segunda-feira, 21 de abril de 2008

Vestibular - Quando a família pressiona demais

Ajudar o jovem na escolha da profissão é benéfico; o problema surge quando pais tentam empurrar os filhos para uma determinada carreira – a mesma que eles seguem, ou para compensar desejos não realizados.

É um momento decisivo. Antes de fazer o vestibular, o estudante deve escolher a profissão que vai seguir – se não para o resto da vida, pelo menos por um bom tempo. Isso já é motivo de muito estresse. Ainda mais quando o vestibulando já está indeciso entre as inúmeras possibilidades à sua frente. Ao perceber isso, a família, sempre solícita, tenta ajudar, mas esse auxílio pode acabar mal. Muitas vezes, mesmo que de forma inconsciente e velada, os familiares dificultam a escolha da carreira.

“Para o estudante é um período muito difícil e, às vezes, mesmo ele não nota a pressão dos pais. Ele não tem a noção do quanto aquilo está direcionando sua escolha”, explica Eloá Andreassa, psicóloga e orientadora vocacional da Clínica Vale do Sol. “É preciso viver o momento da indecisão. Isso é normal. Os vestibulandos são muito novos para decidir a vida”, completa.

No entanto, é preciso enfatizar, pais, irmãos e parentes não são vilões. Na maior parte das vezes, tudo o que querem é garantir o melhor futuro para seus filhos. Quando efetivamente pressionam para que o vestibulando siga um determinado caminho, que pode não ser o certo, muito tempo e investimento – inclusive financeiro – acaba desperdiçado. Pior, afirma Eloá, no futuro o estudante pode vir a ser um profissional frustrado. “O pai que está pressionando às vezes não percebe que o faz. Quando a torcida dele é muito forte, e o filho está muito perdido, isso pode ser um sinal”, diz a psicóloga.

Marcos de Oliveira, 19 anos, passou por uma situação parecida. Antes do primeiro vestibular já sabia o que queria: ser piloto de caça na Aeronáutica. Para isso, teria de ingressar na Academia da Força Aérea Brasileira (AFA). Seu pai, Nozor de Oliveira Júnior, que é produtor rural no Mato Grosso do Sul, sempre quis fazer Direito e gostaria que Marcos seguisse essa profissão. “Mas ele não tinha nada de advogado”, admite. Marcos chegou a fazer o teste para a AFA, mas não passou. “Para não perder tempo, escolhi fazer uma outra faculdade”, diz Marcos. No entanto, os pais perceberam que ele não estava feliz. “Ele estava muito deprimido”, diz Leni Bergamo de Oliveira, a mãe. Uma semana antes das aulas, propuseram que Marcos viesse para Curitiba fazer preparatório para a AFA em um cursinho especializado. Ele aceitou de imediato, o que envolveu também uma dolorosa separação. “Esse é um momento em que, para ajudar, temos de pensar com a cabeça, e não com o coração”, diz Leni.

Influência

Nem toda influência dos familiares é ruim. É natural que as pessoas sejam influenciadas por outras pessoas, opiniões e organizações, e no vestibular não seria diferente. Mas certos desejos são resistentes. Caroline Stadler Correa, 19 anos, está cursando o primeiro ano de Direito, mas queria fazer Arquitetura. Ela chegou a assistir às primeiras aulas do curso preferido em uma faculdade particular, mas não pôde prosseguir em razão do preço. “Acontece que tenho dois irmãos e duas cunhadas que são advogados. Se não fosse eles nunca teria pensado no Direito”, diz.

Ela conta que os irmãos davam livros, conversavam sobre a profissão e isso acabou influenciando na sua segunda escolha. “Mas eu ainda não desisti do que eu quero. Estou pensando em fazer o vestibular para a Federal novamente”, explica. “Se ela fizer Direito, terá subsídios também para atuar juntamente com outras áreas. E, se passar em Arquitetura, seria interessante até fazer os dois cursos para ser uma profissional diferenciada”, diz Alexandre Stadler Correa, 30 anos, irmão de Caroline.

As indicações de Eloá para evitar problemas relacionados à pressão sobre os vestibulandos envolvem principalmente o diálogo. “Se a dúvida persistir, eu recomendo adiar a escolha, adiar o vestibular. Assim os jovens podem ficar preparados para escolhas próprias e mais maduras”, diz.

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Interatividade

Você já foi pressionado pela família para seguir uma determinada carreira?




Paz em casa

Dicas para a escolha profissional não virar motivo de discussão

Para os pais

- Conversem. O diálogo ainda é a melhor forma de conhecer os desejos dos vestibulandos.

- Ajudem na pesquisa. É possível dar orientações na pesquisa de cursos e áreas de interesse sugerindo fontes e materiais relevantes.

- Visitem a faculdade. Visitas às instituições e feiras de cursos podem ajudar no processo de orientação.

- Tragam notícias. Informações sobre o que acontece no dia-a-dia da área de atuação que se pretende seguir podem dar subsídios para uma melhor escolha.

- Facilitem o contato com profissionais. Falar com profissionais que já atuam no mercado de trabalho ajuda o vestibulando a ter uma melhor visão sobre a realidade da profissão.

- Observem. Muitas vezes os vestibulandos não têm consciência das aptidões que possuem. Realcem a possibilidade de seguir profissões que envolvam essas capacidades.

Para o vestibulando

- Não se pressione. A indecisão é normal e até necessária nessa fase da vida.

- Cheque a fonte. Veja quem está indicando o quê. Pessoas tendem a indicar aquilo de que gostam, mas a escolha final é sua.

- Use seu tempo. Se não estiver seguro da escolha, adie o vestibular. Uma escolha mais madura pode ser mais efetiva.

Fonte: Eloá Andreassa, psicóloga.


Gazeta do Povo, 21/04/2008.

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