Jurisprudência Anotada
Penal. Tráfico de drogas. Réu que permaneceu preso durante todo o processo. Direito de apelar em liberdade negado sem fundamentação concreta.
“A jurisprudência desta Corte tem proclamado que a prisão cautelar é medida de caráter excepcional, devendo ser imposta, ou mantida, apenas quando atendidas, mediante decisão judicial fundamentada (...), as exigências do art. 312 do Código de Processo Penal. (...) As instâncias ordinárias consignaram que o fato de o paciente ter respondido ao processo preso é fundamento bastante para lhe negar o direito de recorrer solto. Todavia, não se pronunciou o magistrado de primeiro grau, em momento algum no curso da ação, sobre a necessidade da prisão (...). Ao menos na sentença, deveria o Juiz ter apontado, para a negativa do apelo em liberdade, a presença de algum dos requisitos do art. 312 do CPP, não bastando a menção de que o paciente permanecera preso durante o processo. Ademais, o art. 387 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 11.719/2008, estabelece expressamente que a manutenção da custódia, na sentença condenatória, deve se operar de forma fundamentada. Ordem concedida” (STJ - 6ª T. - HC 125.849 - rel. Og Fernandes - j. 13.10.2009 - DJe 03.11.2009 - ementa não-oficial).
Anotação: A reforma processual penal promovida pela Lei 11.719/08, ao adicionar § único ao art. 387 do CPP, teve o mérito de extirpar de nosso sistema o anacrônico art. 594, o qual disciplinava a necessidade de recolhimento do acusado para apelar da sentença condenatória, salvo situações excepcionais (réu primário/bons antecedentes ou crime de que se livrasse solto). Muito além de transformar em lei uma tendência já pacificada pela jurisprudência — no sentido de que tal dispositivo feria de morte o princípio da presunção de inocência e, por isso, não teria sido recepcionado pela CF/88 — (por todos, vide decisão do STF, HC 90.279, rel. Marco Aurélio, DJe 21.8.09), o novo texto legal trouxe outra importante diretriz: impôs o abandono da ideia corrente de que se o réu respondeu preso à ação penal, deve, necessariamente, recorrer nesta condição. Nas palavras de Ivan Luís Marques da Silva, “mesmo a manutenção da cautelaridade da prisão decorrente de sentença condenatória recorrível precisa ser faticamente fundamentada”. Até porque, “não mais se admite que magistrados tenham preguiça na hora de fundamentar suas decisões e utilizem, exclusivamente, a redação pronta do art. 312 do CPP”. (Reforma Processual Penal de 2008, S. Paulo: RT, 2008, p. 31). Nesse contexto, a decisão unânime da 6ª T. do STJ representa claro avanço na exegese da novel disciplina sobre o assunto da manutenção da custódia cautelar, mesmo após irromper uma condenação pelo Juízo monocrático. Na contracorrente de julgados daquela própria Corte (v.g., 5ª T., HC 145.321, rel. Napoleão Nunes M. Filho, DJe 09.11.09), o recado é evidente: não se pode mais aplicar a regra generalizante de que “respondeu preso, continua preso”, sendo imprescindível que o Julgador faça referência expressa aos motivos e circunstâncias autorizadoras da prisão cautelar. Ou seja, deve prevalecer o vetor constitucional da motivação das decisões judiciais, ainda que se cuide de prisão em flagrante, como na hipótese. Outro ponto que revela o mérito do precedente repousa no fato de que a previsão do art. 59 da Lei 11.343/06 — recolhimento ao cárcere para apelar em caso de tráfico de droga, salvo se primário o réu — não constituiu óbice para a concessão da liberdade.Leopoldo Stefanno L. Louveira
Penal. Receptação e tráfico de entorpecentes. Conduta única. Concurso formal de crimes. Dupla condenação. Revisão pro societate.
