O mundo passa por transformações radicais. O planeta, ferido pela ação inclemente do homem, dá a sua resposta através de chuvas torrenciais, secas, furacões e outros fenômenos semelhantes. Estado, família, igreja, educação, tudo se transforma rapidamente. Vejamos o que se passa com os estudantes, futuros profissionais do Direito.
A cada ano, novas turmas ingressam nas mais de mil faculdades de Direito existentes no Brasil. Em sua maior parte, rostos jovens, sorrisos, promessas de felicidade. Nos cursos noturnos, a média de idade aumenta. Adultos procuram, legitimamente, ascensão profissional e social. Aqui a análise será feita a partir dos jovens acadêmicos de Direito.
Em plena adolescência, que certamente prosseguirá até o fim do curso (considera-se, agora, em 30 anos a idade limite), o jovem universitário, com 17 ou 18 anos, é absolutamente distinto da geração de seus pais, cuja idade estará, possivelmente entre 45 e 50 anos. Dos ascendentes, guardam os traços físicos, mas dos hábitos, quase nada.
O que os faz tão diferentes?
A resposta deve ser no plural e não no singular. E começa pela criação. Enquanto na geração de seus avós as mulheres, salvo exceções, não trabalhavam (nas procurações eram qualificadas como “de prendasdomésticas”), na geração de seus pais, a maioria tem vida profissional. Pode ser por uma legítima aspiração profissional ou apenas necessidade de sobrevivência. Na área do Direito, encontram-se em todas as profissões. Na magistratura gaúcha já são maioria. O trabalho da mãe profissional em Direito nada tem de errado. Mas tem um preço e não costuma ser barato. Principalmente quando exercido nos dois (ou três) períodos e com dedicação extrema (por exemplo, as advogadas-professoras).
Muitos dos atuais estudantes de Direito foram criados sem o indispensável acompanhamento materno, exteriorizado em carinho, transmissão da história da família, orientação do certo e do errado e, principalmente, a presença. Por incontornável necessidade, desde cedo foram a berçários ou escolas, onde o tratamento pode ser profissionalmente de qualidade, mas inexiste o amor materno. Por vezes, uma babá ou a avó fizeram este papel, ora bem, ora mal. Como se sabe, os sete primeiros anos de vida formam a personalidade. A ausência da mãe nessa fase, se preponderante, deixará marcas. E elas, no curso de Direito, poderão aflorar em dificuldades de relacionamento, desinteresse, depressão, entre outros problemas.
Muitos estudantes vêm de famílias desfeitas. Não importa o motivo e nem se pretende julgar ninguém. Mas, evidentemente, existem consequências. Principalmente se a separação for conflituosa e os pais não tiverem a grandeza de evitar críticas recíprocas. A ausência da vida familiar trará sentimento de abandono e este é um dos fatores da procura das drogas. Almoçar com o pai aos sábados, em um shopping, evidentemente não é o mesmo que com ele conviver diariamente, recebendo lições de vida.
Poucos recebem orientação religiosa. Por comodismo, os pais optam por nada ensinar, afirmando: “quando adulto, ele saberá escolher”. O resultado é que depois nada se escolhe, e temos muitos que em nada crêem, o que os torna mais materialistas, consumistas e menos solidários.
A internet será, também, um fator a tornar diferentes os novos universitários. Criados em contato permanente com um computador, comunicam-se por meios virtuais (msn, orkut, skype), em uma nova língua, ininteligível para os maiores de 30 anos. Tal fato impede o desenvolvimento de relações interpessoais diretas, a conversa franca e a troca de experiências pelo conhecimento. Tudo isso, somado à falta de leitura de livros, do teatro e do melhor cinema, faz com que tenham dificuldade em exteriorizar o que pensam. As falhas de redação ou até de exposição oral terão péssimos reflexos no futuro exercício profissional.
Na disciplina estará novo fator de diferença flagrante. Os pais, envolvidos na luta pela vida, nem sempre terão tempo ou energia para fixar limites. É mais fácil permitir do que proibir. E nisto se formam adolescentes e adultos que não se submetem a quaisquer regras, contornam exigências, fogem da responsabilidade. É óbvio que isto terá reflexos nos estudos e na vida profissional. Os vencedores na área jurídica não costumam ser dotados de inteligência excepcional. Na maioria absoluta alcançaram o sucesso pelo esforço e disciplina.
Ainda na disciplina, muitos terão dificuldades em conviver com a hierarquia. Criados com permissividade, como é próprio da vida moderna, não sabem como lidar com as estruturas de poder e suas regras. E daí se envolvem em conflitos desnecessários e que lhes causam sofrimentos. Nas carreiras públicas jurídicas esta é uma das maiores dificuldades dos administradores. À menor exigência o jovem profissional se insurge, via de regra justificando sua posição em alguma norma constitucional genérica e que nada tem a ver com o caso concreto.
A falta de garra, não é regra absoluta, mas é também uma característica. É comum o estudante de Direito, no fim do curso, não ter ideia do rumo a tomar ou empenhar-se na busca do sucesso. Principalmente nas classes A e B, onde os desejos foram sempre atendidos com facilidade. Sem espírito de luta, muitos não se animam aos sacrifícios de um concurso ou à luta pelo sucesso na advocacia. Esta característica alcança, inclusive, bons alunos, que manejam bem as discussões teóricas, mas recuam quando se vêem obrigados a lutar.
Os jovens estudantes de Direito, como se vê, são diferentes. Foram forjados em outra escola de vida. Inclusive vendo os péssimos exemplos das gerações que atualmente detém o poder (v.g., corrupção explícita de altos servidores passada na TV), o que certamente não faz bem às suas cabeças.
Aos mais maduros, em especial aos professores dos cursos de Direito, cabe tentar compreendê-los, dar-lhes apoio e atenção. Criticá-los, genericamente, de nada adianta. Estimulá-los, orientá-los quando estiverem na via errada, é o caminho certo. Não será fácil, por certo. Mas os desafios é que dão graça à vida. E este é um desafio que vale a pena.
VLADIMIR PASSOS DE FREITAS desembargador Federal aposentado do TRF 4ª Região, onde foi presidente, e professor doutor de Direito Ambiental da PUC-PR.
Revista Consultor Jurídico, 30 de maio de 2010
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