Piper Chapman, de 34 anos, é uma mulher americana branca de classe média. É noiva do aspirante a jornalista Larry Bloom. Planeja criar uma marca de produtos de beleza naturais com sua melhor amiga e vender na loja de departamentos Barney’s. Sua vida parece pacata, até que ela é indiciada por lavagem de dinheiro do tráfico de drogas. É aí que parte da verdadeira personalidade de Piper aparece. Dez anos antes, ela manteve um relacionamento sério com uma mulher, a traficante Alex. No auge da paixão pela companheira, Piper aceita ajudá-la nos negócios. Ela foi agora descoberta pela polícia – e se entrega. Por 15 meses, a “boa moça loira”, como ela própria se identifica, cumpriu pena numa penitenciária federal feminina. Os intermináveis dias de convívio com os mais diversos tipos de mulheres – brancas, negras, orientais, latinas, lésbicas, bissexuais, religiosas – colocaram Piper frente a frente com situações que sua posição social nunca a permitiria viver.
A verdadeira Piper, de sobrenome Kerman, escreveu um livro sobre a experiência na prisão, Orange is the new black, publicado em 2010. O título (O laranja é o novo preto, numa tradução livre) é uma ironia ao traje das detentas. É como se o uniforme laranja tivesse de ser usado como o novo “pretinho básico”, traje cotidiano da mulher americana livre. A história virou best-seller nos Estados Unidos, foi adaptada e acaba de estrear como série do serviço de vídeo on-line Netflix. A produção é de Jenji Kohan, da série sobre drogas Weeds. Antes de ser lançada mundialmente, no dia 11 de julho, foi confirmada a produção da segunda temporada.
A crítica Emily Nussbaum, da revista The New Yorker, afirma que Orange is the new black é “esperta, picante e ultrajante”, um filho das séries The L word (drama sobre amigas lésbicas) e Oz (sobre a vida numa penitenciária masculina). No final de semana de estreia no Brasil, a audiência fez dela o programa mais visto do Netflix.
A razão do sucesso está na ousadia e na inovação. Nunca o mundo de uma penitenciária feminina fora abordado. Nunca a televisão foi tão ousada em querer retratar situações realistas, sem pudor ou medo de ofender. “A prisão não é nada do que imaginamos, principalmente com relação às mulheres”, disse Piper Kerman a ÉPOCA. Ela afirma que escreveu o livro para mostrar quem está na prisão e por que está lá. “Minha experiência foi diferente do senso comum. O emocionante é que, apesar de ser uma adaptação, a série é fiel a essa ideia.”
No primeiro episódio, Piper (Taylor Schilling) pesquisa a vida na prisão antes de se entregar. Lê livros que explicam como se comportar para sobreviver. A realidade se mostra bem diferente das publicações. Lá dentro, ela encontra segregação racial, abuso de drogas e corrupção.
A sexualidade das detentas é outra surpresa. Elas fazem sexo no banheiro e formam casais. Isso resulta em casos de homofobia. Um dos diretores da penitenciária afirma que “lésbicas podem ser muito perigosas”.
O enredo da série explora também o caráter instável dos seres humanos, com um toque de leveza, conferido pela personagem Tasha “Taystee” Jefferson, vivida pela atriz Danielle Brooks. Tasha obtém permissão para diminuir a pena e é libertada. Como as oportunidades para uma mulher negra recém-saída da cadeia são escassas, ela volta poucas semanas depois. Orange is the new black conta essa história trágica com uma sensibilidade cômica, uma das marcas da produtora da série, Jenji Kohan. Para Piper Kerman, esse é outro trunfo da produção. “Isso faz o show ser revolucionário e provocador”, diz. “A vida na prisão não é um assunto engraçado. Mas, muitas vezes quando estive lá dentro, rir era a melhor saída.”
A produção de séries vive uma grande transformação. A televisão não é mais o único canal de exibição. Dispositivos como smartphones e tablets permitem assistir a programas em qualquer lugar e momento. Serviços de vídeo on-line, como o Netflix, são uma opção à TV a cabo. “O cenário mudou dramaticamente nos últimos anos. Há mais espaços para divulgar, o que melhora a produção”, diz Jason Biggs, intérprete de Larry, o marido de Piper.
Os novos meios de exibição permitem a criação de episódios contínuos e mais longos. Para Biggs, isso oferece aos atores uma oportunidade para desenvolver melhor os personagens. Biggs se diz animado com a possibilidade de criar um Larry mais profundo. “A beleza da televisão é não saber aonde o personagem chegará”, afirma. “Você tem mais tempo para aprender com ele.” A segunda temporada está programada para o verão de 2014, segundo a Netflix. Com mais recursos e mais polêmicas, os criadores de Orange is the new blackesperam repetir o sucesso da primeira.
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