Protegendo os direitos do preso, a Lei de Execução Penal relaciona entre os direitos previstos em seu art. 41, a “entrevista pessoal e reservada com o advogado”. Com contornos de verdadeira garantia, a Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica – em seu artigo 8º, II, letra “d”, situa entre as “garantias judiciais” o “direito ao acusado de(...) comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor”.
Por outro lado, inerente ao exercício regular da advocacia e da defesa há o direito de entrevistar-se com seu cliente. Tutelando os direitos do advogado, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu art. 7º, III, reserva ao réu o direito de comunicar-se, de forma pessoal e reservada, com seu advogado. Aos defensores públicos, a Lei Complementar 132/2009 veio a incluir entre suas prerrogativas a proteção à entrevista pessoal e reservada com o assistido, garantindo, ainda, que tal deve ocorrer independentemente de prévio agendamento, o que deve ser aplicado analogicamente aos advogados.
É direito que pode ser exercido independentemente de procuração, ainda que esteja o cliente preso, detido ou recolhido em estabelecimento civil ou militar, mesmo considerado incomunicável, ou sob Estado de Defesa (CRFB, art. 136, IV). Assim prevê o art. 7º, do EOAB. Conforme enaltece a doutrina, “é o advogado quem, em primeiro lugar, terá a oportunidade de constatar a higidez física e moral e zelar por ela, reclamando quando o preso for desrespeitado no que concerne a direitos fundamentais”(1). E nunca é demais, quando abordamos o tema, relembrar que “quanto mais indefeso for o paciente, mais estimulado ficará o investigador para a aplicação de suplícios”(2).
Nesta trilha, quando estrangeiro – ou não for conhecedor da língua portuguesa – o custodiado, é direito do advogado fazer-se acompanhar de intérprete de sua confiança, independentemente de ser juramentado, nas entrevistas reservadas que mantiver com o seu cliente no estabelecimento prisional(3).
Desta forma, ao defensor não só é garantido se comunicar com seu cliente, como “sem qualquer interferência ou impedimento do estabelecimento prisional e dos agentes policiais”(4). O descumprimento dessa prerrogativa importa em crime de abuso de autoridade, consoante leitura do art. 3º, j, da Lei 4.898/1965, que define como abuso qualquer atentado “aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional” (norma essa que, apesar de repetidos abusos contra as prerrogativas dos advogados, não vem sendo observada).
A questão encontra-se intimamente relacionada com o tema do segredo profissional na advocacia. O Código Deontológico do Conseil Consultatif des Barreaux Européens (Conselho das Ordens dos Advogados da Comunidade Europeia) prevê como sendo o sigilo profissional o direito e o dever primeiro e fundamental do advogado. Em seu art. 2.3.1, resta insculpido que “é da essência da missão do Advogado que ele seja depositário de segredos do seu cliente e destinatário de informações confidenciais. Sem a garantia de confidencialidade não pode haver confiança. O segredo profissional é, assim, reconhecido como o direito e o dever primeiro e fundamental do Advogado”.
Em Portugal, o tema vem referido desde o Decreto n. 12.334 de 18 de setembro do ano de 1926 que determinava, em seu art. 50, ao advogado, “guardar segredo o mais absoluto, não lhe sendo lícito testemunhar contra aquele que lhe confiou a defesa da liberdade, honra e fazenda”. A doutrina portuguesa(5) registra que a natureza da obrigação de segredo profissional está intimamente ligada à natureza da própria profissão e tem uma tradição histórica marcante.
Não por menos o Código de Ética e Disciplina da advocacia consigna, em seu art. 25, que o “sigilo profissional é inerente à profissão”. O sigilo profissional na advocacia possui caráter estatutário. A doutrina encontra seu fundamento – tanto em sede de direito privado, como de direito penal, ou de direito administrativo – nos Direitos Humanos(6).
Embora seja substancial a preocupação do legislador pátrio em criar normas para a proteção desse direito, empiricamente verifica-se uma grande variedade de locutórios e tratamentos dispensados pelo País, havendo uma lacuna de parâmetros objetivos a serem seguidos na construção dos parlatórios, ou de orientação nesse sentido, por parte dos órgãos envolvidos.
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, em 2006, chegou a editar resolução recomendando, em seu art. 1º, “em obediência às garantias e princípios constitucionais, que a inviolabilidade da privacidade nas entrevistas do preso com seu advogado seja assegurada em todas as unidades prisionais” e, em seu parágrafo único, determinar que, “para efetivação desta recomendação, o parlatório ou ambiente equivalente onde se der a entrevista, não poderá ser monitorado por meio eletrônico de qualquer natureza”(7).
O Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) em suas “Diretrizes Básicas para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais”(8), não estabelece nenhuma orientação sobre como, por exemplo, evitar os locutórios coletivos violadores do caráter reservado das entrevistas, tão comuns em prisões por todo o País, assim como inexistem diretrizes métricas para que se evitem locutórios contíguos, e ausentes estão parâmetros de isolamento acústico, apesar das inovações tecnológicas atualmente existentes.
