terça-feira, 15 de abril de 2008

Artigo: O acordo de leniência no direito penal

Guilherme Rodrigues Abrão

Advogado Criminalista/RS
Especialista em Ciências Criminais pela Rede de Ensino Luiz Flavio Gomes / UNAMA
Pós-graduando em Direito Penal Empresarial pela PUC/RS


Sumário: Introdução; 1 A criminalidade moderna; 2 A criminalidade econômica e a Ordem Econômica; 3 O sistema brasileiro de defesa da concorrência; 4 O acordo de leniência; 4.1 Características gerais do acordo de leniência: caráter administrativo e caráter penal; 4.2 O acordo de leniência penal; Considerações Finais; Referências.

Introdução

Inegavelmente a ordem econômica é tutelada não somente pela via do direito administrativo / civil, mas também pela via do direito penal, consoante é possível verificar-se a partir da produção legislativa brasileira (como por exemplo: lei dos crimes contra o sistema financeiro nacional; lei de lavagem de capitais; lei dos crimes contra a ordem tributária, econômica e relações de consumo; código de defesa do consumidor).

Note-se que do próprio texto constitucional já se percebe a preocupação do legislador pátrio no tocante à repressão ao abuso do poder econômico, consoante dispõe expressamente o artigo 173, § 4º da Constituição Federal de 88:

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
...
§ 4º A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

Assim, como um instrumento visando não só coibir, mas também a auxiliar na investigação e repressão a condutas atentatórias à ordem econômica mediante abuso do poder econômico, especialmente na repressão a formação de cartéis[2], a lei nº 10.149/2000 alterou e acrescentou dispositivos à lei nº 8.884/94, criando o instituto do acordo de leniência, conforme a então nova redação do artigo 35-B da lei nº 8.884/94.

Desta forma, cabe verificar qual o papel e os reflexos jurídicos da celebração do acordo de leniência na seara penal, posto que diante da ineficácia dos demais instrumentos de repressão ao abuso do poder econômico e ordem econômica o acordo de leniência se tornou senão o mais importante e eficaz, um dos, instrumentos para coibir práticas anticoncorrenciais e, por conseqüência, garantir a livre concorrência.

1 – A Criminalidade Moderna

Pode-se afirmar que a criminalidade econômica insere-se como um exemplo da criminalidade moderna[3]. Por certo que esta criminalidade moderna tem características próprias que se diferem da criminalidade clássica.

Na criminalidade clássica ou tradicional pode-se perceber que o número de vítimas é limitado e que podem as vítimas ser facilmente identificadas, até mesmo porque é comum o autor do fato-crime ter alguma relação com a vítima. Outra característica é a visibilidade dos delitos, uma vez que autor e vítima mantêm relação no curso do processo criminal, sendo mais fácil o reconhecimento de quem é ou de quem são as vítimas.

Cezar Roberto BITENCOURT leciona que a criminalidade clássica, por ele chamada de criminalidade de massa,

compreende assaltos, invasões de apartamento, furtos, estelionato, roubos e outros tipos de violência contra os mais fracos e oprimidos. Esta criminalidade afeta diretamente toda a coletividade, quer como vítimas reais quer como vítimas potenciais. Os efeitos desta forma de criminalidade são violentos e imediatos: não são apenas econômicos ou físicos, mas atingem o equilíbrio emocional da população e geram uma sensação de insegurança[4].

Ao contrário, a criminalidade moderna reveste-se de características que decorrem não só da evolução da sociedade (e aqui se inclui os problemas causados por esta evolução, como, por exemplo, o surgimento e crescimento de favelas, altos índices de analfabetismo, mortalidade infantil, etc.), bem como do avanço tecnológico pelo qual a sociedade passou a partir da Revolução Industrial (surgimento da máquina) e no período posterior à Segunda Guerra Mundial, além, claro, das próprias transformações econômicas vislumbradas no mundo, especialmente no tocante ao fenômeno da globalização.

Na criminalidade moderna pode-se vislumbrar o que se denomina de vitimização difusa ou a ausência de vítimas individuais. Por vitimização difusa entende-se que é a capacidade de determinado delito causar, prejudicar um número de vítimas elevado, ou seja, são delitos que atingem a coletividade, tornando assim muito difícil ou até mesmo impossível à determinação das vítimas.

Outra característica da criminalidade moderna é a chamada vitimização transnacional. Isto quer dizer que os crimes arrolados como crimes modernos possuem a capacidade de lesar, prejudicar e causar vítimas em diversos lugares e ao mesmo tempo. Assim, um único crime poderá lesar pessoas ou empresas em diferentes locais, países, regiões do planeta. Pode-se citar, por exemplo, os crimes contra o meio ambiente, os crimes de lavagem de dinheiro e colarinho branco, os crimes informáticos, os crimes contra a ordem tributária e econômica e os crimes que envolvem tráfico internacional de drogas.

Ademais, geralmente os danos causados por esses delitos são de difícil percepção, dificultando a visualização clara do delito a fim de que sejam os responsáveis devidamente punidos pelo poder judiciário.

Essa criminalidade moderna criou o que se denomina de criminoso moderno e que muitas vezes se utiliza da corrupção como meio principal para alcançar seus fins. Não raro vislumbra-se casos em que os criminosos operam na base da corrupção de autoridades dos mais variados níveis para assim conseguirem a concretização do ilícito. Desta forma, é possível verificar uma modificação no modus operandi dos delinqüentes.

