A advogada Alesia Holliday começou a pensar seriamente em deixar a advocacia para se dedicar a escrever romances em tempo integral, com o pseudônimo de Alyssa Day, depois que um juiz federal lhe deu uma injeção de ânimo: “Suas petições são muito agradáveis de se ler. Você consegue prender minha atenção com suas histórias”.
Muitos advogados americanos vêm aprendendo e praticando redação criativa por duas razões: uma, descobriram que os juízes apreciam a leitura de uma petição escrita como se fosse uma novela; duas, souberam que os leitores de romances adoram ler histórias que envolvem disputas judiciais.
Esse foi, por exemplo, o caminho seguido pela bem-sucedida escritora Julie James (pseudônimo), em sua transição da advocacia para a literatura. Ela deixou a advocacia, mas a advocacia nunca deixou a escritora. Um de seus romances explora o sistema criminal de Chicago. Em outra de suas novelas dramáticas, Just the Sexiest Man Alive, o protagonista é um advogado de entretenimento que representa um “dilacerador de corações” hollywoodiano, em uma disputa judicial.
Em outra de suas novelas, Practice Makes Perfect, dois advogados competem por uma vaga de sócio do escritório. E no desenrolar do drama, eles acabam se apaixonando. E essa é a parte que mais agrada os advogados convertidos em escritores: por mais dramática que seja a história, ela sempre terá um final feliz, no melhor estilo dos filmes de Hollywood e, obviamente, da maneira que mais agrada a maioria dos leitores.
“Na área que eu atuava, não havia final feliz”, disse ao Washington Post a ex-advogada KelenKay Dimon, agora escritora em tempo integral. Sua área era Direito de Família e a maioria de seus casos envolvia divórcios, guarda dos filhos e outros litígios familiares. O que ela via diariamente eram casais em uma batalha “sangrenta” por “até o último dólar” e por qualquer porção de direito que poderia lhes caber, sem complacência ou compaixão.
“Sempre havia uma decisão. Mas, por mais justa que fosse, as duas partes saiam gravemente feridas da disputa judicial. Não havia final feliz”, ela disse. Em meio a uma depressão e com distúrbios do sono, uma colega de escritório lhe entregou três romances, com o recado: “Você precisa de finais felizes”.
Ela não só leu os romances como comprou outros e começou a escrever os próprios, primeiro como passatempo. Quando descobriu uma competição on-line de romances amadores, ela se inscreveu, mandou sua melhor obra e ganhou. A partir daí, sua carreira de escritora disparou. “Nos meus romances, os casais podem se atracar, se ferir, mas o final feliz é garantido”, disse.
A advogada Heidi Bond, escritora sob o pseudônimo de Courtney Milan, foi assistente judicial de dois ministros da Suprema Corte dos EUA. Nessa função, fazia muita pesquisa e redigia áridas decisões judiciais. Até que ela escreveu Proof by Seduction, que conta a história de um cientista que queria provar que uma cartomante era uma farsa. Bem, eles se apaixonam...
Os casos de advogados que se tornam escritores não são isolados. São muitos os advogados membros dos Romance Writers of America e quatro deles fazem parte do conselho da entidade. A questão é: por que advogados acabam enveredando pelo caminho da literatura?
Um fato é que aos advogados não faltam histórias dramáticas (algumas trágico-cômicas) para contar. Outro, segundo a advogada Heidi Bond, é que uma das habilidades de um bom advogado é pegar uma penca de acontecimentos discrepantes e entrelaçá-los para formar uma história que excita a imaginação humana — e contá-la nos tribunais.
“Da mesma forma que você monta uma história para convencer um júri ou um juiz de que seu cliente é inocente ou merecedor de uma indenização, você arquiteta um romance sobre um casal que enfrenta inúmeras situações na vida para, no final das contas, tudo terminar com um final feliz. Nos romances, diferentemente dos tribunais, os mocinhos sempre ganham.
Revista Consultor Jurídico, 20 de agosto de 2017.
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