A apresentação de denúncias e a instauração de inquéritos são atos inerentes das funções institucionais do estado, não configurando, por si só, má-fé, dolo ou abuso de autoridade. Assim, só se poderia cogitar de reparação moral, caso se comprove a conduta ilícita do agente público na instauração ou condução destes procedimentos administrativos.
O entendimento é da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que manteve, na íntegra, sentença que negou reparação moral à presidente de uma ONG da cidade de Umuarama (PR). Ela foi denunciada ao Ministério Público Federal por suspeita de desvios de verbas da União, mas o caso não foi adiante por ‘‘atipicidade da conduta praticada’’.
Nos dois graus de jurisdição da Justiça Federal da 4ª Região, ficou entendido que a ação indenizatória não tinha cabimento, pois a denúncia não era infundada e a investigação foi feita por motivo justo: havia, de fato, irregularidades na prestação de contas da ONG. Em síntese, a autora, apesar do desgaste físico e emocional que a situação lhe causou, não provou que a acusação era infundada, nem que houve violação de direito por parte dos agentes federais e municipais.
O juiz Luiz Carlos Canalli, da 2ª Vara Federal de Umuarama, disse que, embora não ficasse comprovado o desvio de verbas, as irregularidades na prestação de contas foram constatadas pelo órgão responsável pelo repasse das verbas no Ministério da Saúde. ‘‘Tal fato contraria a tese defendida pela parte autora; vale dizer, de que a denúncia formulada ao Ministério Público Federal fora fruto de perseguição do Ente Municipal. Havia, sim, indícios de irregularidades nos gastos públicos, o que culminou com a abertura de investigações no âmbito do MPF e, finalmente, pela autoridade policial’’, escreveu na sentença.
Para Canalli, se cada inquérito policial arquivado redundasse no dever de pagar indenização ao denunciado, o sistema de investigação e a persecução penal restariam inviabilizados. ‘‘Por isso, somente quando haja atuação dolosa ou culposa de algum agente administrativo — eventualmente de um particular —, é que surgirá o direito do lesado em ver-se ressarcido da conduta ilícita’’, concluiu.
Ação indenizatória
Presidente da organização não-governamental que faz trabalhos sociais com portadores do vírus HIV, a autora foi à Justiça pleitear R$ 150 mil a título de ressarcimento de danos morais, pretensamente causados pela conduta dos representantes do município de Umuarama (PR) e do Ministério Público Federal do Paraná.
O imbróglio teve início quando a autora, na condição de membro do Conselho Municipal de Saúde, começou a questionar as contas do município. Em razão disso, o servidor responsável pela contabilidade passou a alegar existência de irregularidade na prestação de contas da ONG que presidia. O desvio de recursos público chegaria a R$ 40 mil.
Em face da constatação contábil, a Procuradoria do Município encaminhou ofício ao MPF, formalizando denúncia. Este, por sua vez, determinou a abertura de investigações, inclusive notificando a Polícia Federal. Cabe ao MPF fiscalizar as verbas repassadas pela União às ONGs, por meio dos municípios. O repasse serve para viabilizar as entidades que participam dos programas nacionais de combate às doenças sexualmente transmissíveis (DST-AIDS).
Embora tivesse suas contas aprovadas diante do Conselho Municipal de Saúde — onde justificou a origem dos gastos —, a autora se viu envolvida num clima de suspeitas depois que o MPF expediu recomendação pedindo a sustação de novos repasses. Apesar das suspeitas e da abertura de inquéritos, com os inevitáveis aborrecimentos, PF e MPF concluiriam pela inexistência de crime, dando o caso por encerrado.
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Revista Consultor Jurídico, 10 de maio de 2015.
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