Andrei SCHMIDT caracteriza a moderna criminalidade com base na

a) primazia do interesse de combater com celeridade e urgência os problemas mais amplamente difundidos pelos meios de comunicação e que, por isso, são sentidos pela opinião pública como mais ameaçadores; b) crescente emprego dos crimes de perigo abstrato, que prescindem, para a imposição de uma pena, dos requisitos do resultado, do nexo de causalidade e, até mesmo, da própria conduta; c) eliminação dos diversos graus da imputação jurídico-penal, tais como tentativa-consumação, autoria-participação; d) exasperação de penas cujo fim reveste-se, eminentemente, da prevenção geral negativa[5].

Diante destas características é inegável que muitas das práticas lesivas à ordem econômica, que se constituem por verdadeiro abuso do poder econômico, enquadram-se na modalidade de criminalidade moderna, como bem se percebe dos crimes elencados na lei nº 8.137/90, mais significativamente os elencados no capítulo II de referida Lei nos artigos 4º, 5º e 6º (crimes contra a ordem econômica).

2 – A Criminalidade Econômica e a Ordem Econômica

A criminalidade econômica é cada vez mais comum e isto se pode perceber com o advento de Leis Especiais que tipificam determinadas condutas. Visualiza-se o crescimento da criminalidade econômica em nosso ordenamento por meio da Lei nº 7.492/86 (Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional), Lei nº 8.137/90 (Lei dos Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e Relações de Consumo), Lei nº 9.613/98 (Lei de Lavagem de Capitais), Código de Defesa do Consumidor, etc.

Raúl CERVINI leciona que

el tema que nos convoca resulta a la vez extremadamente vasto y coplejo. La primera dificultad surge ya al momento de intentar un concepto minimamente desscriptivo y coherente de la macrocriminalidad económica que no se base en un mera apreciación cualitativa de ese fenómeno[6].

Quanto à definição de criminalidade econômica, importante destacar a lição de Francisco MUÑOZ CONDE:

El concepto de “delincuencia econômica” tiene, pues, que estar vinculado al de ‘delito económico’, que es, en definitiva, el único capaz de dar autonomía a la parte del Derecho y concretamente del Derecho Penal que de él se ocupa[7].

Como consabido, a ordem econômica não deixa de ser vista como um bem jurídico do qual a Constituição Federal se preocupou em proteger e estabelecer princípios gerais quanto à atividade econômica. Consoante o artigo 170 de nossa Constituição

A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios...

Da mesma forma, como já mencionado anteriormente, do próprio texto constitucional surge a preocupação do legislador em reprimir o abuso do poder econômico, ainda que não o faça taxativamente pela via penal, conforme artigo 173, § 4º da Constituição Federal.

Como bem relaciona Cezar Roberto BITENCOURT

para a proteção da chamada ordem econômica estrita – assim entendida aquele dirigida ou fiscalizada diretamente pelo Estado – foram criados os crimes fiscais, crimes monetários, crimes de contrabando, crimes de concorrência desleal, os chamados crimes falimentares. Mais recentemente, surgiram novas figuras delitivas como, por exemplo, grandes estelionatos, falsidades ideológicas, crimes contra as relações de consumo, monopólios irregulares, os escândalos financeiros e mesmo as grandes falências, com prejuízos incalculáveis...[8].

Por certo que as leis especiais que versam sobre a criminalidade econômica se preocupam com as condutas que eventualmente lesam a ordem econômica, instituindo, assim, uma sanção criminal quando a ordem econômica for lesada, muitas vezes em virtude de inegável abuso do poder econômico.

Portanto, essa feroz repressão do Estado contra condutas atentatórias à ordem econômica resultou no surgimento de um novo ramo do Direito Penal: Direito Penal Econômico.

Dessa forma, o Estado utiliza-se do Direito Penal não só a fim de estabelecer sanções criminais para os que cometam crimes contra a ordem econômica do país, mas também para a criação / adaptação de instrumentos de investigação que possam, de maneira efetiva, reprimir determinadas práticas anticoncorrenciais.

Sendo assim, ao se falar em Direito Penal Econômico se está intimamente atrelado a três grandezas, quais sejam: a) ordem econômica tida como bem jurídico e sofrendo proteção do Direito Penal; b) crimes econômicos e c) instrumentos de repressão a práticas anticoncorrenciais.

Acerca do Direito Penal Econômico, Raul PEÑA CABRERA leciona que

el Derecho Penal Económico ha experimentado en los últimos años un avance verdaderamente significativo en el estudio y aplicación de las teorías que tratan de explicar los múltiples y complejos connotaciones y la construcción de figuras legales (penales) en procura de resolver los conflictos y problemas que vienen surgiendo. En suma, el Derecho Penal Económico es un derecho interdisciplinario punitivo que protege el orden económico como ultima ratio, es decir, el último recurso ha utilizar por el Estado y luego de haber achado mano de todos los demás instrumentos de política económico o de control de que dispone, para una eficaz lucha contra las diversas formas de criminalidad econômica...[9].

Também BAJO FERNANDEZ afirma que

El derecho penal económico es un grado de dicha intervención estatal. Precisamente el grado más intenso de intervención del Estado en la economía utilizando su poder sancionador. La finalidad y la función del Derecho penal económico no son otra cosa que la sublimación de la finalidad y la función del intervencionismo estatal en la economía: cumplir lãs exigencias de una valoración diferente del imperativo de Justicia en orden a las relaciones sociales y econômicas. ... En definitiva, el Derecho penal económico es el conjunto de normas penales que garantizan el orden económico[10].

Inegável o desenvolvimento da criminalidade econômica, bem como do crescente avanço e modernização do Direito Penal Econômico quanto à criação de novos crimes econômicos e sua repressão[11]. Ocorre que este avanço e conseqüente inflação da legislação penal especial muitas vezes não reflete na melhor maneira de reprimir a criminalidade econômica, até mesmo pelas não raras vezes que princípios constitucionais basilares de um Estado Constitucional de Direito são flagrantemente desrespeitados.