Em razão da ausência de tais parâmetros, há Estados em que locutórios são monitorados por câmeras, ou equipados com interfones, há os contíguos, com iluminação e aeração deficientes, com infiltrações...
Em importante precedente, o Supremo Tribunal Federal, em 2007, ao apreciar questão incidental em extradição(9), reconheceu nas prerrogativas profissionais dos advogados emanações da própria Constituição da República, e rechaçou o descumprimento de tais garantias constitucionais pelo Estado, frisando que este não pode invocar para fazê-lo quaisquer dificuldades de ordem material. A mencionada decisão condena expressamente: a) a utilização de interfones; b) os parlatórios coletivos; e c) quaisquer barreiras físicas.
Enquanto inexistir norma jurídica específica que defina um padrão regular, para todo o território nacional, para a realização das entrevistas entre advogado e seu cliente preso, o método de interpretação da Constituição que deve inspirar o aplicador da lei deve ser aquele que atribui às normas constitucionais o sentido que lhes empreste maior eficácia, sendo certo que, em se tratando do tema de direitos do preso, a interpretação há de ser ampla(10). A conjugação das garantias constitucionais (CRFB, arts. 5º, LV, LXIII e 136, IV) e das normas infraconstitucionais (Lei 7.210/1984, EOAB, LC 80/1994) com os precedentes da Corte Constitucional, desde já, autoriza sejam iniciadas profundas reformas em nossas unidades prisionais.
Por outro lado, inerente ao exercício regular da advocacia e da defesa há o direito de entrevistar-se com seu cliente. Tutelando os direitos do advogado, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu art. 7º, III, reserva ao réu o direito de comunicar-se, de forma pessoal e reservada, com seu advogado. Aos defensores públicos, a Lei Complementar 132/2009 veio a incluir entre suas prerrogativas a proteção à entrevista pessoal e reservada com o assistido, garantindo, ainda, que tal deve ocorrer independentemente de prévio agendamento, o que deve ser aplicado analogicamente aos advogados.
É direito que pode ser exercido independentemente de procuração, ainda que esteja o cliente preso, detido ou recolhido em estabelecimento civil ou militar, mesmo considerado incomunicável, ou sob Estado de Defesa (CRFB, art. 136, IV). Assim prevê o art. 7º, do EOAB. Conforme enaltece a doutrina, “é o advogado quem, em primeiro lugar, terá a oportunidade de constatar a higidez física e moral e zelar por ela, reclamando quando o preso for desrespeitado no que concerne a direitos fundamentais”(1). E nunca é demais, quando abordamos o tema, relembrar que “quanto mais indefeso for o paciente, mais estimulado ficará o investigador para a aplicação de suplícios”(2).
Nesta trilha, quando estrangeiro – ou não for conhecedor da língua portuguesa – o custodiado, é direito do advogado fazer-se acompanhar de intérprete de sua confiança, independentemente de ser juramentado, nas entrevistas reservadas que mantiver com o seu cliente no estabelecimento prisional(3).
Desta forma, ao defensor não só é garantido se comunicar com seu cliente, como “sem qualquer interferência ou impedimento do estabelecimento prisional e dos agentes policiais”(4). O descumprimento dessa prerrogativa importa em crime de abuso de autoridade, consoante leitura do art. 3º, j, da Lei 4.898/1965, que define como abuso qualquer atentado “aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional” (norma essa que, apesar de repetidos abusos contra as prerrogativas dos advogados, não vem sendo observada).
A questão encontra-se intimamente relacionada com o tema do segredo profissional na advocacia. O Código Deontológico do Conseil Consultatif des Barreaux Européens (Conselho das Ordens dos Advogados da Comunidade Europeia) prevê como sendo o sigilo profissional o direito e o dever primeiro e fundamental do advogado. Em seu art. 2.3.1, resta insculpido que “é da essência da missão do Advogado que ele seja depositário de segredos do seu cliente e destinatário de informações confidenciais. Sem a garantia de confidencialidade não pode haver confiança. O segredo profissional é, assim, reconhecido como o direito e o dever primeiro e fundamental do Advogado”.
Em Portugal, o tema vem referido desde o Decreto n. 12.334 de 18 de setembro do ano de 1926 que determinava, em seu art. 50, ao advogado, “guardar segredo o mais absoluto, não lhe sendo lícito testemunhar contra aquele que lhe confiou a defesa da liberdade, honra e fazenda”. A doutrina portuguesa(5) registra que a natureza da obrigação de segredo profissional está intimamente ligada à natureza da própria profissão e tem uma tradição histórica marcante.
Não por menos o Código de Ética e Disciplina da advocacia consigna, em seu art. 25, que o “sigilo profissional é inerente à profissão”. O sigilo profissional na advocacia possui caráter estatutário. A doutrina encontra seu fundamento – tanto em sede de direito privado, como de direito penal, ou de direito administrativo – nos Direitos Humanos(6).
Embora seja substancial a preocupação do legislador pátrio em criar normas para a proteção desse direito, empiricamente verifica-se uma grande variedade de locutórios e tratamentos dispensados pelo País, havendo uma lacuna de parâmetros objetivos a serem seguidos na construção dos parlatórios, ou de orientação nesse sentido, por parte dos órgãos envolvidos.