“Se o Ministério Público, no curso da ação penal, verifica que a conduta descrita na denúncia configura a prática de mais de um delito, cabe-lhe aditar a exordial. Aliás, o próprio magistrado, quando da prolação da sentença condenatória, pode alterar a tipificação legal atribuída pelo órgão acusatório, nos termos do art. 383 do Código de Processo Penal (emendatio libelli). Não se pode admitir que, numa típica hipótese de concurso formal, que é justamente caracterizado pela prática de mais de um crime por meio de uma única conduta, seja oferecida uma segunda denúncia contra o réu, imputando-lhe a prática do delito cuja menção fora olvidada quando do ajuizamento e do julgamento da primeira ação penal. Vedação à revisão da coisa julgada criminal pro societate. Ordem concedida para anular, desde o recebimento da denúncia, a Ação Penal n.º 432/2003, da 1ª Vara da Comarca de São José do Rio Pardo (SP), e determinar o seu trancamento, cassando, em consequência, a condenação nela proferida”(STJ - 5ª T. - HC 102.244 - rel. Laurita Vaz - j. 13.10.2009 - DJe 03.11.2009).
Penal. Apropriação indébita previdenciária. Dúvida sobre existência do crédito.
Suspensão do inquérito policial.
“Enquanto houver processo cível questionando a existência, o valor ou a exigibilidade da contribuição previdenciária, atípica é a conduta prevista no artigo 168-A do Código Penal que tem, como elemento normativo do tipo, a existência da contribuição devida a ser repassada. Versando a discussão na esfera cível sobre questão que interfere no próprio reconhecimento da justa causa para a eventual ação penal, razoável se faz o sobrestamento do inquérito até a decisão cível definitiva. Ordem concedida para suspender o inquérito policial, ficando suspenso o prazo prescricional até o julgamento definitivo da ação cível ordinária”(STJ - 6ª T. - HC 146.013 - rel. Maria Thereza de Assis Moura - j. 20.10.2009 - DJe 09.11.2009).
Processo penal. Ilicitude da
prova decorrente de
interceptações telefônicas.
“É inadmissível, no Processo Penal, a utilização de provas obtidas por meios ilícitos para embasar a persecução penal ou uma eventual condenação (art. 5º, LVI da CF). Reconhecida a ilicitude da prova pelo próprio Tribunal a quo, ante a falta de fundamentação das decisões de prorrogação da medida de interceptação telefônica do acusado, a única solução possível é a sua total desconsideração pelo Juízo processante e o desentranhamento do processo das transcrições dessas interceptações consideradas ilegais, como consectário lógico e necessário de reconhecimento de ser ilícita a prova colhida ao abrigo de decisões judiciais não fundamentadas, como assentou o egrégio TRF da 4ª Região. Ordem concedida, para determinar a exclusão do processo das provas obtidas por meio das prorrogações das interceptações telefônicas”(STJ - 5ª T. - HC 143.697 - rel. Napoleão Nunes Maia Filho - j. 22.09.2009 - DJe 13.10.2009).
>Execução penal. Livramento condicional. Indeferimento
devido à gravidade do delito
e à longa pena a cumprir.
Inidoneidade dos fundamentos.
“A gravidade em abstrato do delito e a longa pena a cumprir não são fundamentos idôneos para indeferir o livramento condicional, por ausência de requisito subjetivo.
O quantum da reprimenda imposta possui relevância apenas no que se refere ao requisito objetivo, e a gravidade do delito exaure-se na fixação da pena, não podendo ser considerados para efeito do livramento condicional. O art. 112 da Lei de Execução Penal exige, para o preenchimento do requisito subjetivo, apenas o atestado de bom comportamento carcerário, firmado pelo diretor do estabelecimento prisional, podendo o magistrado, quando quer melhor aferir a periculosidade do sentenciado, determinar a realização de exame criminológico, desde que o faça por meio de decisão fundamentada nas peculiaridades do caso concreto. Ordem concedida para determinar que o Juízo da Vara de Execuções Criminais da Comarca de Bauru reavalie se o paciente preenche os requisitos para a obtenção do livramento condicional, desconsiderando, na aferição do requisito subjetivo, a longa pena a cumprir e a gravidade do delito perpetrado”(STJ - 5ª T. - HC 125.958 - rel. Arnaldo Esteves Lima - j. 01.10.2009 - DJe 03.11.2009).
Jurisprudência compilada por Leopoldo Stefanno Leone Louveira e Rafael S. Lira
Boletim IBCCRIM nº 205 - Dezembro / 2009
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