Frente à dimensão dos danos materiais e até morais causados pelos crimes contra o sistema econômico / financeiro, o Estado busca cada vez mais, por meio do Direito Penal Econômico, sancionar condutas lesivas à Ordem Econômica e ao Sistema Financeiro Nacional.

Não se pretende dar uma definição exata do que representa o Direito Penal Econômico, face à forte discussão doutrinária acerca do tema, mas é importante que se tenha em conta sempre o caráter de proteção e intervencionismo do Estado na economia, para o fim de resguardar o bem-estar social e o desenvolvimento econômico do país, com base na livre iniciativa e livre concorrência.

Da mesma forma, tem-se a dificuldade em estabelecer o conceito de ordem econômica. Nesta linha Eros GRAU aduz que

Ainda que se oponha à ordem jurídica a ordem econômica, a última expressão é usada para referir uma parcela da ordem jurídica. Esta, então – tomada como sistema de princípios e regras jurídicas – compreenderia uma ordem pública, uma ordem privada, uma ordem econômica, uma ordem social.

A ambigüidade de todas essas expressões é de tal ordem – e uso aqui, propositadamente, o vocábulo ´ordem´ - que a operacionalização dos conceitos que designam é sempre tormentosa”[12].

Impende destacar, que sem prejuízo da responsabilidade penal (que nos casos de crimes contra a ordem econômica é estabelecida de acordo com a lei 8.137/90), a lei antitruste – lei nº 8.894/94 – estabelece em seus artigos 20 e 21 as infrações à ordem econômica passíveis de responsabilidade administrativa, conforme disposto na lei antitruste.

3 – O Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência

Antes de tratar especificamente sobre o acordo de leniência imperioso que se destaque breves apontamentos sobre o sistema brasileiro de defesa da concorrência (SBDC).

Tal sistema de proteção é formado pelas Secretaria de Direito Econômico (SDE), Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE) e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) e tem sua atuação / regulamentação de acordo com os dispositivos da lei nº 8.884/94.

A preocupação em estabelecer um efetivo sistema de defesa da concorrência está inequivocamente atrelado ao funcionamento saudável de um sistema competitivo de mercados, inclusive, com o objetivo de garantir maior eficiência econômica. Neste sentido o próprio Ministério da Justiça que traça diretrizes básicas acerca da proteção concorrencial estabelece que

Ao se assegurar a livre concorrência, garante-se não somente mais escolhas ao consumidor em caso de aumento excessivo de preços ou queda na qualidade, mas também se promove o desenvolvimento tecnológico e contribui-se para aumentar o bem-estar social, na medida em que as empresas terão incentivos para conquistar novos clientes e continuamente oferecer novos produtos e serviços diferenciados.

Note-se que a defesa da concorrência não se presta a proteger o concorrente individual, mas sim a coletividade, que se beneficia pela manutenção da competitividade dos mercados. Da mesma forma, não tem por objetivo imediato a proteção dos interesses dos consumidores, mas sim da livre concorrência e livre iniciativa, o que, porém, indiretamente, como visto, resulta em benefícios para os consumidores[13].

Assim, a Secretaria de Direito Econômico é órgão do Ministério da Justiça que tem como função primordial instruir os atos de concentração econômica, e, especialmente coordenar as investigações referentes a processos administrativos em que se verificam, em tese, infrações contra a ordem econômica a fim de auxiliar o julgamento dos processos administrativos pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). A própria lei nº 8.884/94 em seus artigos 13º e 14º dispõe acerca das atribuições da Secretaria de Direito Econômico, de onde se percebe que tal órgão possui atuação preventiva e repressiva.

Neste sentido, o artigo 30º da lei 8.884/94 estabelece que

A SDE promoverá averiguações preliminares, de ofício ou à vista de representação escrita e fundamentada de qualquer interessado, quando os indícios de infração à ordem econômica não forem suficientes para a instauração de processo administrativo.

Por seu turno, a Secretaria de Acompanhamento Econômico é órgão vinculado ao Ministério da Fazenda e tem como responsabilidade própria o acompanhamento dos atos de concentração econômica, no qual inserem-se a investigação de condutas lesivas à ordem econômica a fim de oferecimento de representação à Secretaria de Direito Econômico e a elaboração de pareceres econômicos com caráter opinativo em processos administrativos acerca de infrações anticoncorrenciais.

Enfim, pode-se dizer que a atuação da SDE e da Seae está intimamente ligada à atividade de desenvolvimento de políticas de repressão a cartéis, para tanto adotando práticas policiais de investigação e posteriormente sendo responsáveis pela formação do processo administrativo (recebimento e investigação da denúncia, bem como preparação do relatório para julgamento pelo CADE).

Destaca-se ainda que durante a fase investigatória a SDE ou a Seae, por intermédio da Advocacia-Geral da União poderão requerer ao Poder Judiciário expedição de mandados de busca e apreensão a fim de que a Polícia Federal possa realizar inspeção e apreensão de documentos, computadores, escutas telefônicas, interrogatórios, com o objetivo de instruir o processo administrativo, conforme disposto no artigo 35-A da lei antitruste[14].

Por fim, cabe ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), autarquia federal atrelada ao Ministério da Justiça – conforme disposto na lei 8.884/94 (artigo 3º ao 12º e 42º ao 51º) – o papel de orientação, fiscalização, prevenção e apuração de abusos do poder econômico. Assim, o CADE, na esfera administrativa, é a última instância responsável pela decisão final sobre supostas infrações à ordem econômica em matéria concorrencial, possuindo, assim, caráter preventivo (conforme artigo 54º e seguintes da lei nº 8.884/90), repressivo (reprimir as práticas anticoncorrenciais elencadas no artigo 20º da lei mencionada) e educativo (artigo 7º, inciso XVIII de referida lei).

