O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, liberou para julgamento, nesta sexta-feira (14/10), o processo que ataca o Exame de Ordem. Na prática, isso significa que o presidente do tribunal, ministro Cezar Peluso, pode chamar quando quiser o recurso para que o plenário decida se a prova aplicada pela Ordem dos Advogados do Brasil é ou não constitucional.
Não há data para o julgamento do recurso. O ministro Peluso tem evitado colocar temas polêmicos ou que necessitam de quorum qualificado na pauta do plenário porque o STF vem julgando com apenas nove de seus 11 ministros. O tribunal está desfalcado por conta aposentadoria da ministra Ellen Gracie e pelo fato de o ministro Joaquim Barbosa, apesar de ter voltado ao trabalho depois da licença médica, ainda não estar participando dos julgamentos em plenário.
O recurso contra o Exame de Ordem foi impetrado pelo bacharel em Direito, João Antonio Volante, contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que julgou legítima a aplicação do Exame de Ordem pela OAB. Em julho, o Ministério Público Federal deu parecer afirmando que a exigência de aprovação no exame para que o bacharel em Direito possa se tornar advogado e exercer a profissão fere o direito fundamental à liberdade de trabalho, consagrado pela Constituição Federal de 1988.
O parecer foi assinado pelo subprocurador-geral da República Rodrigo Janot. Ele sustentou que a prova aplicada pela Ordem dos Advogados deve ser declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Para Janot, o Exame de Ordem cria uma restrição ilegal de acesso à profissão de advogado.
“O diploma é, por excelência, o comprovante de habilitação que se exige para o exercício das profissões liberais. O bacharel em Direito, após a conclusão do curso deverá, ao menos em tese, estar preparado para o exercício da advocacia e o título de bacharel atesta tal condição”, escreveu o subprocurador-geral da República.
No parecer, Janot atacou também o argumento de que o Exame de Ordem é necessário porque o advogado, apesar de profissional liberal, exerce função essencialmente pública. Logo, a prova é considerada uma espécie de concurso público para aferir a qualificação necessária para o desempenho da função. Os outros atores do sistema de Justiça, como juízes, membros do Ministério Público, defensores e advogados públicos, tem seu conhecimento aferido em concursos públicos para assumir suas funções. Logo, o advogado também deveria se submeter a um teste que verifique sua qualificação.
Integrantes da OAB afirmaram, na ocasião, que o parecer não seria definitivo e teria de ser submetido à aprovação do procurador-geral da República (PGR), Roberto Gurgel. Isso porque ele seria o único legitimado a atuar perante o STF. Mas de acordo com a Lei Orgânica do Ministério Público, ele pode delegar funções aos subprocuradores. Assim, o parecer de Janot foi anexado ao processo que tramita no Supremo.
Mas, em plenário, o PGR pode se manifestar de forma contrária à posição inicial da própria instituição. A independência funcional dos membros do Ministério Público permite que, mesmo depois do parecer da instituição, o procurador-geral, que é a pessoa habilitada legalmente a falar perante o plenário do Supremo, discorde do ponto de vista de seu colega.
A emissão do parecer foi seguida de uma boa polêmica. O advogado Almino Afonso Fernandes, integrante do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), afirmou à revista ConJur que o parecer contrário era “uma retaliação” à advocacia. O motivo, de acordo com o conselheiro, foram os dois votos que os representantes da Ordem no CNMP deram pela abertura de processo disciplinar contra Janot, pouco mais de um mês antes de ele dar sua opinião sobre a prova da OAB.
A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) saiu em defesa do procurador. Em nota, a ANPR afirmou que “refuta qualquer ataque de cunho pessoal à atuação funcional dos procuradores da República”. De acordo com a associação, “embora todo ato ministerial seja passível de análise, objeção ou contraponto — o que é próprio a um Estado Democrático de Direito —, tanto não deve jamais chegar ao raso expediente do palpite, da insinuação ou de outras ligeirezas”.
A discussão em torno da constitucionalidade do Exame de Ordem desperta paixões que extrapolam os limites das discussões jurídicas. Em audiência pública feita pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados em maio, líderes dos movimentos de bacharéis atacaram fortemente a OAB e disseram que a prova aplicada pela instituição é responsável por destruir famílias, mas pouco acrescentaram sob o ponto de vista jurídico.
Rodrigo Haidar é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico, 14 de outubro de 2011
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