No início da segunda quinzena de fevereiro, foi deflagrada operação da Polícia Federal (PF) denominada Sexto Mandamento, em alusão ao mandamento bíblico “não matarás”, com o objetivo de desarticular uma suposta organização criminosa, composta por agentes policiais militares de diversas patentes. Suspeito de praticar habitualmente homicídios, com a simulação de que os crimes capitais eram praticados em confronto com as vítimas, o grupo vinha sendo investigado pela PF há, aproximadamente, um ano.
De acordo com informações apuradas nas investigações, a organização de policiais cometeu alguns homicídios durante o horário de serviço e com uso de viaturas da corporação – Polícia Militar (PM). As ações policiais não tinham motivos que as legitimassem. Figuram casos de execução de mulheres, crianças e adolescentes sem qualquer envolvimento com práticas delituosas. Aparentemente, a ocultação de cadáveres também era prática rotineira.
Evidenciou-se que os crimes começaram há cerca de dez anos, período em que a atuação se fortaleceu e se difundiu nos municípios de Formosa, Rio Verde, Acreúna, Alvorada do Norte e Goiânia. Segundo dados divulgados pela Agência de Notícias da PF, nos locais onde os integrantes da PM investigados se instalavam em decorrência de remoções às diferentes unidades da PM/GO, o índice de mortes em supostos confrontos com aquela corporação aumentavam consideravelmente.
Entre os investigados estão o atual Subcomandante Geral da PM de Goiás, um ex-secretário da Segurança Pública e um ex-secretário da Fazenda de Goiás. Em nota, a PF declarou que os estes dois últimos foram intimados “para prestarem esclarecimentos sobre supostos indícios de prática de tráfico de influência que resultaram nas promoções de patentes de integrantes da organização” perquirida.
Foram expedidos diferentes mandados judiciais por comarcas distintas e, até 16 de fevereiro, foram presas 27 pessoas, entre elas o subcomandante geral e 18 militares cujos nomes ainda não foram divulgados. Se comprovado o envolvimento das pessoas investigadas, elas poderão ser indiciadas pela prática dos seguintes crimes: homicídio qualificado em atividade de grupo de extermínio, considerado crime hediondo; formação de quadrilha; tortura qualificada; tráfico de influência; falso testemunho; prevaricação; fraude processual; ocultação de cadáver; posse ilegal de arma de fogo de calibre restrito; bem como ameaça a autoridades públicas, jornalistas e testemunhas.
A operação contou com a participação da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, do Ministério Público de Goiás, do Poder Judiciário de Goiás, da Secretaria de Segurança Pública de Goiás, bem como com os Comandos da Polícia Militar e da Polícia Civil de Goiás.
Para auxiliar a buscas às pessoas desaparecidas, que serão iniciadas após as abordagens policiais, foi criado um canal de denúncia por meio do qual a população poderá encaminhar informações: denuncia.srgo@dpf.gov.br. As identidades dos denunciantes serão preservadas.
Assim como a Operação Sexto Mandamento, na semana anterior, no dia 11 de fevereiro, foi desencadeada no Rio de Janeiro uma megaoperação conjunta da Secretaria de Segurança Pública fluminense, do Ministério Público Estadual e da PF, chamada de Guilhotina.
De acordo com a PF, a operação foi iniciada em 2009, após vazamento de informações que frustrou a ação policial cujo objetivo era prender o traficante conhecido como Roupinol, o qual atuava na Favela da Rocinha com o traficante Nem. A partir desse momento, tiveram início duas investigações paralelas: uma da Corregedoria Geral Unificada da Secretaria de Segurança do Rio e outra da Superintendência da PF no Rio. Depois de mais de um ano de investigações, interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, filmagens e coleta de documentos, as informações entre os serviços de inteligência foram trocadas e deram origem à Operação Guilhotina.
Nesta operação, tem-se buscado comprovar a atuação de outro suposto grupo criminoso, formado por policiais civis e militares, além de informantes, envolvidos com o tráfico de drogas, armas e munições, com a segurança de jogos clandestinos e com a venda de informações policiais a milícias. Há ainda a suspeita de ligação com o chamado “Espólio da Guerra”, configurado pela subtração de produtos de crime que são encontrados em operações policiais, como o que ocorreu recentemente no processo de ocupação do Complexo do Alemão. A prática é uma forma de retroalimentar as atividades criminosas de grupos de traficantes atuantes no Rio de Janeiro.
Durante a ocupação, entre os meses de novembro e dezembro de 2010, escutas telefônicas revelaram que alguns policiais recebiam informações de locais onde estariam escondidas armas e drogas. Os mesmos agentes foram filmados chegando aos endereços dados e, ao saírem, levavam o material apreendido, que não era entregue nas delegacias.
Inicialmente, a operação visava dar cumprimento a 45 mandados de prisão preventiva, sendo 11 contra policiais civis e 21 contra policiais militares, e a 48 mandados de busca e apreensão. Até 16 de fevereiro, mais de 35 agentes policiais foram presos, entre eles o ex-subchefe operacional da Polícia Civil, citado em alguns telefonemas grampeados com ordem judicial. Ainda que não seja considerado chefe do grupo, segundo o superintendente da Polícia Federal do Rio, delegado Angelo Gioia, há provas que o ligam a policiais corruptos.
O então chefe de Polícia Civil fluminense, Allan Turnowski, foi interrogado pela PF como testemunha, dada sua relação com ex-subchefe operacional – os dois trabalhavam próximos há dez anos. Turnowski deixou o cargo, que será assumido por Martha Rocha.
Após denúncias de irregularidades, a Delegacia de Repressão contra o Crime Organizado (Draco) foi lacrada, no dia 13 de fevereiro, pela chefia da Polícia Civil, a qual estava subordinada. No dia seguinte, passou a ser controlada diretamente pela Secretaria de Segurança.
Na início da mesma semana, José Mariano Beltrame, secretário de Segurança, criou a Superintendência da Contrainteligência e entregou a Cláudio Ferraz, que atuava na Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas, a missão de investigar policiais. "Nós tínhamos desafios nos primeiros anos que já estão postos: UPP, ISP, plano de metas. A sociedade quer outro desafio. Esta etapa vai ser pior do que a primeira. Eu não vou poder deixar de abordar assuntos internos", afirmou Beltrame.
As ações envolvidas na Operação Guilhotina têm tumultuado o cenário policial. Pouco tempo após sua deflagração, a Associação dos Delegados de Polícia do Rio de Janeiro (Adepol-RJ) entrou em rota de colisão com Beltrame e pediu a exoneração do secretário devido à “invasão inédita, desrespeitosa e ilegal de delegacias policiais”. Em nota, a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) divulgou apoio a Beltrame e rebateu as críticas feitas pela Adepol-RJ.
(Érica Akie Hashimoto). IBCCRIM.
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