domingo, 27 de abril de 2008

Ressocialização comprometida

Nas 21 unidades prisionais do Estado há 11,6 mil presos, mas apenas cerca de 40% trabalham. Desses, nem todos se ocupam com atividades que vão lhe fornecer um preparo para encarar o mercado. Considerando que a maioria que entra numa penitenciária possui um nível baixo de escolaridade e nenhuma qualificação profissional, o processo de ressocialização da maioria fica comprometido. Se o detento sai da prisão e não consegue arranjar um trabalho, voltar ao mundo do crime torna-se apenas uma questão de tempo.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) está de olho no problema e já enviou à Procuradoria Geral do Estado um termo de ajuste de conduta, conforme a Lei de Execução Penal (LEP). O procurador Glaucio Araújo de Oliveira diz que as coisas estão começando a acontecer, mas ainda engatinhando. Ele aponta vários problemas que emperram o processo de ressocialização, que é um direito dos presos e uma necessidade para sociedade.

Ele diz que nem todas as atividades disponibilizadas aos presos atendem ao que diz a LEP. São oferecidos trabalhos que não qualificam profissionalmente, como a costura de bolas, montagem de grampos e a própria limpeza das unidades. “Essas atividades não exigem um preparo, não qualificam ninguém para o mercado de trabalho. A LEP diz que o trabalho precisa ter caráter educativo, formativo, capacitador, profissionalizante, produtivo”, explica.

O salário que os presos recebem também está aquém do que manda a lei que é de três quartos de um salário mínimo. Ele explica que há presos recebendo apenas R$ 80, para realizar serviços de limpeza dentro das unidades. Além disto, este tipo de atividade também não se enquadra no que determina a legislação, serve apenas para o Estado economizar com o pagamento de trabalhadores.

Outro problema que o procurador vê é a concorrência desleal. Ele diz que existem empresas que não possuem nenhum trabalhador fora das unidades. Desta forma, se livra de vários encargos e ainda paga bem menos do que teria que pagar a um trabalhador fora dos muros da prisão. Desta forma, o preço de seu produto acaba ficando bem abaixo do que de outras empresas. “Uma boa parte dos empresários visam apenas obter lucros e não ajudar na ressocialização”, comenta. Segundo o procurador, as empresas não podem ter mais de 10% de mão-de-obra carcerária. Para incentivar a ofertas de cursos profissionalizantes, a MPT vem revertendo as penas aplicadas a empresários para contribuir com o sistema carcerário.

Segundo um documento enviado, esta semana, pela Secretaria Estadual de Justiça e da Cidadania (Seju), apenas 40% dos presos fazem alguma atividade de trabalho. O material também mencionava os cursos de qualificação que são oferecidos anualmente a 505 detentos, em convênio com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), como de costura industrial, eletricista industrial predial, azulejista, pintor, encanador, garçom reparo e manutenção de microcomputadores, entre outros.

No entanto, O Estado pretendia repercutir os números e saber porque a maioria dos presos não fazem nenhuma atividade de trabalho, além de saber quantos realmente estão exercendo um trabalho que prepare o detento para enfrentar a vida quando sair da prisão, além de quantos estão em atividades apenas para passar o tempo e redimir a pena em um dia para cada três trabalhados. A reportagem entrou em contato com a Seju desde a última terça-feira, mas não conseguiu nenhuma entrevista até o fim da tarde de sexta-feira.

Falta apoio aos familiares dos presos

O sociólogo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, João dos Santos Filho, faz duras críticas ao processo de ressocialização que existe hoje. Além de a maioria não ter acesso a nenhum tipo de qualificação, falta apoio aos familiares dos presos. “Quando ele sai da cadeia, encontra a mulher e os filhos passando fome, não encontra emprego, volta a praticar crimes. O problema só se resolve quando a família for assistida. Estamos num ciclo que não tem saída, não adianta criar mais cadeia que não resolve o problema”, observa.

Segundo ele, é necessário a implantação de um plano nacional de ressocialização. Ele diz que existem várias iniciativas neste sentido, mas ainda não dão conta de todo o problema.

Santos Filho afirma que toda a sociedade precisa colaborar, além das centrais sindicais. “Se o empresário não participa, cabe ao Estado incentivar e cobrar essa colaboração”, comenta. Além disto, diz que ninguém sabe ao certo qual é o índice de ressocialização atual, não existe um acompanhamento para saber o que aconteceu com o preso depois que saiu da cadeia.

Ele defendeu ainda o Programa Bolsa Família do governo federal. Tirando o crime organizado, as outras pessoas que estão no sistema carcerário são o resultado da miserebilidade social e econômica. “Existem prefeituras no Nordeste em que o salário mínimo pago é de R$ 60. Portanto R$ 1,00 para estas famílias é dinheiro”, explica. (EW)

Programa ajuda detentos no Paraná

O governo do Estado desenvolve um programa que tenta dar apoio aos presos que estão em regime aberto, que cumprem penas alternativas ou que tiveram regressão da pena. O Programa Pró-Egresso, que existe há 30 anos, presta assistência jurídica, psicológica e de serviço social. Em Maringá, o Pró-Egresso funciona em parceria com a Universidade Estadual de Maringá (UEM) e atende 900 pessoas. A coordenadora, professora Maria Teresa Claro Gonzaga, diz que 85% dos assistidos têm entre 20 e 50 anos, baixo nível de escolaridade e nunca tiveram um vínculo empregatício.

Uma das medidas do programa é encaminhar os presos para cursos e entrevistas de trabalho, mas a resistência de muitos empresários é grande. “A situação já melhorou. Mas poucos conseguem um emprego. Quem passou pelo regime fechado tem mais dificuldade de aceitação”, fala. Maria Tereza diz que a população também precisa ser preparada para ter o preso de volta.

Ela comenta ainda que o índice de reincidência de presos que ficaram em regime aberto é bem maior dos que estão no fechado. “As pessoas não saem do seu habitat, ficam perto da família, entendem o que fizeram de errado com mais facilidade”, falou.
Com exceção dos crimes mais graves, ela acha que os demais, que praticaram furtos, roubos, pessoas que lidaram com drogas deveriam ficar em regime aberto, sendo acompanhadas de perto. (EW)


O Estado do Paraná, 27/04/2008.

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