segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Partidos, homens partidos?

João Baptista Herkenhoff
 
Este texto defende a importância dos partidos na Democracia do modelo ocidental, não obstante a advertência de Carlos Drummond de Andrade que citaremos. Apresentamos ideias para aprimorar o regime partidário.
Drummond escreveu:
“É tempo de partidos, é tempo de homens partidos”.
Os poetas costumam estar certos. Enxergam longe, capazes de ver o que está oculto ao comum dos mortais.
Não me arrisco a fazer hermenêutica poética, não me arrisco a interpretar Drummond. A hermenêutica que faço, em razão de meu ofício, é a hermenêutica jurídica. Assim, prefiro fazer considerações à margem da visão do poeta, permanecendo no terreno em que transito com relativa facilidade.
Os partidos, no modelo de Democracia adotado pelo Brasil, devem corporificar correntes de pensamento. Em outras palavras: todo partido deve ter um programa e deve ser fiel a esse programa.
O programa partidário deveria traduzir escolhas em face dos mais diversos assuntos. Todos aqueles que integram um partido deveriam lutar pelas ideias do programa partidário. Nesta linha de pensamento, o eleitor, em qualquer eleição, inclusive nas eleições municipais, escolheria, em primeiro lugar, o partido de sua preferência. Depois, dentro do partido, com cujo programa comungasse, o eleitor escolheria o candidato que lhe parecesse o melhor. Ainda dentro desse raciocínio, o político eleito, que mudasse de partido, deveria perder o mandato. Isto porque se os partidos têm um programa, sair do partido significa abandonar o programa.
Na realidade brasileira, as coisas não funcionam assim. Sem pretender, como disse, interpretar o poeta, suponho que os partidos que receberam o anátema de Drummond são partidos sem programa, são partidos como os que temos, às dezenas, no Brasil.
Não me parece que só exista a possibilidade de regime democrático dentro do sistema partidário. Outros modelos políticos podem cultuar os valores básicos do que chamamos de Democracia, principalmente naqueles países que têm vertente cultural diversa da vertente ocidental. É absoluta negação do sentido de Democracia pretender o Ocidente o monopólio do ideal democrático.
Mas Democracia no Brasil foi sempre Democracia fundada em partidos políticos. Nas fases da vida brasileira em que se suprimiram os partidos não tivemos outros modelos possíveis de Democracia, mas sim ditadura.  Foram períodos em que se cassou a liberdade de imprensa, em que os divergentes políticos foram presos e torturados, em que uma suposta verdade foi decretada como imposição à consciência de todos.
Assim sendo acredito que, no Brasil, o que temos de fazer é aperfeiçoar o sistema de Democracia partidária adotado tradicionalmente pelo país.
Que os partidos tenham programa e sejam fiéis a seus programas.
Que os candidatos, nas campanhas eleitorais, expliquem ao povo o programa dos seus partidos.
Que se exija fidelidade partidária. O mandato pertence ao partido, que está comprometido com um programa, e não às pessoas que foram eleitas.
Lanço uma ideia para ser discutida: que se adote a partilha do mandato pelos candidatos votados, no caso das eleições proporcionais. Ou seja, não seriam considerados eleitos apenas os candidatos mais votados, dentro da respectiva legenda. Também outros candidatos, expressivamente votados, seriam considerados eleitos (ou seja, escolhidos), uma vez que foram sufragados por parcela ponderável do eleitorado. Partilhariam do exercício do mandato, por tempo correspondente aos votos alcançados. Isto seria feito sem implicar em aumento de despesas, de acordo com uma regulamentação sábia que se fizesse da matéria.
 
João Baptista Herkenhoff, 74 anos, professor pesquisador da Faculdade Estácio de Sá de Vila Velha (ES), palestrante e escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br  Homepage: www.jbherkenhoff.com.br Autor de Dilemas de um juiz – a aventura obrigatória (Editora GZ, Rio de Janeiro).
 
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