As crianças estão especialmente protegidas no ordenamento jurídico nacional pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que dispõe em seus artigos 3º e 4º:
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.(grifos nossos)
No entanto, muitas vezes esses mandamentos são desrespeitados. As crianças podem ser submetidas a uma variedade de violências como física, psicológica, discriminatória ou também sofrer por conta de negligência ou maus-tratos. Outro ponto importante é o local onde se pratica a violência, normalmente em casa ou na escola. Em relação ao último, já destacamos as práticas de bullying, nesse sentido temos a recente decisão de um juiz da 27ª Vara Cível de Belo Horizonte que condenou um aluno de 7ª série ao pagamento de indenização de R$8.000,00 por danos morais a uma colega de classe.
A questão é ainda mais tormentosa quando a violência é praticada em âmbito familiar, tendo em vista que em casa a criança deveria se sentir segura e protegida pelos pais ou responsáveis. Nas últimas semanas temos observado inúmeros casos de violência intrafamiliar, a começar pelo episódio carioca, em que uma procuradora aposentada foi acusada de torturar uma menina de 2 anos. Vera Lúcia Gomes pretendia adotar a garota que ficou 29 dias sob seus cuidados. Além de agressões físicas, como o inchaço na região dos olhos e hematomas espalhados pelo corpo, a criança também foi submetida à violência psicológica, pois era constantemente ofendida. Devido a uma denúncia anônima a criança foi retirada da casa da procuradora, passou 3 dias hospitalizada e voltou ao abrigo onde vivia, mas ainda se assusta e evita o contato com desconhecidos. Nesse caso emblemático, além da violência, também devemos atentar para a questão da adoção, do perfil psicológico do adotante e do animus de constituir família.
Nos muitos episódios de violência contra a criança recentemente divulgados devemos notar que a violência contra a criança não está jungida a um determinado local ou classe social. Trata-se de um problema estrutural que deve ser combatido por meio da implementação de políticas públicas que garantam a efetividade dos preceitos contidos no ECA.
Sobre os efeitos da violência contra a criança, a Diretora Executiva da UNICEF, Ann Veneman, explica: “A violência tem consequências duradouras não apenas paras as crianças e seus familiares, mas também para as comunidades e países”. Estudos da UNICEF apontam que o desenvolvimento da criança, sua capacidade de aprendizagem e saúde ficam comprometidos depois de serem vítimas de atos violentos.
Por fim, ressaltamos a importância de um tratamento especial para a criança ou adolescente vitimado, porque nosso sistema jurídico impõe a repetição da versão sustentada por até de 9 vezes, já que diversas autoridades públicas, como os conselheiros tutelares, o juiz, o assistente social devem ouvir os relatos da criança. Tendo em vista o desgaste da criança ao contar por tantas vezes uma experiência traumática, o Tribunal de Justiça de São Paulo deve iniciar em junho a aplicação do método alcunhado “Justiça sem dor”. O procedimento consiste na tomada de um depoimento único, que pode ser dado em uma sala especial acompanhado de psicólogos ou assistentes sociais. As partes, juiz, acusador e defesa poderão acompanhá-lo por um monitor de TV na sala de audiência, intervenções podem ser feitas por meio do ponto eletrônico usado pelo acompanhante/ entrevistador da criança.
Sala especial para depoimento das crianças. Fonte: Folha de São Paulo
(CG)
Nenhum comentário:
Postar um comentário