segunda-feira, 14 de abril de 2008

Bebê filha de mãe com síndrome de Down e pai com atraso mental não consegue ser registrada

SÃO PAULO - A pequena Valentina é fruto de uma história de amor incomum. A mãe, Maria Gabriela Andrade Damate, de 27 anos, é portadora da síndrome de Down. O pai é Fábio Marcheti de Moraes, de 28 anos, que em razão de complicações no parto tem um atraso mental. O nascimento saudável da menina, há 23 dias, ganhou registro na imprensa de todo o país. Só ainda não foi lavrado no livro das certidões do Cartório de Registro Civil da cidade de Socorro, a 135 quilômetros da capital.

O cartório recusou-se a registrar a criança no nome do pai, alegando que Fábio não consegue declarar a paternidade.

- Ele não sabe dizer o nome dele completo, nem onde mora - explicou uma funcionária do cartório, que se negou a dizer seu nome à reportagem do jornal Diário de S.Paulo.

Deste modo, Valentina deveria ser registrada apenas com o nome da mãe e com paternidade não declarada. Em seguida, a família deveria ingressar com uma ação de investigação de paternidade.

- Não aceito isso. É um caso inédito, mas o Brasil inteiro conhece a história deles. É o direito de Valentina. É preconceito. Falta inclusão - disse a mãe de Gabriela, Laurinda Ferreira de Andrade, de 51 anos, informando que, por isso, a neta ainda não tem plano de saúde.

O promotor de Socorro, Elias Francisco Chaib, informou que o Ministério Público irá ingressar com um procedimento na Vara da Infância e Juventude para que se registre o nascimento de Valentina.

- Vamos ouvir os pais e os avós da Valentina. E se Fábio conseguir declarar que é o pai, não será necessário nem a realização do exame do DNA - disse.
Bem-vinda

No dia em que Valentina deveria ganhar uma certidão de nascimento, pais, avós e tios foram ao cartório com câmeras fotográficas na mão para registrar o momento. Eles sabem que a mais nova integrante da família é para lá de especial.

Casos de filhos de mães com síndrome de Down são raros. Segundo o médico geneticista Walter Pinto Júnior, professor titular de genética da Unicamp, são menos de 50 relatados do mundo. Entretanto, não por conta da deficiência, mas porque relacionamentos como o de Gabriela e Fábio não são comuns.

- São poucas as meninas com Down que se casam. Muitas famílias não aceitam que elas tenham relacionamento. O caso desta família é realmente especial - diz o médico, que acompanhou Gabriela e se dispôs a fazer o exame do DNA para que Fábio comprove a paternidade de Valentina.

Segundo o professor, uma portadora da síndrome de Down tem 85% de chance de ter um filho saudável. Já os homens com síndrome são estéreis.

A gravidez de Gabriela foi descoberta aos seis meses. Mas antes mesmo de saber que Valentina viria ao mundo sem nenhuma deficiência, as duas famílias se apressaram em comemorar a chegada da bebê.

- Estávamos angustiados porque não imaginávamos que isso poderia acontecer. Mas depois decidimos que independentemente de como a Valentina viesse seria bem-vinda. Agora, o único problema dela é ser mimada - diz Laurinda.


O Globo, 14/04/2008.

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