Mister salientar que os processos em tramitação em referidos órgãos administrativos do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência são também (ou na prática, efetivamente, deveriam ser) regidos pelos princípios constitucionais aplicáveis aos processos judiciais.

Assim, aplica-se a tais processos administrativos o princípio constitucional do devido processo legal (artigo 5º, inciso LIV da CF/88) e, especialmente, o princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório (artigo 5º, inciso LV da Carta Magna), o qual dispõe que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Da mesma forma deve-se observar o respeito ao princípio constitucional da proibição de provas obtidas por meios ilícitos (artigo 5º, inciso LVI da CF/88); o princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII da CF/88), bem como a publicidade dos atos processuais (art. 5º, inciso LX da CF/88).

Assim, correto desde logo afirmar que o acordo de leniência é uma tentativa de, pela via jurídica, desmantelar organizações que deterioram o ambiente de livre competição entre os agentes de mercado. Mas a grande questão que surge é como ampliar esses mecanismos de controle, investigação e repressão sem ultrapassar a tênue linha do respeito às individualidades, ao sigilo e, acima de tudo, ao princípio da presunção de inocência[15].

Verifica-se, então, que o acordo de leniência é um instrumento direcionado a auxiliar na repressão de condutas atentatórias à ordem econômica por meio do abuso do poder econômico. Neste sentido DOTTI afirma que

O abuso do poder econômico, caracterizado pelo domínio dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros, é um fenômeno de agressão aos princípios que devem reger as práticas econômicas empenhadas na realização do bem comum e na satisfação das aspirações individuais. Nos países subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento, os monopólios, oligopólios, trusts e cartéis e o processo do dumping são realidades que contrastam com as proclamações otimistas colocadas em letras de forma pela Constituição[16].

4 – O Acordo de Leniência

A lei nº 8.884/94, com redação parcialmente modificada pela lei nº 10.149/00, conhecida como a lei de defesa da concorrência ou lei antitruste, versa acerca da prevenção e repressão a determinadas condutas lesivas a ordem econômica, sendo que é pautada pelos valores da liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa do consumidor e tem por finalidade precípua reprimir o abuso do poder econômico[17].

Leniência, conforme HOUAISS[18], significa que apresenta lenidade, suave, que ou o que suaviza, acalma, lenitivo, portanto, desde já dando a entender ser medida que atenua determinada penalidade a ser aplicada em casos de violação à ordem econômica.

O acordo de leniência, pouco difundido no direito brasileiro, tem origem no direito norte-americano, onde tal instituto já existe desde 1978, passando por significativos avanços, dentre os quais destaca-se o denominado Amnesty Program (criado pelo Departamento de Justiça dos EUA em 1993) a fim de que as empresas delatassem condutas criminosas e colaborassem com as investigações em troca de diminuição da pena aplicável ou até mesmo a extinção da ação punitiva. Por certo que o objetivo maior do Estado ao criar e propor o acordo de leniência consiste na busca por uma eficiente repressão ao abuso do poder econômico, especialmente no tocante a repressão aos cartéis.

No Brasil o acordo de leniência foi criado pela Medida Provisória nº 2.055 de 2000 (posteriormente convertida na lei nº 10.149/00) que além de alterar acabou por criar novos dispositivos a já existente lei antitruste – lei nº 8.884/94 – estabelecendo-se então um novo instrumento disponível aos órgãos de controle do sistema brasileiro de defesa da concorrência na repressão às infrações à ordem econômica.

O acordo de leniência, portanto, é um instrumento de política criminal que amplia os poderes de investigação dos órgãos responsáveis pela fiscalização do sistema brasileiro de defesa da concorrência (especialmente da Secretaria de Direito Econômico, pois é a autoridade competente para a celebração do acordo de leniência) a fim de que se permita ao agente infrator (pessoa física e / ou pessoa jurídica) auxiliar na investigação de maneira a prevenir ou reparar o dano causado por determinada conduta lesiva à ordem econômica, e, assim, ter a penalidade atenuada ou até mesmo obter a extinção da ação punitiva (no âmbito administrativo) e ainda obter a decretação da extinção da punibilidade de crime contra a ordem econômica (no âmbito penal).

LUIZ FLAVIO GOMES aduz que acordo de leniência (de brandura, suavidade ou doçura) é o acordo para colaborar efetivamente com as investigações de um crime contra a ordem econômica[19]. Para DAMÁSIO DE JESUS significa que, à colaboração do autor de infrações à ordem econômica, sejam administrativas ou penais, corresponde um tratamento suave, brando, da autoridade administrativa ou judicial[20].

Embora em muito o acordo de leniência se assemelhe ao instituto da delação premiada (regido de acordo com os artigos 13º, 14º e 15º da lei nº 9.807/99), ambos institutos não se confundem. O cerne de tal diferença encontra-se no fato de que a delação é, na maioria das vezes, apenas causa redutora da penalidade, enquanto em se tratando de acordo de leniência além de reduzir a penalidade é também causa de extinção da ação punitiva (no âmbito administrativo) e de extinção automática da punibilidade (no âmbito penal)[21].

4.1 – Características gerais do acordo de leniência: caráter administrativo e caráter penal

Desta forma, os artigos 35-B e 35-C da lei nº 8.884/94 regulam o instituto do acordo de leniência, podendo ser identificado do texto legal duas espécies de tal instituto: o acordo de leniência administrativo ou econômico-administrativo[22] (artigo 35-B) e o acordo de leniência penal (artigo 35-C), embora ambos guardem íntima relação como se demonstrará.

