Outra alteração interessante foi a fusão, em um único artigo (art. 213), dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor. Anteriormente, conquanto as penas fossem idênticas (reclusão de 6 a 10 anos), o artigo 213 do Código Penal tipificava (previa) o crime de Estupro com a seguinte redação: Constranger mulher a conjunção carnal...; enquanto que o artigo 214 previa o crime de Atentado violento ao pudor nos seguintes termos: Constranger alguém...
Percebe-se que, portanto, para a configuração do crime de Estupro exigia-se a conjunção carnal (ato sexual pela vias normais, isto é, introdução total ou parcial do órgão sexual masculino no órgão sexual feminino) entre o homem e a mulher mediante violência ou grave ameaça provocada pelo sujeito ativo que era necessariamente o homem. Com efeito, nesse conceito, somente o homem poderia ser o sujeito ativo direto e somente a mulher poderia ser o sujeito passivo do crime, mesmo que fosse prostituta ou, até mesmo, esposa do autor da ameaça ou violência (entendimento da doutrina e jurisprudência). Se se tratasse de outro ato libidinoso/sexual diverso da conjunção carnal, deixava de ser estupro e passava a configurar o crime de Atentado violento ao pudor, onde qualquer pessoa (homem ou mulher) poderia ser sujeito ativo ou passivo. Essa realidade jurídico-penal, contudo, teve nova configuração a partir do advento da lei acima, embora a pena (sanção), a princípio, seja a mesma: 6 a 10 anos de reclusão (caput, do art. 213).
O aludido artigo 213, agora rotulado como hediondo, em face da nova lei, passa a ter a seguinte redação: Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.
Portanto, a partir dessa nova redação, qualquer pessoa (homem ou mulher) pode ser sujeito ativo ou passivo do crime de Estupro. No sistema anterior protegia-se, por meio dos crimes sexuais, somente a liberdade de opção sexual da mulher. Se o homem fosse constrangido mediante violência ou grave ameaça a praticar conjunção/ato sexual com mulher, no máximo configurar-se-ia contra a coatora o crime de constrangimento ilegal (CP, 146, pena de detenção de 3 meses a 1 ano ou multa). Para alguns, em tal hipótese, mesmo que houvesse previsão legal, não se puniria a tentativa de estupro, por “impropriedade absoluta do meio”, isto é, “crime impossível”. Brincadeira à parte, a verdade é que a roupagem jurídico-penal mudou.
Nesse novo viés, tanto o homem pode ser sujeito passivo do crime de estupro, como a mulher pode ser sujeito ativo dessa mesma modalidade de delito.
A nova lei foi mais além, pois não só alterou a rubrica do artigo 215, substituindo Posse sexual mediante fraude por Violação sexual mediante fraude, como alterou substancialmente sua redação para abarcar qualquer pessoa (homem e mulher) e não só a conjunção carnal como qualquer outro ato libidinoso que satisfaça o desejo sexual.
Contudo, a preocupação maior da nova lei foi com a tentativa de se coibir a exploração sexual, sobretudo do menor, estabelecendo penas e tratamentos mais rigorosos quando a vítima for menor de 18 anos. Criou-se a figura da vítima vulnerável (menor de 14 anos), inclusive com o tipo penal do Estupro vulnerável (Art. 217-B), com rotulação de crime hediondo. Nessa linha, procurou-se punir com mais rigidez o agenciador, o intermediário, o traficante interno de pessoa para fim de exploração sexual.
Não se nega que o propósito do novo instrumento legal é positivo. Se alcançará ou não o seu objetivo, se a lei “vai pegar ou não” só o tempo dirá. Entretanto, é oportuno destacar que, embora necessário, o instrumento legal, por si só e por melhor que seja, se não for aplicado e executado adequadamente não trará os resultados ou a eficácia que a sociedade deseja.
Como citar este artigo: ROBALDO, José Carlos de Oliveira. CRIME SEXUAL: MUDANÇA NO CÓDIGO PENAL. Disponível em http://www.lfg.com.br. 23 de agosto de 2009.
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