sábado, 19 de abril de 2008

Juristas divergem sobre lei de Segurança Nacional

Oito líderes sem terra da região da Fazenda Coqueiros responderão a processo por crime federal

O processo que tramita na Justiça Federal de Carazinho, acusando oito líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de crimes contra a Segurança Nacional, chamou a atenção dos juristas, que divergem sobre a utilização da Lei 7.170.

Datada de 1983, época em que ainda vigorava o governo militar, a lei que define os crimes contra a Segurança Nacional passou a ser questionada após a promulgação da Constituição Federal de 1988.

O jurista Eduardo Carrion, professor da Fundação Ministério Público, não concorda com o uso do texto. Para Carrion, a expressão "segurança nacional" aparece na Constituição em contextos distintos daquele usado na lei.

- A Lei de Segurança Nacional é uma herança do regime militar e dos governos autoritários, e há artigos nesta lei que são incompatíveis com os princípios constitucionais e com as regras da legislação penal - salienta Carrion.

Para ele, o Código Penal deveria ser aplicado aos eventuais excessos de integrantes dos movimentos sociais que caracterizam delitos e não configuram crime político.

O jurista Ives Gandra Martins concorda que o Código Penal geralmente tipifica todos os crimes cometidos quando os movimentos sociais violam a Constituição. Mas acredita que a Lei de Crimes contra a Segurança Nacional ainda pode ser aplicada, embora não em sua totalidade.

- Se a Justiça Federal do Rio Grande do Sul recebeu a denúncia, o fez corretamente. No Estado democrático de Direito, usar de violência contra a propriedade alheia para conseguir a reforma agrária, ao invés de usar a via legal das urnas, os torna um grupo de delinqüentes - comenta Martins.

O processo conta com mais de 10 volumes, somando cerca de 3 mil páginas. A investigação, foi iniciada pela procuradora Patrícia Muxfeld, do Ministério Público Federal de Carazinho, há cerca de um ano. Depois de investigações preliminares, Patrícia solicitou à Polícia Federal que instaurasse um inquérito para apurar os fatos denunciados. Além de fotografias, documentos oficiais da Brigada Militar e da Polícia Civil, o inquérito contou com uma série de depoimentos.

Processo prosseguirá em segredo de Justiça

A denúncia, entregue pela Procuradoria no final de março, diz que as ações dos integrantes do MST acampados em torno da Fazenda Coqueiros, reevestem-se de "inconformismo político ante a não expropriação da área". Agindo de forma violenta contra o patrimônio e contra as pessoas para impor ao Poder Público a reforma agrária, os integrantes do movimento estariam usando de meios ilícitos para alcançar seu objetivo, incorrendo em crimes previstos na Lei de Segurança Nacional, conforme a denúncia.

Da mesma forma que o inquérito, o processo vai prosseguir na Vara da Justiça Federal de Carazinho, em segredo de Justiça. Ontem, o juiz Felipe Veit Leal se manifestou em nota à imprensa, adiantando que o processo vai seguir garantindo todas as formas de defesa previstas em lei, ouvindo os acusados e testemunhas e colhendo provas.


Zero Hora, 19/04/2008.

Nenhum comentário:

Pesquisar este blog