O americano Rives Miller Grogan recebeu uma ordem rara de uma juíza de Washington: ficar fora do Distrito de Colúmbia (o distrito federal dos EUA), por tempo indeterminado. Mas lhe garantiu permissão para entrar em Washington em 25 de fevereiro, para uma audiência no tribunal. Para a revista Slate, isso equivale a uma pena de exílio — de um território americano para outro território americano. Ele não pode mais permanecer no Distrito de Colúmbia.
Grogan, de 47 anos, que se autodenomina "Pastor Rick" e faz pregações contra o aborto, foi preso no dia da cerimônia de posse do presidente Obama para seu segundo mandato. Enquanto o presidente discursava, ele subiu em uma árvore, perto do prédio do Congresso, para protestar. Com uma placa na mão, em cima da árvore, e muitas câmeras embaixo, ele gritava palavras de ordem contra o aborto.
A sentença da juíza Karen Howze foi bem mais severa em sua sentença do que aspirou a Promotoria. Os promotores pediram à juíza que ordenasse a Grogan que ficasse fora de um determinado perímetro em torno do Congresso, de prédios do Senado e da Câmara dos Deputados, da Biblioteca do Congresso e da Suprema Corte dos EUA. A juíza achou que era pouco e o mandou para o "exílio".
A decisão judicial reacendeu a discussão sobre a legalidade de uma ordem de um estado americano mandando um cidadão para o exílio em qualquer outro estado do país. Dos 50 estados americanos, 16 têm dispositivos constitucionais que proíbem o desterro de seus cidadãos (de seus territórios, não do país). Em outros estados, tribunais de recurso têm derrubado essa prática.
No entanto, em alguns estados, o exílio interestadual, às vezes chamado de "exílio interno", é constitucionalmente permitido. A Constituição de Tennessee é um exemplo. A Constituição de Maryland prescreve, especificamente, o banimento, como pena para crimes de corrupção. Mas tribunais de recursos do estado geralmente anulam sentenças de exílio.
Vazio legislativo
Em 2000, um juiz de Kentucky sentenciou um homem condenado por violência doméstica ao exílio interestadual por um ano. O caso nunca chegou à Suprema Corte do estado. O Distrito de Colúmbia não tem uma Constituição e suas leis não fazem menção a exílio. "Assim, a legalidade do exílio imposto a Grogan não está clara", diz a reportagem da revista Slate.
De uma maneira geral, os juízes preferem estabelecer condições mais rígidas de fiança do que proferir sentenças desse tipo. Ao contrário, a tendência é rejeitar o exílio interestadual, sob quaisquer circunstâncias, diz a revista.
Na visão de acadêmicos jurídicos, a permissão de banimento de cidadãos de territórios geográficos depende de suas extensões. O banimento do país é, decididamente inconstitucional, pelo menos para cidadãos americanos. Mas o banimento de algumas áreas, como a de escolas ou creches, tem sido cada vez mais popular para criminosos sexuais, por exemplo. Nos EUA, membros de gangues também são punidos com o banimento de suas cidades, "para ficarem longe de más influências", diz a revista.
Tribunais de recursos costumam aprovar esse tipo de sentença, desde que ela seja razoável. Por exemplo, uma lei do estado da Geórgia, que proibia criminosos sexuais de viver em qualquer área dentro de um perímetro de 305 metros de qualquer parada de ônibus, foi declarada inconstitucional em 2007. Os legisladores deixaram claro que a intenção era exilar os criminosos sexuais do estado, impondo-lhes uma restrição que, na prática, não lhes deixava qualquer lugar para viver.
Há vários argumentos contra o exílio interestadual, diz a revista. "É uma pena cruel e incomum, retira do cidadão o direito de ir e vir; é uma forma de dupla punição. A maior preocupação, entretanto, é prática. É uma forma de se livrar do 'problema', transferindo-o para o estado vizinho; e também uma forma de se livrar dos custos da detenção, transferindo-o para outro estado", diz a notícia.
É interessante lembrar, no entanto, que foi exatamente isso o que aconteceu no início da colonização inglesa dos Estados Unidos. A Grã-Bretanha exilou cerca de 50 mil condenados no "novo mundo", antes que os EUA declarassem sua independência.
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 27 de janeiro de 2013
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