domingo, 13 de abril de 2008

CASTRAÇÃO QUÍMICA - Fechando o cerco contra a pedofilia

Tratamento injeta hormônios femininos para ajudar a diminuir o impulso sexual de abusadores. Mas já causa polêmica.

Mais de 267 mil denúncias de pedofilia na internet foram registradas em 2007, segundo a ONG SaferNet Brasil. Já o Disque Denúncia aponta 104.871 registros de violência contra crianças e adolescentes nos últimos cinco anos, sendo 14.279 de abuso sexual, uma média de 92 denúncias por dia. Na tentativa de reduzir esses números, o Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina do ABC, em Santo André (SP), aprovou projeto de pesquisa sobre o uso de medicamentos em pedófilos, a chamada ''castração química''.

Apesar de polêmico, o psiquiatra Danilo Baltieri, doutor pela USP admite já aplicar o tratamento em abusadores sexuais, desde que haja consentimento. O Congresso também tem proposições para discutir o assunto.

O pediatra e terapeuta familiar Renato Mikio Moriya é especialista em Violência Doméstica contra a Criança e Adolescente e participa da Rede de Proteção às Crianças e Adolescentes em Situação de Violência. Em entrevista à FOLHA, ele explica como funciona o tratamento e alerta: ''Antes se dizia para ter cuidado com estranhos, com pessoas mal vestidas mas os pedófilos são indivíduos aparentemente normais, são sedutores, simpáticos, que conseguem cativar e aliciar a criança''.

Quem pode ser definido como pedófilo?

São duas situações. Tem o preferencial, que seria o pedófilo e que tem o desejo sexual focado em crianças. São elementos que muitas vezes têm uma comorbidade com a psicopatia, que tem a ver com alteração da estrutura cerebral. São os psicopatas que não aguentam frustração, que não sentem culpa. E temos o situacional ou circunstancial, que em decorrência de oportunidade ou porque quer vingar de alguma coisa, abusa do próprio filho, por exemplo.

O que é a castração química?

É a administração de hormônios femininos através de injeções para ajudar a diminuir o impulso sexual.

É um processo reversível?

Sim, na medida em que a pessoa pára de tomar o medicamento, ele volta a ter seu impulso sexual normalizado.

O senhor acha que esse tratamento resolve, já que é um distúrbio psíquico?

Esse assunto é polêmico e precisa ser amplamente discutido. Porém, se encararmos a inexistência de uma proposta mais definitiva e respaldado pelas pesquisas internacionais que revelam eficiência entre 30% e 75% dos pacientes, analiso esta proposta como uma opção viável para ser utilizada como alternativa à prisão ou desconto da pena, naturalmente com o consentimento por escrito do condenado ou familiares. Devemos lembrar que este tratamento não prescinde do acompanhado psicológico compulsório. Além disso, pensando na proteção das crianças e adolescentes (sete crianças ou adolescentes sofrem abuso sexual por hora no Brasil), devemos continuar investindo na caça aos pedófilos pela internet, agilizar os processos criminais, moralizar o sistema penitenciário, acompanhar o cumprimento das penas com rigor técnico-científico e ofertar tratamento psiquiátrico aos pedófilos. A castração química não impede que continue fazendo mal, ele não pode usar o pênis, mas vai ter outros métodos.

O senhor tem conhecimento desse tratamento em outros países? Quais os resultados?

A castração já vem sendo usada na Itália, Suécia, em alguns estados nos Estados Unidos, como Montana. Muitos falam que tem resultados, 70% de efetividade. Nos Estados Unidos, o indivíduo que for penalizado cumpre um tempo de pena e a partir daí tem opção de continuar preso ou sofrer a castração química.

Aumentou o número de pedófilos ou aumentou o número de denúncias?

As duas coisas. Na medida em que a sociedade está mais sensibilizada, a mídia está trazendo à tona essas questões e a população fica mais atenta. Muitos dos pedófilos hoje foram abusados no seu passado. Nem todos os que foram abusados se tornam abusadores, mas todos os que abusam hoje tiveram alguma experiência.

A partir do momento que você sofreu uma violência, o lógico não seria repudiar esse comportamento e não repetir?

É muito forte o padrão. Tem possibilidade de alguns que têm resiliência quererem ser totalmente diferentes, mas a grande maioria repete o padrão.

Quais os sinais que as crianças dão de que estão sofrendo abuso?

Mudanças de comportamento em geral, como a criança que vai bem na escola e depois passa a ir mal, a criança que tem depressão, que ficou mais agressiva, que tem alteração do sono, passou a comer demais ou de menos. Também pode se sentar de maneira diferente na cadeira porque tem lesão genital. A criança que foge da casa ou da escola, que foge de exame médico da escola, que independente do calor usa roupas para esconder o corpo que ela sente como impuro. Crianças que tem muito medo de um adulto, que começam a ter o descontrole de xixi fora da idade.


Folha de Londrina, 13/04/2008.

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