* Thaíse Formigari Fontana
A discussão sobre a fixação dos danos morais acalora o mundo jurídico, contudo, ao que tudo indica este assunto está prestes a sofrer grandes alterações. Tramita atualmente no Congresso Nacional o Projeto de Lei 523/11, de autoria do deputado Walter Tosta (PMN-MG), que define e fixa o dano moral conforme sua natureza.
Para o autor do projeto, dano moral é “todo aquele em que haja irreparável mácula à honra subjetiva de pessoa natural ou jurídica”. Segundo o PJ 523/11, a indenização deve ser fixada entre 10 e 500 salários mínimos (R$ 5.540 a 272.500, atualmente) sempre levando em conta o potencial econômico da vítima e o do autor do dano.
Nesta busca de especificar, e, em certo grau, de medir o dano moral, o deputado classifica quais são condutas ofensivas: cobrança indevida de valores; contratação em relação de consumo, sem a anuência formal expressa do consumidor; realização de revista em consumidor; venda de passagem para veículo de transporte coletivo cujas vagas estejam esgotadas; fornecimento de produto fora das especificações técnicas ou adequadas às condições de consumo; cobrança, por qualquer meio, em local de trabalho; erro médico que cause dano à vida ou à saúde do paciente; exposição da vida ou da saúde de outrem a risco; exposição de dados pessoais, sem a anuência formal da pessoa exposta; exposição vexatória ou não consentida da imagem pessoal; qualquer ato ilícito, ainda que não gere dano específico, entre outros.
Ainda que não estejam expressamente descritas todas as situações que o projeto prevê, é possível termos uma ideia de qual a intenção da medida. Há muito permeia uma acirrada discussão sobre a legalidade da fixação do dano moral, baseando-se na premissa do não enriquecimento ilícito. E, pelo visto muito se discutirá até chegarmos a um consenso.
A grande falha deste e de tantos outros projetos de lei ou mesmo de alguns entendimentos jurisprudencial está em definir e classificar o enriquecimento ilícito, ou o enriquecimento sem causa. Para tanto é necessário entendemos do que se tratam: "enriquecimento ilícito é um aumento de patrimônio de alguém, pelo empobrecimento injusto de outrem. Ao passo que enriquecimento sem causa é o proveito que, embora não necessariamente ilegal, configura o abuso de direito, ensejando uma reparação". (Dicionário jurídico brasileiro. 9ª ed., ver., atual e ampl. - São Paulo : Editora Jurídica Brasileira, 1998).
Com base neste conceito é que grande parte dos doutrinadores e aplicadores do direito, e aqui englobamos também o projeto de lei 523/11 equivocadamente tenta fixar o volúvel.
Para tanto se utilizam basicamente de dois parâmetros. Primeiro do não enriquecimento ilícito, contudo uma porção a mais de cautela deve ser tomar ao falar no tema. Este instituto na verdade não existe, ou melhor, é ilegal. Ora, não há nenhum parâmetro de justiça em dar menos ao que tem menos, ainda que tenha causado um enorme dano a sua vida ou de seu familiar apenas por seus rendimentos serem parcos, ou pior, majorar uma indenização, de um pequeno dano por ser o indenizado portador de bons rendimentos. (sem se esquecer ainda da condição patrimonial do causador do dano). Sendo assim, aqui está a gênese dos problemas.
E em segundo lugar, contudo não menos importante está na dificuldade de se fixar algo tão subjetivo. O que seria dano moral? Conforme já elucidado, seria o dissabor vivido por uma ofensa, dano, ou melhor dizendo nas palavras de Yussef Said Cahali: “é a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-se desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.)".
Por óbvio, não podemos afirmar que o dano gerado a um sujeito por ter sido revistado em um shopping seja o mesmo que para outro, uma vez que esta abordagem pode ter sido feita inúmeras maneiras diferentes e ainda, existem “n” dissabores que cada um pode já ter vivido, o que agrava ou minimiza a situação. Enfim, qualquer forma de igualar seria uma atrocidade e um desrespeito a individualidade, em um caminho sem volta para a mecanização dos processos e a igualdade forjada e irreal no judiciário brasiseiro.
Portanto, vale ressaltar que o que se busca não é indenizações incabíveis e descompensadas, nem tão pouco criar/alimentar uma fábrica de danos morais, mas sim chamar atenção ao temeroso risco que será criar uma lei que vise limitar tal proteção que foi conquistada com muito trabalho. Quanto vale ou meu, o seu, o nosso dano moral? Fica a dúvida!
* A autora é advogada e integrante do corpo jurídico da Popp & Nalin Sociedade de Advogados.
Gisele Bueno
Básica Assessoria de Imprensa
Contatos: (41) 3019-9092 / 3023-7385
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