O artigo 35-B da lei nº 8.884/94 estabelece que

A União, por intermédio da SDE, poderá celebrar acordo de leniência, com a extinção da ação punitiva da administração pública ou a redução de um a dois terços da penalidade aplicável, nos termos deste artigo, com pessoas físicas e jurídicas que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo e que dessa colaboração resulte:

I – a identificação dos demais co-autores da infração; e

II – a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração noticiada ou sob investigação.

Desta forma verifica-se de plano que o acordo de leniência administrativo terá como conseqüência a extinção do processo administrativo ou a redução da pena aplicável ao caso tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica, uma vez que trata-se de responsabilidade administrativa, sendo que a conseqüência do acordo de leniência penal será diversa, como adiante se verá.

Ainda, percebe-se, que tanto para o acordo de leniência administrativo e para o acordo de leniência penal é fundamental que a colaboração seja efetiva e significativa, requerendo-se para tanto a identificação de demais participantes da infração e a obtenção de dados concretos que comprovem a infração à ordem econômica. Destaca-se que o momento oportuno para a realização do acordo de leniência será sempre em momento anterior (ao denunciar prática anticoncorrencial) ou durante a fase de investigação.

O §2º do artigo 35-B estabelece os requisitos fundamentais para a celebração do acordo de leniência administrativo e penal, quais sejam:

§2º O acordo de que trata o caput deste artigo somente poderá ser celebrado se preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:

I – a empresa ou pessoa física seja a primeira a se qualificar com respeito à infração noticiada ou sob investigação;

II – a empresa ou pessoa física cesse completamente seu envolvimento na infração noticiada ou sob investigação a partir da data de propositura do acordo;

III – a SDE não disponha de provas suficientes para assegurar a condenação da empresa ou pessoa física quando da propositura do acordo; e

IV – a empresa ou pessoa física confesse sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento.

Tais requisitos devem ser preenchidos cumulativamente a fim de que possa ser celebrado o acordo de leniência administrativo ou penal. Cabe destacar que embora preenchidos os requisitos elencados pelo §2º do artigo 35-B, a própria lei antitruste, em seu §1º impõe uma restrição a capacidade de celebrar o acordo de leniência que não rara vezes causa certos transtornos a pouca doutrina existente acerca do tema.

Em referido dispositivo o legislador estabelece que não poderá celebrar acordo de leniência as empresas ou pessoas físicas que tenham estado à frente da conduta tida como infracionária. Mas no que consistiria estar à frente de conduta infracionária?

A portaria nº 849 de 2000 do Ministério da Justiça estabelece que como tendo estado à frente da conduta infracionária a pessoa física ou jurídica que tenha promovido ou organizado a cooperação da infração, dirigido a atividade ou ainda que tenha coagido alguém a cometê-la. Mas de igual forma impende destacar que

...promover e organizar, como prescreve a portaria podem ainda ser expressões vagas, quando avaliado o caso concreto para verificar o preenchimento dos requisitos para a concessão do acordo de leniência. Resta saber quais seriam os limites ao poder decisório e organizacional dos agentes envolvidos no cartel para que não sejam considerados como estando à frente da conduta infracionária e assim possam ser beneficiários do instituto[23].

Destaca-se também, como já mencionado anteriormente, o órgão competente para a celebração do acordo de leniência é a Secretaria de Direito Econômico – SDE, e, portanto, conforme o §4º do artigo 35-B da lei 8.884/94 a celebração do acordo não fica sujeita à aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, competindo-lhe tão somente ao verificar o cumprimento do acordo operar a extinção da ação punitiva ou aplicar a redução da penalidade (incisos I e II do §4º do artigo 35-B).

De igual sorte merece atenção o artigo 35-B, §9º da lei em questão, uma vez que estabelece que a proposta do acordo de leniência será considerada sigilosa, mas poderá ser de conhecimento público no caso do interesse das investigações e do processo administrativo. Também, mister destacar que caso a proposta de acordo de leniência seja rejeitada pelo Secretário da SDE não haverá divulgação de tal proposta, bem como não será considerada como confissão quanto à matéria de fato e nem mesmo reconhecimento de ilicitude da conduta analisada, conforme disposto no artigo 35-B, §10º da lei antitruste.

4.2 – O acordo de leniência penal

O acordo de leniência de caráter penal está previsto especificamente no artigo 35-C da lei 8.884/94, o qual dispõe:

Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na lei nº 8.137, de 27 de novembro de 1990, a celebração de acordo de leniência, nos termos desta lei, determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia.

Em igualdade ao acordo de leniência de caráter administrativo, o acordo de leniência penal será firmado entre a Secretaria de Direito Econômico – SDE e o autor de crime contra a ordem econômica.

Destinando-se o acordo de leniência penal aos crimes contra a ordem econômica, é de se mencionar que somente as condutas delituosas previstas no capitulo II da lei nº 8.137/90, quais sejam os artigos 4º, 5º e 6º, é que podem ensejar a celebração do acordo de leniência.

Indubitavelmente, de acordo com o texto legal percebe-se que os efeitos da celebração do acordo de leniência penal são claros, posto que suspende o curso da prescrição (é, portanto, causa de suspensão da prescrição) e ainda impede o oferecimento de denúncia por parte do Ministério Público, o que faz com que surja neste ponto notória divergência.

Note-se que os crimes contra a ordem econômica, tipificados nos artigos 4º, 5º e 6º da lei nº 8.137/90 são de ação penal pública incondicionada, portanto, submetidos ao princípio da indisponibilidade da ação penal pública e obrigatoriedade da ação penal.

