domingo, 13 de abril de 2008

Adolescentes usam o site de relacionamentos Orkut para revelar crimes, posar com pistolas e ameaçar rivais

Seis dias após o assassinato de Daniel André de Deus Correa, o Baratinha, 13 anos, executado com oito tiros no rosto em 19 de março, alguém identificado como "Vou te matar" deixou uma mensagem na página do adolescente no site de relacionamentos Orkut: "Pô, baratinha, não qria t mata + (mas) olha ond tu veio da boy né putinho fui obrigado a dskrrega uma das minhas pistolas no teu coco. Agora só falta o nizinho e o chiquinho e outros vermes".

Além de um indício que pode ajudar a esclarecer um homicídio, a mensagem revela o nascimento de um fenômeno: o uso da internet por gangues da periferia de Porto Alegre para ameaçar oponentes, medir força exibindo armamentos, combinar crimes e confessar execuções. Até agora, a polícia havia identificado bondes virtuais - grupos de classe média baixa que se organizam a partir da rede de computadores para praticar atos de vandalismo e promover brigas.

A novidade na Restinga Velha é mais uma prova do destemor de criminosos, como das gangues do Carro Velho e do Chiquinho, que revelam seus métodos pelo Orkut. Nas fotos armazenadas nas páginas de seus integrantes, o culto à violência aparece. Alguns fazem pose com pistolas e revólveres, sem esconder o rosto. Outros têm o cuidado de ocultar a face: aparecem apenas com armas na cintura ou vestem toucas ninja. Objetos supostamente obtidos em furtos e assaltos também fazem parte da galeria de imagens de moradores de uma das regiões mais violentas da Capital. No espaço destinado aos recados, frases ameaçadoras.

A mesma pessoa que confessou ter matado o adolescente Baratinha escreveu na página do usuário "$$$ Nizinho mete bala": "O próximo a tomar 16 no coco é tu. bota a kra no baltimore (Rua Baltimore, na Restinga Velha) tô te esprando...". Não era a única promessa. No dia 30 de março, um domingo, Jeremir escreveu: "Tua hora tá chegando, só que tu não sabe verme!!! abre o olho...".

Trabalhadores evitam as ruas do bairro

As rixas virtuais se tornam reais quando cadáveres crivados de tiros são encontrados nas ruelas da Restinga Velha, famílias são expulsas de casa, comerciantes se submetem às exigências de criminosos, e trabalhadores evitam as ruas do bairro.

- Não trago dinheiro, relógio nem celular quando entrego cartas aqui na Restinga Velha. A gurizada não respeita mais nem carteiro - conta um funcionário dos Correios, de 43 anos, assaltado no começo de março por integrantes de uma das gangues do bairro.

Para o sociólogo Rodrigo de Azevedo, especialista em segurança pública, o Orkut é um espaço público que não deve ser demonizado.

- O problema não é o Orkut, mas sim a existência desses grupos. Se por um lado a internet facilita os conflitos de gangues rivais, por outro também pode ser um mecanismo de controle - interpreta o sociólogo.

Não é o que tem acontecido para a elucidação da morte de Baratinha. Após ser informado por Zero Hora dos depoimentos contidos na página do garoto no site de relacionamento, o chefe de investigações Ismair Oliveira, responsável pelo caso, diz que acessa - quando sobra tempo - o Orkut.

- Ele pode ter sido morto pelos rivais da gangue do Carro Velho, que negam o homicídio, ou pelos próprios integrantes do grupo dele, que também negam envolvimento. Nesse caso, há uma informação de que ele teria perdido uma pistola para os rivais - pondera Oliveira.


Zero Hora, 13/04/2008.

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