quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Condenado não precisa se arrepender para ter liberdade


"Ninguém pode ser obrigado a arrepender-se de qualquer ação ou omissão, por mais ofensiva que seja à sociedade ou aos valores tidos pela grande maioria da mesma." É com esse entendimento que a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro anulou decisão que impediu o benefício do livramento condicional a um homem, não arrependido confesso, condenado por atentado violento ao pudor. A decisão, unânime, é do último 9 de fevereiro.
O Habeas Corpus foi pedido pelo defensor público Carlos Alberto de Figueiredo e Silva contra decisão da Vara de Execuções Penais, que atendeu parecer da procuradora de Justiça Dora Beatriz Wilson da Costa. O homem, condenado a três anos e cinco meses, sob regime inicial fechado, já poderia ter usufruído do benefício desde 30 de novembro de 2011. No entanto, em virtude de fatores subjetivos, como o fato de o crime ter sido cometido contra um menor de 18 anos e ausência de desconforto ou arrependimento, o pedido foi negado.
O defensor público que cuidou do caso lembrou que a Lei de Execução Penal extinguiu a obrigatoriedade dos exames criminológicos e que atestado o conceito excelente, no cárcere, do paciente. Foi alegado também que o "juízo impetrado, invadindo atribuições do presidente da República, criou a inimaginável figura do veto judicial, até trazendo à lembrança os tempos da Santa Inquisição, ao exigir assunção de culpa e arrependimento".
Para o relator, desembargador Luiz Felipe Haddad, a decisão de primeira instância, que negou o livramento, "não foi fundamentada do modo exigido pela normatividade vigente". Ele narra, em seu voto, que "dois exames criminológicos foram procedidos na pessoa do paciente. O primeiro, de todo insuficiente. O segundo, mais detalhado, e na linha de não haver segurança a uma cognição de o paciente, livre do ergástulo, não voltar a cometer atos contrários ao mínimo do mínimo ético".
Ainda de acordo com o desembargador, "o Estado, no sentido amplo, não pode interferir na intimidade pessoal, e, menos ainda, na consciência de cada indivíduo". "O Direito é utilitário, não se confundindo com a moral, nem com a religião", diz.
De acordo com o desembargador, "já aclaradas, como estão, as circunstâncias objetivas do tempo cumprido da sanção, do comportamento prisional do paciente, de seu futuro e eventual emprego, e de seu projeto de vida familiar; impende que o juízo da VEP obre cognição sobre o dito livramento, com base nas mesmas, mas sem considerar a dita "elaboração crítica" e o dito "arrependimento", ou "remorso", ou "desconforto", em atinência ao fato pelo qual ele foi condenado".
Com a decisão, fica anulada a decisão que indeferiu o benefício.
No livramento ou liberdade condicional, o condenado, ao invés de cumprir toda a pena encarcerado, é posto em liberdade, desde que preenchidas condições legais do artigo 83 do Código Penal.
Clique aqui para ler a decisão da 5ª Câmara Criminal do TJ-RJ.
Marília Scriboni é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 22 de fevereiro de 2012

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