Na Comarca de Piraí do Sul, nos Campos Gerais, após constatar que 70% dos processos criminais e da Vara da Infância e Juventude tinham relação direta ou indireta com a dependência de álcool e demais drogas, a Juíza de Direito Leila Aparecida Montilha colocou em prática, em 2014, o projeto “Justiça Terapêutica”.
O programa busca aplicar medidas de tratamento aos infratores quando a prática de crimes está relacionada com o uso de drogas. Na maioria das vezes tais medidas são utilizadas como alternativa à pena e, em alguns casos, são aplicadas cumulativamente com a pena não privativa de liberdade.
Um dos fatores que também foi levado em conta pela magistrada era o alto índice de reincidência dos infratores, já que a aplicação isolada da pena sem o devido tratamento da dependência de drogas e álcool não surtia qualquer efeito para a ressocialização.
“Os mesmos infratores apareciam em novos processos que iam se multiplicando, assim o método surgiu de uma necessidade constatada na prática. Nesses casos a melhor opção é o tratamento”, explica a Juíza Leila Aparecida Montilha.
Ela ainda destaca que é verificada já no primeiro contato a necessidade da aplicação das medidas de Justiça Terapêutica no infrator, possibilitando um tratamento rápido e eficiente para mudar a vida desse infringente. “O esforço é no sentido de empurrar o preso a dar o primeiro passo para se livrar da dependência, iniciando o tratamento que se revelar mais adequado”, afirma a magistrada.
Aplicação de testes laboratoriais
O teste para o uso de drogas não é obrigatório, mas para a aplicação do programa basta a constatação de que o crime está relacionado ao uso ou ao vício de alguma substância ilícita. Em Piraí do Sul, na maioria das vezes o infrator acaba aderindo voluntariamente ao método.
Etapas do programa
O tratamento se desenvolve em três momentos:
- A primeira etapa é a chamada fase pré-judicial, onde será apurado se a infração guarda relação com o consumo de drogas. É a fase referente ao delito, que vai desencadear o propósito da ação penal. É uma fase prévia onde o programa não é aplicado ainda.
- Na segunda etapa e a mais relevante de todas, chamada de fase judicial, é onde se decidirá pela aplicação ou não do programa. Neste momento é apresentada a possibilidade ao infrator da participação e da aplicação do tratamento, mediante o projeto Justiça Terapêutica. Essa fase vai desde o momento anterior à proposição da denúncia, no qual poderá ser feita a transação penal, até o final do cumprimento da pena.
- A terceira e última chama-se terapêutica. É nessa fase que o tratamento efetivamente se desenvolve, sempre de forma individual. A partir desse último passo que acontece o encaminhamento do usuário, pelo Juiz, à instituição na qual será realizada a medida de tratamento, com o envolvimento de médicos, psicólogos e demais profissionais que estão envolvidos no programa.
Com a aceitação do tratamento, o infrator será entrevistado por uma equipe interdisciplinar, composta por integrantes de diversos saberes profissionais, como objetivo de se obter um diagnóstico geral do paciente.
Vantagens
Para a magistrada Leila Aparecida Montilha, a Justiça Terapêutica tem como sua primeira e grande vantagem a associação entre Justiça e saúde. Essa ligação entre as duas áreas acaba reforçando a ideia de que o problema das drogas diretamente relacionado a crimes é de responsabilidade de toda a sociedade.
“Cada vez mais a Justiça precisa contar com esferas de atuação multidisciplinar, a exemplo do que ocorre com o Direito de Família, do Eca e da Justiça Restaurativa”, salienta.
O programa tem como outra vantagem trabalhar para oferecer uma perspectiva de vida digna aos infratores e, consequentemente, a sociedade fica mais protegida, porque o número de reincidência diminui. A população é, portanto, interessada diretamente na recuperação efetiva do preso.
Trabalho em conjunto
Em 2016 a Juíza Leila Aparecida Montilha participou de um curso promovido pelo Ministério da Justiça que tratava do tema da integração de competências no desempenho de atividade judiciária com usuários e dependentes de drogas, o que a fez investir ainda mais na aplicação do método terapêutico na pena.
“Foi um curso excelente, intensificamos o programa e buscamos uma integração maior com a rede municipal e, assim, conseguimos aplicar o tratamento sempre que possível. Aqui no município, trabalhamos com o objetivo de que esse método consiga agir diretamente na melhoria das relações familiares, resgatando a cidadania do infrator”, finaliza.
O projeto Justiça Terapêutica é fruto de parceria entre o Poder Judiciário, o Ministério Público, a Prefeitura Municipal (por meio de Programa de Saúde Mental-CAPS) e a Secretaria de Políticas Públicas AntiDrogas (por meio da ajuda entre grupos de Alcoólicos Anônimos e Amor-Exigente).
Prêmio de reconhecimento
Por essa iniciativa em 2016, ela foi uma das premiadas durante cerimônia do prêmio JUS XXI – “Inovação e Cidadania”, na categoria magistrados. O evento foi criado pelo Núcleo de Direitos do Cidadão do Tribunal de Justiça do Estado (Nucid) e pela Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) para homenagear e destacar as práticas de ações da política judiciária de cidadania nas Comarcas do Estado.
Ao receber o prêmio, a magistrada disse ter ficado muito feliz com a homenagem e por ter dividido esse momento com os demais colegas vencedores. “Foi muito gratificante, iniciativas dessa natureza servem de grande estímulo para continuarmos a dar o nosso melhor a cada dia, permitindo que o nosso trabalho, para além dos processos, possa ajudar na verdadeira pacificação social”.
Fonte: TJ-PR
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