A sofrida Catarina, personagem da atriz Lília Cabral na novela global “A Favorita”, aquela que sofreu durante todo o folhetim todos os tipos de violência por parte do marido Leonardo (Jackson Antunes), seria o tipo de cliente preferencial de mais uma etapa de um curso que a prefeitura de Rio Branco, através da Coordenadoria Municipal da Mulher, lançou ontem na capital para atender 160 donas de casa. Desse total, nem todas sofreram espancamentos ou ameaças por parte de seus maridos e companheiros, mas não deixavam de sofrer outro fator de desagregação familiar: a pobreza.
Unidas pelo sofrimento, depois de participarem de etapas anteriores de curso de profissionalização, agora elas têm a perspectiva de um lugar ao sol no mercado de trabalho e, no caso das primeiras, aquelas que são ou que foram espancadas, poderão criar mecanismos de sobrevivência longe de seus agressores. A psicóloga Samara Lopes de Moraes, que atende o programa e a Casa Rosa Mulher, para onde são levadas as mulheres que buscam refúgio e ajuda contra violência de seus companheiros, revela que grande parte das mulheres espancadas e ameaçadas que mesmo assim voltam a viver ou que não conseguem deixar seus agressores o faz por não ter perspectiva financeira. Ou, no caso das segundas, aquelas que vivem em paz com seus maridos mas veem a família se desagregar por não poder ajudar financeiramente no sustento da casa, quando passam pelo curso, “sentem-se mais empoderadas e ganham mais confiança”. “São realmente mais felizes”, diz a psicóloga.
É o caso de cabeleira Marcela Pinto Bento, 24, três filhas, moradora do bairro Mocinha Magalhães. Esposa de um trabalhador de serviços gerais que ganha um salário mínimo por mês, ela conta que sua vida ao lado do marido e dos filhos, por falta de condições financeiras, “era um inferno”. “É muito triste a gente ver um filho da gente passando dificuldades, mesmo com o pai lutando muito, e não poder ajudar”, contou, ao revelar que chegou ao programa através dos técnicos da Prefeitura, em 2007. “Hoje, eu ganho até mais que meu marido e ajudo a pagar as contas de casa”, diz, rindo, preparando-se para mais uma etapa do curso em que espera aprender a cortar cabelo masculino e se especializar melhor.
A seu lado, uma mulher do grupo de espancadas o ameaçadas cujo nome não pode ser revelado em função da política de proteção defendida pela Casa Rosa Mulher (para onde são encaminhadas as mulheres vítimas de violência), revela que chegou ao programa após sofrer violências por parte do marido. “Eu me separei em 2004, mas não tinha como sobreviver com meus filhos. Acabei voltando com ele e a violência se repetiu. Quando foi em 2007, depois dele me bater e me ameaçar de novo, me separei prometendo a mim mesmo que, se conseguisse meios para sobreviver, nunca mais eu voltaria àquela vida de sofrimento. Felizmente consegui meios de sobreviver”, diz a manicure que aprendeu a profissão num curso anterior e que agora está buscando especialização em outras áreas de estética. “Se Deus quiser, nunca mais homem nenhum vai me bater”, disse.
Criado pela Coordenadoria Municipal da Mulher, órgão da Prefeitura Municipal, o projeto “Promovendo a Autonomia Econômica de Mulheres de Rio Branco”, teve a sua nova etapa lançada na Casa Rosa Mulher, no bairro da Cidade Nova, pelo prefeito em exercício Eduardo Farias, com o objetivo de capacitar para o mercado de trabalho várias mães de família anteriormente condenadas ao sofrimento. São mulheres, jovens ou não, com histórias de muito sofrimento, mas que, a partir de agora, depois que passaram pelas fases anteriores ao projeto, elas aprendem profissões na área de estética (manicure, corte de cabelo), de confecções de roupas, paisagismo e floricultura. Algumas, que anteriormente dependiam única e exclusivamente da renda do marido, o que lhes impedia de um rompimento com a relação mesmo em caso de agressão, hoje passam a ganhar até mais de 1 mil reais, como é o caso da sorridente cabeleira Marcela Pinto bento. “Os cursos abrem a possibilidade dessas mulheres terem oportunidades para o empreededorismo”, disse a gerente municipal da área, Elizângela Pontes.
Isso significa dizer que as mulheres que anteriormente viviam na vida real o drama representado pela personagem Catarina, mesmo sofrendo violência de seus maridos e companheiros e ainda assim permaneciam na companhia deles por falta de opção para sustentar a si e aos filhos, a partir desses cursos, passam a ter profissão e renda suficiente para poder romper com seus agressores. Ou, no caso da pobreza, para poder ajudar os maridos, informa a psicóloga Samara Lopes de Moraes, uma das coordenadoras do projeto. “É fato que muitas mulheres vítimas da violência permanecem ao lado de seus agressores muito mais por falta de alternativa econômica, com medo de enfrentar o mercado de trabalho por não ter uma profissão ou opção. É verdade que muitas, mesmo sofrendo, ainda estão vinculadas a laços afetivos, mas a maioria, no caso da violência, se vê presa é à falta de alternativa de sobrevivência”, diz a psicóloga com base nas centenas de depoimentos que ouviu desde que passou a trabalhar no projeto.
O prefeito em exercício Eduardo Farias emocionou-se ao falar em nome do prefeito Raimundo Angelim (que está de férias) durante o lançamento do programa. “O prefeito pediu que eu viesse aqui e trouxesse o abraço dele às todas vocês que participam desses cursos. O prefeito e todos nós da administração municipal sabemos da importância de cursos como este para a independência de pessoas que o destino tentou condenar ao sofrimento”, disse Eduardo Farias. “Os cursos de requalificação profissional permitem que elas disputem espaço no mercado de trabalho com maior potencial. Esta é mais uma ação da prefeitura, entre uma série de ações que estamos desenvolvendo já no início desta segunda gestão para que possamos chegar ao final do mandato com mais trabalho ainda para mostrar”, disse o prefeito aos jornalista ao destacar a atuação da Casa Rosa Mulher na defesa de mulheres em situação de risco. A Casa Rosa Mulher foi criada na gestão do então prefeito de Rio Branco, Jorge Viana.
“O objetivo é promover o aperfeiçoamento profissional das mulheres que já fizeram o curso básico, na Casa Rosa Mulher ou nos bairros, para que elas tenham melhores condições de se colocar no mercado de trabalho”, explica a coordenadora da Mulher, Rose Scalabrin. A coordenadora da Casa Rosa Mulher, Graça Lopes, ressaltou que o objetivo é fortalecer as mulheres que procuram a casa, ajudando-as a recuperar a auto-estima e ter uma forma de geração de renda.
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