terça-feira, 29 de abril de 2008

A infância ameaçada

A constatação feita pelo Ministério da Saúde de que a cada dois dias cinco crianças de até 14 anos morrem no país vítimas de agressão dá uma dimensão assustadora das proporções assumidas pela violência contra a infância, que o caso Isabella Nardoni expôs de forma mais explícita. O levantamento indica que, a cada 10 horas, uma criança é assassinada no Brasil. E, o que é mais preocupante, a imensa maioria dos casos de agressão ocorre dentro da própria casa e é praticada por familiares, quase todos eles adultos. O problema não constitui uma exclusividade nacional e tem causas múltiplas, o que torna seu enfrentamento mais complexo, mas - felizmente - não impossível.

Uma das tentativas de romper o silêncio que costuma cercar os desvios no trato com meninas e meninos é o Disque 101, que recebe em média cerca de 90 denúncias diárias em todo o país. O problema é que, diante de episódios de negligência e violência física e psicológica, as testemunhas, em grande parte familiares adultos, se calam, por medo ou simplesmente por omissão. Sem condições de se defender e muito menos de denunciar, a própria vítima acaba comumente se resignando. Esse círculo pernicioso precisa ser rompido, e não se calar diante dos abusos já é um gesto concreto na luta contra essa chaga.

Mesmo quando as marcas de violência física são evidentes e, inclusive, nos casos em que os maus-tratos levam à morte, os responsáveis nem sempre são punidos. A própria Organização das Nações Unidas (ONU) adverte que poucos países têm regras claras para proteger a integridade física e psicológica de crianças no lar ou em entidades como orfanatos, o que ajuda a explicar a sua excessiva vulnerabilidade.

A necessidade de respeito aos direitos das crianças, entre os quais o de se ver longe da violência dos adultos, exige maior atenção das instituições. Mas é dentro de casa, sobretudo, que a mudança precisa ocorrer, e já, para que uma parcela cada vez maior da infância possa ser preservada.


Zero Hora, 29/04/2008.

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