quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Número de mortes por substâncias ilícitas aumentou 150% no Brasil

Uma grande pergunta ainda paira sobre a recente atuação de forças policiais e armadas nas favelas do Rio de Janeiro: a guerra e a ocupação vão influenciar na diminuição do consumo das drogas? Em duas semanas de operação, a Polícia Militar do estado responde apenas ao imediato: são 24,2 toneladas de maconha e 88 quilos de cocaína fora do tráfico. No entanto, o combate à oferta não corresponde, em relação simplista, à redução da demanda. Do ano 2000 ao dia 31 de outubro deste ano, a Polícia Federal apreendeu 156,8 toneladas de cocaína em todo o país, de forma crescente, ao longo dos anos — no mesmo período foram apreendidas 1,7 mil toneladas de maconha.

Mais que isso: o Relatório Mundial sobre Drogas 2010, do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc), aponta crescimento do consumo de cocaína no Brasil – o país ainda abriga o maior mercado da droga na América do Sul em termos absolutos, com 900 mil usuários. É a segunda droga mais presente no Brasil, e os números indicam que o olhar voltado à segurança pública deve vir com o filtro da violência gerada pelo tráfico. Especialistas ouvidos pelo Estado de Minas avaliam que a redução do consumo deve passar, necessariamente, por uma outra política: a de saúde pública.

Prevenção e tratamento. As palavras concentram as principais estratégias defendidas por estudiosos dos efeitos das drogas no indivíduo e na sociedade. O Ministério da Saúde afirma que a Política Nacional de Saúde Mental, que contou com um orçamento de R$ 1,5 bilhão neste ano, desenvolve ações que articulam, justamente, a prevenção e a oferta de tratamento e de redução de danos. As ações de prevenção, no entanto, foram resumidas genericamente pela assessoria do ministério a “desenvolvimento de ações de educação e informação, o envolvimento da família e a mobilização de toda a sociedade”. Já a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), da Presidência da República, não informou os avanços relacionados às atividades de articulação e coordenação de atividades de prevenção, que estão sob sua responsabilidade.

Para o economista Daniel Cerqueira, um dos autores do estudo Análise dos Custos e Consequências da Violência no Brasil, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Estado peca nas ações básicas. “Muitos jovens não sabem dos efeitos negativos que a droga pode trazer a médio e longo prazos. Por outro lado, especialistas e governo não têm informação de qualidade. Não identificam o público vulnerável nem as drogas que utilizam, e muito menos sabem o valor dessa droga. Temos um completo desconhecimento dessa questão no Brasil, ao mesmo em tempo em que é nosso dever disputar cada jovem com o tráfico”, afirma.

Internação

Para o pesquisador, a ausência de informações dificulta uma política de prevenção efetiva. Por outro lado, ele acusa a falta de investimentos em um dos principais eixos do tratamento: a internação. “O valor destinado às internações de usuários de drogas ilícitas e de álcool diminuiu de R$ 468 milhões, em 1998, para R$ 321 milhões, em 2007. Esse cálculo leva em conta não só os repasses feitos pelos Sistema Único de Saúde (SUS) em internação, como os custos com atendimento ambulatorial e os gastos arcados pelos próprios estados e municípios com o usuário”, explica Cerqueira. O especialista analisou ainda o Sistema de Informações Hospitalares (SIH) do SUS, que mostra estabilidade no número de internações dos usuários de drogas e álcool entre 1998 e 2007, mantido em torno de 100 mil por ano.

O problema é quando se analisa a variação em cima desse número: a internação de usuários de drogas ilícitas aumentou (13.905 para 32.847), enquanto a dos que consomem álcool diminuiu (87.889 para 65.159). “Para piorar, nesse mesmo período, as mortes por bebidas alcoólicas aumentaram em 40% e o número de mortes por drogas ilícitas cresceu mais de 150%. Ou seja, ambos os usuários precisam de leitos para internação. Um não pode pegar o lugar do outro.” Até o ano passado, foram fechados pelo menos 16 mil leitos voltados aos usuários de drogas e, atualmente, o SUS conta com apenas 8,8 mil leitos em hospitais gerais — ou seja, não psiquiátricos. De acordo com o Ministério da Saúde, a redução está vinculada às diretrizes da reforma psiquiátrica, instalada por meio da Lei 10.216, de 2001.

“A nossa diretriz consiste em ampliar a rede e oferecer serviços a partir de diversas perspectivas, que preveem assistência de pacientes fora do hospital, durante a internação e depois da alta. Não buscamos o aumento da internação, e sim o aumento do acesso às políticas”, defende o coordenador nacional de saúde mental do Ministério da Saúde, Pedro Gabriel Delgado. Ele informa que o ministério complementa o atendimento por meio das chamadas ações de saúde mental extramuros como Consultórios de Rua, Casas de Acolhimento Transitório e ações de redução de danos, assim como a disseminação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) — que aumentaram de 424 unidades, em 2002, para 1.571, em 2010.

Fonte: Larissa Leite - O Estado de Minas

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