terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Temas importantes vistos de um lado só


Os vinte e cinco quilômetros de cabos pelo chão entregavam: era preciso garantir conexão para todo mundo. E, em uma festa em que uma das principais atrações foi a banda de 10 GB e suas possibilidades de download e compartilhamento, discutir pirataria, direitos autorais e universalização do acesso era quase obrigatório - como uma contrapartida social.

"O direito penal não consegue segurar essa galera toda. Eu vou falar para eles não baixarem alguma coisa?", provocou Túlio Vianna, professor-adjunto da Faculdade de Direito Penal da UFMG, que participou de um dos debates no espaço ‘político’ do evento.

Na prática, o que se viu foi uma reunião de personalidades em torno de várias ideias em comum: a reforma na legislação de direitos autorais, a universalização da banda larga, a garantia da liberdade aos internautas e outras bandeiras que dificilmente o público que ligou seus laptops ao extenso cabeamento discordaria.

Pelos corredores, encontravam-se membros do governo - especialmente dos ministérios da Cultura e da Justiça. Quem acompanha um pouco as discussões sobre liberdade na rede identificaria vários rostos conhecidos: Sérgio Amadeu, diretor de conteúdo do evento, deixou sua marca. A turma do Fórum Brasileiro de Cultura Digital estava toda lá - e foi a responsável por organizar o espaço dos debates, o Campus Fórum.

Turma que, aliás, reuniu Lawrence Lessig e Gilberto Gil na quinta-feira em uma festa Casa de Cultura Digital, o casarão no centro de São Paulo que serve de sede para o grupo. Muitas ideias foram trocadas, muitos pensadores da cultura digital estiveram juntos. Esse é, sem dúvida, um mérito da festa.

Mas poucas ideias foram além das já discutidas exaustivamente em eventos como o Fórum Brasileiro de Cultura Digital. Afinal, a turma era a mesma.

Uma das poucas vozes discordantes era o advogado Marcio Gonçalves, que trabalha há 15 anos contra a pirataria e disse nunca ter baixado nada. Não à toa, o debate em que ele estava presente foi o mais polêmico e longo de quarta-feira - estourou os 35 minutos de duração.

A moderadora precisou até pedir "por favor" para que as pessoas parassem de fazer perguntas - a maioria desafiando, com razão, os conceitos de proteção ao autor do advogado. Sobraram ataques ao "jabá" que supostamente alguns produtores pagariam por suas bandas, e à "indústria", colocada como a instituição que abocanha os direitos autorais que deveriam ser dos autores. Não havia, porém, nenhum ponto de vista do outro lado.

É preciso reconhecer: a organização do evento se esforçou para levar conteúdo para as palestras. Seria muito divertido criar um evento de tecnologia focado em gadgets, games e downloads. Mas Marcelo Branco e Sérgio Amadeu conseguiram reunir um time de peso para discutir os temas mais pertinentes em relação às mudanças políticas que são necessárias para acompanhar a tecnologia. Só faltou isso: representantes ‘do lado de lá’, ou ‘da torcida contrária’, como se autodefiniu o advogado antipirataria Marcio Gonçalves. Poderiam surgir daí, quem sabe, conclusões, formulações concretas e talvez até novos modelos de negócio para uma área que precisa com urgência de uma revisão.



Estadão. domingo, 31 de janeiro de 2010 

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