Do total de mulheres presas em flagrante no Rio de Janeiro que têm filhos com até 12 anos de idade, 75% receberam a liberdade provisória após terem sido apresentadas a um juiz dentro do prazo legal de 24 horas. É o que mostra o 5º Relatório de Audiência de Custódia, produzido pela Diretoria de Estudos e Pesquisa de Acesso à Justiça da Defensoria Pública do Rio de Janeiro. O trabalho traz informações sobre os casos atendidos pela instituição entre 19 de setembro de 2016 e 17 de março deste ano.
Nos seis meses analisados, a Defensoria acompanhou 3.011 presos apresentados a um juiz, que avaliou a necessidade de a prisão ser mantida. Desse universo, 245 eram mulheres. Isso corresponde a 7,4% do total das pessoas presas em flagrante no período pesquisado.
Entre as mulheres detidas, 168 relataram que eram mães; sendo que 122 delas, de filhos com até 12 anos. Desse total, 46 foram presas por furto (37,7%), 41 por crimes relacionados ao tráfico de drogas (33%) e 21 por roubo (17%).
Do total das mães com filhos de até 12 anos, 91 acabaram recebendo a liberdade provisória após serem submetidas à audiência de custódia (ou seja, 75%). Durante o procedimento, 22 mulheres relataram ter condenação anterior. Detidas por tráfico de drogas e roubo, sete delas permaneceram presas.
Números constantes
A diretora de Estudos e Pesquisa de Acesso à Justiça da Defensoria Pública do Rio, Carolina Haber, apontou que o número de liberdades concedidas às mães presas em flagrante foi praticamente o mesmo que o constatado nos relatórios anteriores feitos pela instituição.
Segundo a pesquisa referente ao primeiro ano da audiência de custódia, por exemplo, divulgado em setembro do ano passado, 193 das 284 mulheres com filhos, então presas em flagrante, foram soltas após a apresentação a um juiz. A taxa de soltura registrada naquele período foi de 70%.
Os relatórios também mostram o índice de liberdades provisórias entre as gestantes. De acordo com o 5º relatório, entre as 35 mulheres grávidas (26 gestantes e nove com suspeita de gravidez), 27 receberam a liberdade provisória após a audiência de custódia. No relatório de um ano do procedimento, das 41 mulheres que indicaram estar grávidas e oito com suspeita, 28 tiveram a liberdade provisória concedida. O índice de soltura foi, respectivamente, de 0,12 e 0,25 por dia.
Sobre o perfil das presas, Carolina Haber destacou que a maioria é jovem, tem baixa escolaridade, é da cor preta ou parda e praticou crimes sem violência, como furto e tráfico de drogas.
“A situação das mulheres precisa receber uma avaliação diferenciada pelo Judiciário. Essas mulheres carregam a responsabilidade exclusiva pelo cuidado dos filhos, e o poder público não pode fechar os olhos para essa realidade, ainda mais quando se verifica que não cometeram crimes violentos e não vão deixar de responder ao processo se ficarem em liberdade, pois têm casa e família para cuidar. Mesmo quando respondem por tráfico, na maioria das vezes, agiram pra levar drogas ao presídio para seus companheiros, não são traficantes profissionais. Talvez por isso o índice de soltura seja maior para as mulheres do que em geral, mas ainda é preciso fortalecer essa política de atenção à mulher”, afirmou a pesquisadora.
Para Emanuel Queiroz, coordenador de Defesa Criminal da Defensoria Pública do Rio, os dados apontam uma tendência dos juízes em observar a política de proteção das mães com filhos menores de 12 anos, instituída a partir da alteração do Código de Processo Penal pela Lei 13.257/2016. Essa norma prevê a substituição da prisão preventiva pela domiciliar para as mulheres que têm filhos de até 12 anos.
“Espera-se que essa sinalização dos juízes que promovem audiência de custódia se espraiem por todo o Estado, iluminando à atuação do Ministério Público e dos magistrados, possibilitando que a regra seja aplicada, ou seja, a liberdade seja a regra, e não o inverso. E, nos casos em que não for possível a não aplicação da liberdade, que seja observado o direito das mães à prisão domiciliar, respeitando-se, dessa forma, o direito da mulher mãe e os direitos das crianças à convivência familiar.”
Taxa de retorno
Em um ano e meio, apenas 2,84% das pessoas soltas nas audiências de custódia no Rio de Janeiro voltaram a ser presas em flagrante, revela também o 5º relatório sobre o procedimento. Conforme o documento, 3.311 pessoas passaram pelo procedimento nos seis meses pesquisados. Desse total, 1.679 continuaram presas. Outras 1.566 receberam a liberdade provisória e 32 obtiveram o relaxamento da prisão em flagrante. A taxa de soltura registrada foi de 48% — a maior entre os períodos pesquisados.
Nos 1º e 2º relatórios, produzidos pela Defensoria entre os dias 18 de setembro e 13 de outubro de 2015 e 14 de outubro de 2015 a 15 de janeiro de 2016, respectivamente, a liberdade foi concedida em 40% dos casos. O índice de soltura, contudo, caiu para 29% no período analisado no 3º relatório, entre 18 de janeiro e 15 de abril de 2016.
Das 1.598 liberdades concedidas, 743 réus informaram que trabalham e também forneceram endereço — ou seja, em 46,5% desses casos, os réus preenchiam os requisitos de residência e emprego, ainda que informal. Do total de liberdades concedidas, 84,74% foi para os presos por furto, enquanto 18,44% por roubo. Quanto aos tipos penais da Lei de Drogas, se considerados de forma isolada, a liberdade foi concedida em 62,82% dos casos.
Ainda segundo o 5º relatório, do total de pessoas que passaram pela audiência de custódia em um ano e meio desde a implantação da iniciativa, apenas 234 réus voltaram a ser presos em flagrante.
O 5º relatório confirma o perfil das pessoas presas no Rio: pretos e pardos (74,93%), com apenas o ensino fundamental (64,58%) e idade entre 18 e 36 anos (83,54%), que trabalham no mercado informal e praticaram crimes contra o patrimônio ou previstos na Lei de drogas.
Mais audiências
A Justiça promoveu, em média, 30 audiências de custódia por dia, aponta ainda o 5º relatório sobre o procedimento. De acordo com a pesquisa, o número é três vezes superior ao registrado em setembro de 2015, quando o procedimento foi implantado no Estado.
Carolina Haber explica que o total de audiências feitas por dia foi aumentando gradativamente, em parte porque o número de delegacias atendidas pelo projeto foi ampliado ao longo do tempo.
Segundo a pesquisadora, no primeiro mês, foram registradas 10 audiências por dia. Nos três meses seguintes, a média passou para 14; e, nos três meses posteriores, para 24.
Ainda segundo o relatório, 35,1% do total de réus que passaram pela audiência disseram ter sofrido agressão policial. Quando questionados se poderiam identificar o agressor, 989 réus responderam que sim. O agressor que mais aparece indicado é o policial militar, seguido de populares e da segurança privada.
Clique aqui para ler a íntegra do relatório.
Revista Consultor Jurídico, 23 de agosto de 2017.
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