Em palestra realizada no 2º Fórum Nacional de Alternativas Penais (Fonape), promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em Salvador (BA), a professora associada da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Maíra Rocha Machado defendeu a necessidade de que os poderes Judiciário, Executivo e Legislativo se controlem mutuamente, para que não tenham de tomar decisões sozinhos, como na questão da superpopulação prisional.
Na opinião da professora, é preciso questionar o modelo já cristalizado de que o que ocorre dentro das prisões é problema do administrador público, de que a discussão entre penas altas é do legislador e de que a tarefa de saber quem deve ou não ir para prisão é das autoridades policiais. “Na interação entre esses grandes grupos é que o problema prisional se forma, e todo mundo perde quando um dos poderes restringe o seu campo de atuação, atribuindo aos demais a responsabilidade pelos feitos que foram causados juntos”, afirmou.
Na palestra, a professora Maíra Machado abordou a questão prisional e a separação de poderes em matéria penal, destacando que a superpopulação carcerária não seria apenas um problema quantitativo. “Agregam-se a essa formulação também aspectos qualitativos sobre as condições de vida na prisão, como as questões alimentares, de saúde, familiares e o acesso ao trabalho e educação”, afirmou a professora. Para ela, mesmo em um sistema com todas as condições estruturais e materiais favoráveis, a pena de prisão pode ainda ser inadequada ou injusta ao caso concreto.
Ela apresentou alguns resultados de uma pesquisa realizada pela FGV envolvendo ações civis públicas pleiteadas pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, objetivando a interdição de estabelecimentos prisionais. Os pedidos foram negados por juízes sob o argumento de que a decisão caberia ao Executivo, e não ao Judiciário. No entanto, decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), tomada em agosto de 2015, de recurso sob a relatoria do presidente da Corte, ministro Ricardo Lewandowski, alterou essa interpretação.
Para Maíra Machado, as audiências de custódia são um exemplo “extraordinário” da possibilidade de utilização do campo de atuação do Poder Judiciário e de valorização dos tratados internacionais.
Na opinião da professora, as audiências de custódia permitem acessar uma história além daquela do auto de prisão em flagrante, para que se possa constituir uma verdade processual sobre as circunstâncias da prisão e sua manutenção ou não. “As audiências já entram para a história como maior ilustração de um poder que chamou para si a responsabilidade; o Judiciário observou a sua margem de atuação de modo a conseguir modificar um estado de coisas”, diz Maíra.
Massacre do Carandiru – A professora participou do projeto de pesquisa “O Massacre do Carandiru e o sistema de Justiça brasileiro”, desenvolvido entre 2012 e 2015 pelo Núcleo de Estudos sobre o Crime e a Pena da FGV Direito SP. O objetivo do projeto foi avaliar como as instituições do sistema de Justiça brasileiro reagiram a um episódio de grave violação de direitos humanos, ocorrido no período de transição à democracia. O livro reúne os resultados da pesquisa e textos de autores de diferentes áreas do conhecimento sobre as implicações sociais, políticas e jurídicas do Massacre, além das condições que permitiram que isso ocorresse: a superpopulação prisional e a violência policial.
Agência CNJ de Notícias. 04/03/2016.
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