato Administrativo. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 136.
[5] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2014, p. 220.
[6] MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 605.
[7] WERNER, Guilherme Cunha. In: DEZAN, Sandro Lucio; PEREIRA, Eliomar da Silva (org.). Investigação Criminal. Curitiba: Juruá, 2013, p. 186.
[8] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. São Paulo: Atlas, 2015, p. 57.
[9] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2014, p. 224-225.
[10] STJ, RMS 37.327, Rel. Min. Herman Benjamin, DJ 20/08/2013.
[11] Processo 001985-98.2014.8.26.0297, Comarca de Jales/SP, Juiz de Direito Fernando Antônio de Lima, DJ 02/10/2014.
[12] Justificativa ao Projeto de Lei 132/12, Dep. Arnaldo Faria de Sá, DP 21/12/2012.
[13] FREITAS, Juarez. Discricionariedade Administrativa e o Direito Fundamental à Boa Administração Pública. São Paulo. Malheiros: 2007. p. 20.
[14] MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 426.
[15] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2014, p. 229.
[16] STJ, RMS 37.327, Rel. Min. Herman Benjamin, DJ 20/08/2013. Em igual sentido: STJ, RMS 29206, Rel. Min. Campos Marques, DJe 05/06/2013.

 é delegado de Polícia Civil do Paraná, especialista em Direito Penal e Processual Penal pela UGF e em Segurança Pública pela Uniesp. Também é professor convidado da Escola Nacional de Polícia Judiciária, da Escola Superior de Polícia Civil do Paraná, da Escola da Magistratura do Paraná e da Escola do Ministério Público do Paraná, e professor-coordenador do Curso CEI e da pós-graduação em Ciências Criminais da Facnopar.
Revista Consultor Jurídico, 27 de outubro de 2015.

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