Portanto, deverá (ou ao menos deveria) o Ministério Público ser consultado pela SDE (a requerimento feito pela parte proponente) a fim de que se manifeste acerca do enquadramento nas formas do acordo de leniência (ou até mesmo para avaliar delação premiada), o que faz com que muitas vezes isto acabe servindo como um desestímulo à elaboração de denúncias de práticas anticoncorrenciais, posto que a parte denunciante só terá certeza da leniência na esfera administrativa, mas não terá a garantia da leniência na esfera penal.

A partir daí surgem diferentes posições acerca da posição do Ministério Público na celebração de acordos de leniência:

Uma posição entende que a Secretaria de Direito Econômico – SDE possui livre motivação e livre convencimento ao celebrar acordo de leniência com o agente infrator, e uma vez operado a celebração do acordo na esfera administrativa o Ministério Público estaria impedido de ajuizar a ação penal. Desta forma o Ministério Público para promover a ação penal ficaria adstrito somente às hipóteses em que não houvesse a celebração de acordo de leniência administrativo.

De outra sorte, pode-se entender que diante do princípio da indisponibilidade da ação penal pública o Ministério Público teria condições de propor a ação penal, mesmo que houvesse ocorrido a celebração do acordo de leniência firmado entre a SDE e o agente infrator no âmbito administrativo. Aqui reside a crítica a esta posição, uma vez que isto acabaria por fulminar com o instituto do acordo de leniência, desestimulando a denúncia de práticas lesivas a ordem econômica, posto que o agente não teria garantia da leniência penal.

E, ao que parece ser a posição mais adequada às próprias finalidades do instituto ora trabalhado, deverá o Ministério Público ser consultado ao se celebrar o acordo de leniência penal a fim de que com sua anuência seja posteriormente decretada a extinção da punibilidade do agente infrator. Assim, o Ministério Público ao participar da celebração do acordo de leniência dará mais suporte ao mesmo, bem como resultará de plano em renúncia à ação penal, sem maiores divergências futuras. Por certo que diante de tal situação haverá nítida mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal, mas que em tais casos (repressão à formação de cartéis) se apresenta como medida de extrema razoabilidade.

Como já dito o acordo de leniência administrativo em muito se assemelha ao de caráter penal, daí porque não há necessidade de se repetir às peculiaridades de tal instituto traçadas acima que também se aplicam ao acordo de leniência penal, especialmente no tocante aos seus pressupostos e requisitos para a celebração.

Mas, imperioso destaque acerca da conseqüência jurídica do acordo de leniência penal, haja vista a disposição do artigo 35-C, parágrafo único, o qual estabelece:

Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se a automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste artigo.

Assim, ao se verificar o cumprimento do acordo de leniência e, conforme afirmado anteriormente tendo participado da celebração o Ministério Público, deverá ser de plano extinta a punibilidade do agente infrator que pactuou o acordo de leniência em relação aos crimes contra a ordem econômica, sendo, portanto, a decisão judicial meramente declaratória.

Portanto, não há dúvidas de que ao se verificar o efetivo cumprimento do acordo de leniência deverá ser extinta a punibilidade do agente, sendo, portanto, o cumprimento do acordo inequívoca causa de extinção da punibilidade.

Considerações finais

Inegavelmente a ordem econômica é um bem jurídico fundamental, estando inclusive prevista a sua proteção no texto constitucional, mais precisamente no artigo 170 e artigo 173, §4º da Constituição de 1988. Assim, de acordo com a política criminal maximalista adotada pelo legislador pátrio, em completo distanciamento de um direito penal mínimo, chama-se à esfera penal para a repressão de condutas lesivas à ordem econômica.

Como se verifica, portanto, as condutas lesivas ao bom andamento da prática do livre mercado são tuteladas não somente pela lei antitruste (lei nº 8.884/94), mas também penalmente, de acordo com os crimes contra a ordem econômica, estabelecidos nos artigos 4º, 5º e 6º da lei nº 8.137/90.

E, para auxiliar na repressão a tais condutas, especialmente na repressão à formação de cartéis, é que criou-se um instituto muito pouco analisado no Direito Brasileiro, qual seja o acordo de leniência tanto no âmbito administrativo quanto no âmbito penal.

O acordo de leniência é na verdade um instrumento de que dispõe a Secretaria de Direito Econômico – SDE, posto que é órgão de fundamental importância para a defesa do sistema de concorrência, que permite a celebração de um acordo com o agente infrator (pessoa jurídica e / ou pessoa física) a fim de facilitar a investigação de condutas anticoncorrenciais, proporcionando ao agente infrator a extinção do processo administrativo, a redução da penalidade aplicável e até mesmo a extinção da punibilidade criminal.

Desta forma, tal instituto revela-se verdadeiro e constante estímulo a denúncias de práticas lesivas a ordem econômica por parte de empresas na tentativa de dominação do mercado, embora na prática seja rara sua constatação.

O primeiro e um dos únicos casos de celebração de acordo de leniência no Brasil deu-se no Rio Grande do Sul, no chamado cartel das empresas de vigilância, quando em 2003 uma das empresas participantes do cartel acabou por denunciar a prática infracionária à Secretaria de Direito Econômico, tendo celebrado o acordo com a anuência do Ministério Público Federal e do Ministério Público Estadual[24].

Conclui-se, então, que o acordo de leniência é um novo e eficiente instrumento de política criminal que auxilia os órgãos integrantes do sistema brasileiro de defesa da concorrência na repressão de condutas atentatórias à ordem econômica, especialmente na repressão à criação de cartéis, posto que permite ao agente infrator denunciar as práticas infracionárias sem que nenhuma penalidade lhe seja aplicada.

