quinta-feira, 10 de abril de 2008

Presunção de inocência - Nem lei, nem juiz podem impor execução antecipada da pena

Nem lei, nem qualquer decisão judicial, podem impor ao réu alguma sanção antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. A não ser que o julgador seja um desafeto da Constituição Federal. Caso contrário, não se admite qualquer entendimento contrário ao inciso LVII do artigo 5º da Carta Magna, que estabelece o princípio da presunção de inocência.

O entendimento foi usado pelo ministro Eros Grau para garantir a liberdade de um fazendeiro condenado a sete anos e seis meses de reclusão por homicídio. O ministro foi o relator do pedido de Habeas Corpus (HC 84.078) que discute se é possível a execução de sentença condenatória enquanto ainda estiver pendente de julgamento recursos que não têm efeito suspensivo. São cinco Habeas Corpus sobre o tema. Todos deveriam ser analisados nesta quarta-feira (9/4) pelo Plenário do STF.

Eros Grau foi o primeiro e único ministro a se pronunciar sobre o tema. Depois do voto de Eros Grau, Menezes Direito pediu vista dos autos por afirmar que há precedentes da 1ª Turma do STF contrários ao entendimento de Eros Grau (HC 90.645). A manobra acabou fazendo com que as outras quatro ações também tivessem seus julgamentos adiados.

O ministro Eros Grau afirmou, enfaticamente, que é proibida a execução da pena antes do fim do processo. “Quem lê o texto constitucional em juízo perfeito sabe que a Constituição assegura que nem a lei, nem qualquer decisão judicial imponham ao réu alguma sanção antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Não me parece possível, salvo se for negado préstimo à Constituição, qualquer conclusão adversa ao que dispõe o inciso LVII do seu artigo 5º”, afirmou.

O ministro ainda afirmou que tirar do Recurso Especial e Recurso Extraordinário o efeito suspensivo é criar uma política criminal “vigorosamente repreensiva”. “Essa desenfreada vocação à substituição de Justiça por vingança denuncia aquela que em outra ocasião referi como ‘estirpe dos torpes delinqüentes enrustidos que, impunemente, sentam à nossa mesa, como se fossem homens de bem’”, observou.

Em seu voto em favor da liberdade do réu, enquanto sua sentença condenatória não tiver transitado em julgado, o ministro Eros Grau criticou a Lei 8.038/90 (que dispõe que Recurso Extraordinário e o Recurso Especial não têm caráter suspensivo), taxando-a de reacionária e criticou, também, o impulso punitivo que motivou a edição desta e de outras normas legais.

Ele defendeu a isonomia de tratamento para quem está ameaçado de ter restringida a sua liberdade com os casos de ameaça de restrição de direitos, sustentando que, neste segundo caso, menos grave que o primeiro, nunca a sentença é executada antes do seu trânsito em julgado. “E, se esta é vedada antes do trânsito em julgado, com muito mais razão o deve ser a privativa de liberdade antes da condenação definitiva”, sustentou.

Neste contexto, ele criticou a atitude da imprensa, “que lincha e considera culpados a todos, até prova em contrário”, numa inversão de princípios. “É preciso cuidado nos momentos de desvario, sob pena de retornarmos ao ‘olho por olho, dente por dente’”, advertiu.

Para Eros Grau, se não for respeitado o princípio da presunção prescrito pela Constituição, “é melhor sairmos com um porrete na mão, a arrebentar a espinha de quem nos contrariar”. Para Eros Grau, “a prisão só pode ser decretada a título cautelar, nos casos de prisão em flagrante, prisão temporária ou preventiva”.

Este pedido de Habeas Corpus chegou ao STF em março de 2004, tendo como relator o ministro Nelson Jobim que, inicialmente, negou a liminar. Depois, voltou atrás para concedê-la. A decisão inicial foi tomada ante a informação de que o agricultor estaria fazendo leilão de gado leiteiro e máquinas agrícolas, o que indicaria seu intuito de fugir para não cumprir pena. Entretanto, investimentos posteriores mostraram que ele apenas mudou de ramo de negócio, mantendo sua antiga residência. Ainda em 2004, Eros Grau substituiu Jobim na relatoria do processo.

HC 84.078



Revista Consultor Jurídico, 9 de abril de 2008

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