Recentemente, o plenário do Supremo Tribunal Federal, a mais alta Corte do Poder Judiciário, durante o julgamento de um habeas corpus, decidiu que um réu não poderia ficar algemado durante seu julgamento no Tribunal do Júri, anulando a condenação porque ele assim permaneceu sem que a juíza presidente justificasse esse fato de forma convincente. Essa decisão gerou a edição, por parte da Corte, de uma súmula vinculante, com efeitos que obrigam seu cumprimento pelo Poder Judiciário e pela administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.
A Corte foi mais rápida em legislar sobre o uso de algemas do que o Poder Executivo, que não o regulamentou através de decreto, conforme previsto na Lei de Execução Penal desde 1984, superando também o Poder Legislativo, no qual a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou recentemente, em primeiro turno, um projeto de lei com a regulamentação.
De acordo com a súmula, o uso de algemas fica limitado “em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros”, sendo que essa medida deverá ser adotada somente com “justificada excepcionalidade” e por escrito. Serão punidos os agentes e as autoridades que não cumprirem a decisão.
Presumo, sem querer ser irônico, que essa justificativa escrita, na maioria das vezes, terá que ser a posteriori, pois no calor dos fatos, com os riscos inerentes à atividade policial, a preocupação deverá ser de algemar, para assegurar a eficiência da ação, e não de escrever uma justificativa. Somente quem “vive” a situação terá a noção exata da necessidade dos meios necessários à contenção, as algemas ou as armas, depois, na delegacia, poderá justificar por escrito.
Não tenho dúvida de que o uso das algemas causa um constrangimento físico e até moral. Na realidade esse é o fim a que elas se destinam. Constranger alguém a ficar inerte para evitar que esboce uma reação contra o agente ou a autoridade, ferindo ele próprio ou a terceiros. Acredito que o procedimento padrão de algemar toda e qualquer pessoa presa teve por base esse princípio preventivo servindo, também, para justificar acusações do tipo “somente pobre é algemado”.
Espera-se que a polícia não fique “algemada” com essa nova regra e que aqueles que a usam para fins eróticos também não tenham que justificar por escrito.
*Delegado de polícia
Zero Hora.
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