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, em 2006, chegou a editar resolução recomendando, em seu art. 1º, “em obediência às garantias e princípios constitucionais, que a inviolabilidade da privacidade nas entrevistas do preso com seu advogado seja assegurada em todas as unidades prisionais” e, em seu parágrafo único, determinar que, “para efetivação desta recomendação, o parlatório ou ambiente equivalente onde se der a entrevista, não poderá ser monitorado por meio eletrônico de qualquer natureza”(7).
O Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) em suas “Diretrizes Básicas para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais”(8), não estabelece nenhuma orientação sobre como, por exemplo, evitar os locutórios coletivos violadores do caráter reservado das entrevistas, tão comuns em prisões por todo o País, assim como inexistem diretrizes métricas para que se evitem locutórios contíguos, e ausentes estão parâmetros de isolamento acústico, apesar das inovações tecnológicas atualmente existentes.
Em razão da ausência de tais parâmetros, há Estados em que locutórios são monitorados por câmeras, ou equipados com interfones, há os contíguos, com iluminação e aeração deficientes, com infiltrações...
Em importante precedente, o Supremo Tribunal Federal, em 2007, ao apreciar questão incidental em extradição(9), reconheceu nas prerrogativas profissionais dos advogados emanações da própria Constituição da República, e rechaçou o descumprimento de tais garantias constitucionais pelo Estado, frisando que este não pode invocar para fazê-lo quaisquer dificuldades de ordem material. A mencionada decisão condena expressamente: a) a utilização de interfones; b) os parlatórios coletivos; e c) quaisquer barreiras físicas.
Enquanto inexistir norma jurídica específica que defina um padrão regular, para todo o território nacional, para a realização das entrevistas entre advogado e seu cliente preso, o método de interpretação da Constituição que deve inspirar o aplicador da lei deve ser aquele que atribui às normas constitucionais o sentido que lhes empreste maior eficácia, sendo certo que, em se tratando do tema de direitos do preso, a interpretação há de ser ampla(10). A conjugação das garantias constitucionais (CRFB, arts. 5º, LV, LXIII e 136, IV) e das normas infraconstitucionais (Lei 7.210/1984, EOAB, LC 80/1994) com os precedentes da Corte Constitucional, desde já, autoriza sejam iniciadas profundas reformas em nossas unidades prisionais.
NOTAS
(1) TORON, Alberto Zacharias. SZAFIR, Alexandra Lebelson.Prerrogativas Profissionais do Advogado. OAB Editora, 2006.p. 145/149.
(2) THOMPSON, Augusto. Quem são os criminosos? – o crime e o criminoso: entes políticos. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 1998.
(3) STF, Ext. 633, petição avulsa em extradição / CH República da China. rel. min. Celso de Mello. DJ 3/8/1995.
(4) LÔBO, Paulo. Estatuto da advocacia e da OAB. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2009.
(5) CARDOSO, Augusto Lopes. Do segredo profissional na advocacia. Viseu: Centro Editor Livreiro da Ordem dos Advogados, 1998. p. 15.
(6) SANTIAGO, Rodrigo. Do crime de violação de segredo profissional no código penal de 1982. Coimbra: Livraria Almedina, 1992. pp. 103/104.
(7) Publicada, em 8/6/2006, no Diário Oficial da União.
(8) Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciá ria. Diretrizes básicas para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais. Brasília: CNPCP, 2006.
(9) STF. Extradição no 1.085/IT, DJ 1/8/2007, julgamento em 26/6/2007.
(10) MARCÃO, Renato. Curso de execução penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
(2) THOMPSON, Augusto. Quem são os criminosos? – o crime e o criminoso: entes políticos. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 1998.
(3) STF, Ext. 633, petição avulsa em extradição / CH República da China. rel. min. Celso de Mello. DJ 3/8/1995.
(4) LÔBO, Paulo. Estatuto da advocacia e da OAB. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2009.
(5) CARDOSO, Augusto Lopes. Do segredo profissional na advocacia. Viseu: Centro Editor Livreiro da Ordem dos Advogados, 1998. p. 15.
(6) SANTIAGO, Rodrigo. Do crime de violação de segredo profissional no código penal de 1982. Coimbra: Livraria Almedina, 1992. pp. 103/104.
(7) Publicada, em 8/6/2006, no Diário Oficial da União.
(8) Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciá ria. Diretrizes básicas para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais. Brasília: CNPCP, 2006.
(9) STF. Extradição no 1.085/IT, DJ 1/8/2007, julgamento em 26/6/2007.
(10) MARCÃO, Renato. Curso de execução penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
Rodrigo de Oliveira Ribeiro
Advogado. Ex-delegado da Comissão de Defesa Assistência e Prerrogativa da OAB-RJ. Especialização em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas/RJ.
Advogado. Ex-delegado da Comissão de Defesa Assistência e Prerrogativa da OAB-RJ. Especialização em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas/RJ.
RIBEIRO, Rodrigo de Oliveira. Locutórios inconstitucionais. In Boletim IBCCRIM. São Paulo : IBCCRIM, ano 17, n. 210, p. 06-07, mai., 2010.
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