A solução para a superlotação carcerária passa pela mobilização da sociedade, e é preciso criar oportunidades para evitar o envolvimento dos jovens com o crime. Caso contrário, continuará o combate aos efeitos sem o adequado foco na causa. A opinião é do desembargador José Renato Nalini, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. Segundo ele, “a sociedade produz delinquentes cada vez mais jovens, e defende pena de morte, redução da maioridade penal e mais prisões, como se isso resolvesse o problema”.
A crítica foi feita na cerimônia de instalação do mutirão carcerário promovido pelo Conselho Nacional de Justiça, com apoio do TJ-SP, no complexo penitenciário de Guarulhos. O mutirão deve analisar a situação de 7.783 presos, concedendo os benefícios necessários de acordo com a situação de cada um, e será comandado pelo juiz Jair Francisco dos Santos, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
Representante do CNJ durante a instalação do mutirão, o juiz-auxiliar da presidência Luiz Carlos Rezende e Santos citou o processo como uma espécie de amostragem da situação no estado. O objetivo, segundo ele, é analisar tanto as condições estruturais como o andamento dos processos, “para verificar e corrigir falhas”. Um dos benefícios do processo, continuou, é o incentivo aos juízes para que acelerem o julgamento de presos provisórios, reduzindo a quantidade de homens e mulheres que estão atrás das grades antes do julgamento. Sem se intrometer na prestação jurisdicional, o CNJ “pretende apenas discutir as questões com o Judiciário, incluindo por que não são adotadas as medidas alternativas”, concluiu Rezende e Santos.
Nalini classificou Guarulhos como “uma comarca diferenciada, uma das maiores do Brasil, com todos os problemas que podemos imaginar”, e, segundo ele, o CNJ receberá todo o auxílio do TJ-SP para dar continuidade a uma política pública iniciada durante a gestão do ministro Gilmar Mendes.
Questionado sobre o alto índice de presos provisórios no Brasil e em São Paulo, o presidente do TJ-SP ligou a solução do problema à criatividade. Para ele, “a maior parte dos infratores não poderia entrar no presídio. Seria necessário ter um esquema de aferição, no momento da prisão, para saber se o cidadão precisa permanecer atrás das grades”. A discussão para que isso ocorra em São Paulo já começou e, segundo Nalini, tem o apoio “de pessoas lúcidas da sociedade, que já perceberam que o crescimento exagerado do aprisionamento não é solução”, e sim um problema crônico.
O desembargador Otávio Toledo, presidente da Coordenadoria Criminal e de Execução Criminal do TJ-SP, citou a união do Executivo, Judiciário e do Ministério Público, que discutem medidas para melhorar a gestão do sistema carcerário de São Paulo
A fala de Lourival Gomes, secretário estadual de Administração Penitenciária, seguiu no mesmo caminho. Ele lamentou que a advocacia, o Ministério Público e o Judiciário coloquem a culpa pela superlotação apenas no sistema prisional, pois “é preciso fazer um mutirão no Senado — para criar novas leis sobre o assunto — e também é preciso fazer um mutirão nas entradas das prisões”. De acordo com ele, não há assistência adequada aos presos que ingressam no sistema e, depois, os advogados vão à Justiça comemorar a liberação de um cliente que cometeu crimes de menor valor, algo que é equivocado, completou. Lourival lembrou que o simples anúncio da instalação de um mutirão provoca expectativas em todos os presos paulistas, algo que não se cumpre e que o faz lamentar o uso do termo.
Para Jayme Garcia dos Santos Junior, juiz-auxiliar da Corregedoria-Geral de Justiça, o complexo de Guarulhos foi escolhido porque é estratégico e servirá como amostra do que é necessário fazer para melhorar a execução criminal em São Paulo. Na visão dele, a redução no total de presos provisórios depende do “gerenciamento de vagas e otimização da atividade jurisdicional”, além do desenvolvimento de políticas efetivas para a reinserção social dos condenados. Já Priscila Devechi Ferraz Maia, juíza da 5ª Vara Criminal de Guarulhos, classificou os casos de presos por crimes insignificantes como excepcionais, e lembrou que a reincidência muitas vezes é o que causa a prisão. A análise do crime até leva à conclusão de insignificância, mas o conjunto da obra comprova o acerto da prisão, diz ela.
Participaram da instalação do mutirão carcerário em Guarulhos o vice-presidente do TJ-SP, Eros Piceli, o corregedor-geral da Justiça de São Paulo, desembargador Hamilton Elliot Akel, o presidente da seção de Direito Criminal, Geraldo Pinheiro Franco, e o desembargador Valdir Sebastião de Nuevo Campos Júnior, vice-presidente da Coordenadoria Criminal e de Execução Criminal do TJ-SP. Também estavam presentes o juiz Jair Francisco dos Santos, que coordenará o mutirão, Adriana Porto Mendes, diretora do Fórum de Guarulhos, e Arnaldo Hossepian Junior, subprocurador-geral de Justiça.
Gabriel Mandel é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 11 de março de 2014
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