Referências

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[1] Advogado Criminalista. Especialista em Ciências Criminais pela Rede de Ensino Luiz Flavio Gomes / UNAMA. Pós-graduando em Direito Penal Empresarial pela PUC/RS.

[2] “A formação de cartel é o principal motivo de denúncias relacionadas à concorrência desleal. Este tipo de prática representa 50% do total de denúncias apresentadas à SDE – Secretaria de Direito Econômico, ligada ao Ministério da Justiça, e à Seae – Secretaria de Acompanhamento Econômico, ligada ao Ministério da Fazenda. A outra metade se refere, principalmente, a venda casada e tratamento diferenciado entre adquirentes” (Notícia veiculada na Revista Consultor Jurídico em 25 de maio de 2006: Concorrência desleal: cartel é a infração mais praticada pelas empresas. Acesso em 03/01/2008. http://conjur.estadao.br). No mesmo sentido: “Nas últimas semanas tem-se visto uma série de declarações do ministro da Justiça, Paulo de Tarso Ribeiro, sobre as medidas para tornar mais efetivo o combate aos cartéis no Brasil. Segundo anúncio da Secretaria de Direito Econômico (SDE), existem aproximadamente 260 investigações de cartéis em andamento no Brasil, envolvendo 30 setores diferentes da economia” (Notícia veiculada na Revista Consultor Jurídico em 06 de outubro de 2002: Mudança de rumo: Brasil segue tendência mundial de combate aos cartéis. Acesso em 03/01/2008. http://conjur.estadao.br).

[3] Cezar Roberto BITENCOURT aduz que “nessa histeria toda em busca de um Direito Penal do Terror fala-se abundantemente em criminalidade moderna, que abrangeria a criminalidade ambiental internacional, criminalidade industrial, tráfico internacional de drogas, comércio internacional de detritos, onde se incluiria a delinqüência econômica ou criminalidade de colarinho branco”. BITENCOURT, Cezar Roberto. Princípios garantistas e a delinqüência do colarinho branco. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, n. 11, 1995, p. 125.

[4] Ibid., p. 123.

[5] SCHMIDT, Andrei Zenkner. O princípio da legalidade penal no estado democrático de direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 341.

[6] CERVINI, Raúl. Macrociminalidad económica: apuntes para una aproximación metodológica. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, n. 11, p. 50, 1995.

[7] MUNÕZ CONDE, Francisco. Princípios politicocriminales que inspiran el tratamiento de los delitos contra el orden socioeconômico en el proyecto de código penal español de 1994. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, n. 11, p. 08, 1995.

[8] BITENCOURT, Cezar Roberto. Princípios garantistas e a delinqüência do colarinho branco. Op. cit., p. 126.

[9] PEÑA CABRERA, Raul. El bien juridico en los delitos econômicos (com referencia al codigo penal peruano). Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, n. 11, p. 11, 1995.

[10] BAJO FERNANDEZ, Miguel. El derecho penal económico: un estudio de Derecho positivo español. Anuario de derecho penal y ciencias penales. N. 3. p. 91/139.

[11] Atualmente podemos verificar a criação de Varas Criminais especializadas no combate a crimes econômicos em sede de Justiça Federal. Da mesma forma o avanço na criação do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, com a criação e ampliação das funções de órgãos como a Secretaria de Direito Econômico (SDE), Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) e Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE).

[12] GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988: interpretação e crítica. 5.ed. rev. atual. 2000, p. 43. Interessante o pensamento trazido por GRAU ao mencionar o pensamento de Vital Moreira: “As anotações de Vital Moreira são extremamente úteis: em um primeiro sentido, ´ordem econômica´ é o modo de ser empírico de uma determinada economia concreta; a expressão, aqui, é termo de um conceito de fato e não de um conceito normativo ou de valor (é conceito do mundo do ser, portanto); o que caracteriza é a circunstância de referir-se não a um conjunto de regras ou normas reguladoras de relações sociais, mas sim a uma relação entre fenômenos econômicos e materiais, ou seja, relação entre fatores econômicos concretos; conceito do mundo do ser, exprime a realidade de uma inerente articulação do econômico como fato; - em um segundo sentido, ´ordem econômica´ é expressão que designa o conjunto de todas as normas (ou regras de conduta), qualquer que seja a sua natureza (jurídica, religiosa, moral, etc.), que respeitam à regulação do comportamento dos sujeitos econômicos; é o sistema normativo (no sentido sociológico) da ação econômica; - em um terceiro sentido, ´ordem econômica´ significas ordem jurídica da economia. (pg. 49/50).

[13] Orientação divulgada pelo Ministério da Justiça acerca do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Disponível em www.mj.gov.br/sde. Acesso em 08/01/2008.

[14] Neste sentido: “PF E SDE vão combater juntas cartéis: convênio de cooperação entre dois órgãos para investigar o crime foi assinado ontem. A Secretaria de Direito Econômico (SDE) e a Polícia Federal (PF), ambos órgãos do Ministério da Justiça, vão aprofundar a parceria no combate aos cartéis – um crime contra a ordem econômica em que empresas se coordenam para evitar a concorrência e impor seus preços ao mercado. ... O objetivo...é agilizar os processos de investigação. A maior dificuldade no combate aos cartéis é obter provas do conluio entre as empresas. ... A partir do convênio, a secretaria poderá pedir que a PF, durante uma operação, recolha documentos que caracterizem o crime. ... O Convênio prevê ainda a criação de um Centro de Investigação de Cartel para coordenar a troca de informações e documentos entre os órgãos” Notícia veiculada em 27/12/2007 em www.fenapef.org.br. Acesso em 03/01/2008. Da mesma forma: “Em 2001 foi criado um grupo de trabalho, formado por representantes da SDE, da Polícia Federal e da SEAE, para discutir a viabilidade entre uma parceria entre a Polícia Federal e a SDE. O resultado foi a edição, em 2002, de uma lei que regulamentou a possibilidade de atuação da Polícia Federal no caso de investigação de cartel que tenha repercussão interestadual ou internacional. Dando seqüência a isso, a Polícia Federal anunciou que deverá criar uma delegacia especializada no combate aos cartéis e outros crimes contra a ordem econômica” Notícia veiculada na Revista Consultor Jurídico em 06 de outubro de 2002: Mudança de rumo: Brasil segue tendência mundial de combate aos cartéis. Acesso em 03/01/2008. http://conjur.estadao.br.

