Após a reforma do Código de Processo Penal pela Lei 12.403/2011, restaram no Brasil apenas três formas de prisões cautelares (antes da condenação definitiva): prisão em flagrante, prisão preventiva e prisão temporária. A prisão em flagrante aparece como mera detenção cautelar provisória pelo prazo de 24 horas, após as quais o juiz poderá decretar a prisão temporária, se cabível; relaxar a prisão, se ilegal; conceder liberdade provisória ou ainda converter a prisão em flagrante em preventiva, se presentes os requisitos do artigo 312 do CPP e não for cabível nenhuma outra medida cautelar.
Apenas através da prisão preventiva e da temporária é possível que alguém permaneça preso cautelarmente, desde que haja cabimento para a decretação de uma das duas prisões. A prisão temporária é abordada especificamente na lei 7.960/1989, e suas hipóteses de cabimento são trazidas no artigo 1º; a preventiva, por sua vez, é prevista no próprio CPP, que enumera taxativamente em seu artigo 312 as hipóteses que justificam sua decretação.
Nesse sentido, a prisão preventiva pode ser decretada para garantir a ordem pública, a ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou ainda para assegurar a aplicação da lei penal, desde que, em qualquer dos casos, haja prova da existência do crime bem como indício suficiente de autoria. É possível ainda sua decretação em caso de descumprimento de outras obrigações impostas por força de outras medidas cautelares, como dispõe o parágrafo único do artigo 312.
A reforma processual de 2011 teve entre seus objetivos evitar o uso excessivo da figura da prisão preventiva, que vinha sendo utilizada como espécie de antecipação da pena, enquanto deveria ser medida excepcional, como todas as outras medidas restritivas de liberdade. Entretanto, tendo em vista que algumas das hipóteses são abstratas, como por exemplo: a "garantia da ordem pública", ainda são comuns casos de decretação de prisão preventiva sem que haja efetiva necessidade, principalmente em se tratando de casos de grande repercussão na mídia nacional, o que fere o jus libertatis, bem como se opõe ao princípio da presunção de inocência, consagrado no artigo 5º, LVII da Constituição Federal.
Um caso recentemente noticiado foi de um réu preso em flagrante por suspeita de tráfico de drogas após ter sido apreendido com dois tijolos de maconha que teve sua prisão preventiva decretada pelo juízo da 1ª Vara Criminal de Tatuí, no interior de São Paulo, que entendeu que a manutenção da prisão do réu era imprescindível para garantia da ordem pública.
O caso chegou ao Supremo Tribunal Federal através do HC 118.580/SP e no último dia 10 de julho o ministro Celso de Mello concedeu medida liminar revertendo a decisão que decretou a preventiva e determinando que o réu fosse colocado imediatamente em liberdade.
Para o ministro relator Celso de Mello, a decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva apoiou-se em elementos insuficientes e destituídos de base empírica idônea e, portanto, desprovida de fundamento substancial indispensável à decretação da prisão preventiva. Mencionou ainda que a supressão meramente processual do jus libertatis não pode ocorrer em um contexto caracterizado por julgamentos sem defesa ou por condenações sem processo.
O ministro explicitou ao longo das treze páginas de fundamentação de sua decisão que a Suprema Corte tem censurado decisões que fundamentam a privação cautelar da liberdade no reconhecimento de fatos que apenas representem a própria descrição abstrata dos elementos do tipo penal.
A prisão preventiva, como bem tem entendido o Supremo Tribunal Federal, não se presta a punir sem processo, levando em consideração apenas a gravidade do crime imputado, pois a Cata Magna prevê expressamente que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. É imprescindível para a decretação da prisão preventiva fundamentação adequada que demonstre efetivamente sua necessidade, sob pena de violação constitucional.
Roberta Raphaelli Pioli é advogada no escritório Fernando Quércia Advogados Associados.
Revista Consultor Jurídico, 20 de julho de 2013
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