[15] VARGAS DOS SANTOS. André Maciel. O acordo de leniência e seus reflexos no direito penal. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10270 – acesso em 03/01/2008.

[16] DOTTI, René Ariel. O direito penal econômico e a proteção do consumidor. Revista de direito penal e criminologia. N. 33. janeiro-junho 1982. p. 139.

[17] Lei 8.884/94. Art. 1. Esta Lei dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico.

[18] Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa 2.0.

[19] GOMES, Luiz Flavio. Você sabe o que é, em Direito Penal, acordo de leniência? Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Disponível em www.ibccrim.org.br – acesso em 03/01/2008.

[20] JESUS, Damásio de. Acordo de leniência. São Paulo: Complexo Jurídico Damásio de Jesus, dez. de 2000. Disponível em www.damasio.com.br – acesso em 03/01/2008.

[21] Neste sentido Marcelo Ferreira de Camargo afirma que o acordo de leniência além de ser uma causa de redução de pena, é ainda causa de extinção da punibilidade, tendo como grande diferencial critérios de conveniência e oportunidade e uma conotação tipicamente política atribuída ao secretário da SDE/MJ. In O acordo de leniência no sistema jurídico brasileiro. Disponível em http://jus2.uol.com.br – acesso em 03/01/2008.

[22] Conforme denominação de Damásio de Jesus. Op. cit.

[23] VARGAS DOS SANTOS. André Maciel. O acordo de leniência e seus reflexos no direito penal. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10270 – acesso em 03/01/2008.

[24] Processo 08012001826/2003-10. Ementa: Processo administrativo. Cartel em serviços de vigilância privada para licitações no RS. Acordo de leniência. Provas concretas. Gravações telefônicas. Documentos apreendidos. Condenação das representadas e seus dirigentes. Penas de multa, proibição de licitar e contratar. Publicação em jornal. Benefícios do acordo concedidos. I – Processo administrativo para apurar a ocorrência de conluio entre empresas prestadoras de serviços de vigilância no Estado do Rio Grande do Sul, para atuar em licitações públicas e privadas. II – Empresa ANTARES e Srs. Rubem Oreli e Alexandre Luzardo celebraram com a União em 2003 o primeiro acordo de leniência do SBDC. III – Mercados relevantes: licitações de serviços de vigilância privada no Rio Grande do Sul bem como cada uma das licitações objeto de investigação. IV – Presença de características que propiciam a cartelização, como barreiras à entrada, número reduzido de agente, homogeneidade do serviço e presença de sindicatos. V – Processo administrativo regular. Assegurados contraditório e ampla defesa. Produção de provas regular. Ampla jurisprudência do STF e STJ. VI – As provas concretas de gravações telefônicas e documentos apreendidos em busca e apreensão comprovam cartel. VII – Empresas ofertavam seus serviços de modo concertado, combinando entre si quem ganharia cada licitação, praticando preços predatórios sempre que nova empresa tentasse desestabilizar o cartel e oferecendo seus serviços a preços inferiores ao valor concertado. Série de licitações analisadas com evidência econômicas. VIII – Colaboração por parte dos Sindicatos Patronal e dos Empregados, através de imposição de notificações trabalhistas. Liderança da conduta por parte das empresas Reação, Rotasul, Epavi, Protege e Asservirgs por meio de seus dirigentes. Comprovada intenção dos agentes e a produção dos efeitos de falseamento completo do processo competitivo. Efeitos do art. 20, I, da lei 8.884/94. Configurada infração à ordem econômica. IX – Conduta das empresas e pessoas físicas enquadradas no art. 21, inc. I e VIII, da lei, de fixação concertada de preços de prestação de serviços. Condutas dos sindicatos e associação configuradas no art. 21, inc. II, de obtenção e influência na adoção de conduta comercial uniforme ou concertada. X – Absolvição de Vigitec, Patrulhense, Angra, JM Guimarães e Asgarras e seus dirigentes por ausência de provas. Participação das pessoas físicas. Condenação dos dirigentes. Absolvição de empregados e familiares do secretário geral do sindicato dos vigilantes. XI – Imposição de multa às representadas e às pessoas físicas. Requisitos do art. 27 da lei. Pena-base pessoa jurídica definida em 15% do faturamento. Fundamento no art. 23, I. Pena-base pessoa física definida em 15% da multa da pessoa jurídica. Fundamento no art. 23, II. Agravante de liderança do cartel. Penalidades dos sindicatos fundadas no art. 23, III. XII – Proibição de contratação com instituições financeiras oficiais e de participação em licitações. Publicação em jornal do conteúdo da decisão. XIII – Aplicação integral dos benefícios com extinção da ação punitiva para Vigilância Antares e Rubem Oreli. Disponível em www.cade.gov.br/jus/jusrisprudencia.aspx - acesso em 08/01/08.


ABRÃO, Guilherme Rodrigues. O acordo de leniência no direito penal. Disponível na internet www.ibccrim.org.br 15.04.2008.

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